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sexta-feira, 3 de setembro de 2021

Conto “Antidaluz”, por Roberto Fiori

                


Observava com cautela a aglomeração, escondido em parte pela vegetação densa da floresta. Os indígenas eram canibais, mas porque gostavam do sabor da carne e do sangue, ao contrário dos demais do planeta, que executavam todo um ritual antropofágico para a obtenção da força do adversário que tombara em combate.

Meu físico era robusto, mas em comparação com um único nativo franzino e baixo, eu era fraco e débil. Sem armas, podia competir com uma única ferramenta, meu cérebro. A aldeia dos Panchuayas era formada por um semicírculo de cabanas toscas e mal-acabadas, o pátio defronte a elas destinado aos inimigos. Estivera naquele local por uma semana, e tudo o que vira fora matança, matança e loucura. Quando chegavam à euforia extrema trazida pela aguardente feita da raiz “tekmal”, loucura pareceria normalidade, em comparação.

Hoje, onze índios e índias da tribo dos Panchuayas haviam trazido mulheres e crianças, junto com homens de outra tribo, inimiga. Eu olhei ao redor e me lembrei que, onde caíra, minha nave se desfizera em grandes fragmentos, sem se destroçar por completo. Recuei sem fazer barulho e saí da zona daquela floresta equatorial. Encontrei partes do casco no caminho e, ao dar com as areias finíssimas e sedosas da praia, desviei-me para permanecer em segurança, no limite da zona da mata. Caminhei com pressa, mas sabia que ninguém me escutaria. Nem os Panchuayas, nem ninguém ouvira o ruído da queda, eu acionara um dispositivo supressor de sons, no veículo espacial, que absorvia todo e qualquer som que se desse em um raio de mil metros.

Penetrei na vegetação fechada. Eu era magro, flexível, ágil. Isso possibilitava mover-me entre as árvores que cresciam juntas, restando um espaço estreito entre elas. Uma espécie de sequoia antidaluziana fora ceifada, seus doze metros de largura cortados pela astronave em que eu viajava.  Restara um toco de um metro de altura, no qual subi e corri para me lançar sobre uma dúzia de samambaias gigantes.

Cheguei à cabine de comando, instalada perto do nariz da fuselagem, na parte interna. Por isso, sobrevivi. Tinha vindo em um habitáculo projetado entre camadas e camadas de uma liga de tungstênio-cobalto, que absorvia com eficiência tanto choques físicos, como o superaquecimento térmico da passagem pela parte superior da atmosfera de Antidaluz.

Em meu planeta, eu era um semideus.

Em meus domínios, fora um senhor feudal que trabalhava com tecnologia de antimatéria e feixes de campos magnéticos que torciam qualquer objeto, ou pessoa. E estraçalhava-os.

Entrei na cabine.  Os instrumentos pareciam estar em pleno funcionamento. Mas era simples aparência, por dentro do labirinto de fibras ópticas, conduites-laser e transmissores de dados sob forma de micro-ondas, as avarias eram muitas. Apanhei uma peça aqui, outra ali e, sem pensar no que estaria acontecendo na aldeia dos canibais, pus-me a montar um dispositivo único.

Demorei-me quinze minutos, desmontando painéis de controle, emendando cabos de luz laser e aparatos diversos. Foram-se outros vinte minutos para calibrar tudo, usando um instrumento que se salvara ao desastre. Estava tudo ajustado e pronto, por fim. Pelo amor de Trogg, eu teria um verdadeiro espetáculo, hoje!

Corri, passando com habilidade por entre as árvores da floresta cerrada, e alcancei o mirante de onde descortinava toda a aldeia. De fato, um homem jazia no chão com marcas de chicotadas e os canibais riam. Estavam entrando no estado de euforia induzida pela bebida de “tekmal”.

Acabei com a alegria deles. Apontei para as cabanas minha ferramenta disruptora e, uma a uma, as cabanas explodiram. Regulei a arma para potência máxima e dirigi o campo de torção magnética e de efeito sucessivo de micro-ondas para uma sequoia antidaluziana enorme que crescia a dez metros dos limites da aldeia.

As ondas de energia sacudiram, primeiro, a árvore e, em um ou dois segundos, transformaram-na em restos. O som de destroçar acompanhou a destruição, lançando-me contra um tronco de uma palmeira e ensurdecendo-me por meio minuto. Todos os índios caíram no chão, as mãos tapando sem efeito prático os ouvidos. Eu sabia que seria doloroso, mas acho que calculei por baixo a intensidade das forças que atuariam no nível máximo de potência.

Levantei-me, tonto, e ajoelhei-me. Com prazer, via os prisioneiros escaparem, tropeçando e caindo, para a seguir se levantarem e correrem. Os canibais se encontravam um a dois metros das vítimas, mais perto das cabanas. Notei que ninguém se levantara, até se passarem dez minutos desde a deflagração da onda de choque da sequoia desmantelada. Andei até o centro da aldeia. Reparei no sangue que escorria dos olhos e ouvidos dos índios. Pensei que o principal estava feito. Mesmo o inimigo dos canibais que havia sido chicoteado tinha fugido.

As chamas das cabanas levantavam rolos negros de fumaça, que começou a me dar náuseas. Apanhei um facão e uma faca afiada de um dos corpos. Saí da aldeia, seguindo os passos dos índios que eu havia salvo.

A um quilômetro de onde havia me chocado contra aquele mundo, cheguei a uma parte da mata que se tornava aberta, sem a vegetação rasteira que poderia esconder algum animal peçonhento, e tendo as árvores se espaçado e diminuído de envergadura. Ouvi o som de centenas de tambores e, do subsolo coberto de folhas, se levantou uma leva de guerreiros troncudos e armados com arcos, flechas, lanças, tacapes e arbaletas. Alguns índios seguravam dois facões e outros, duas facas semelhantes à que eu estava portando. Levantei os braços e toquei no dispositivo para tradução de sete bilhões de línguas para o português.

— Quem é você? — um homem de físico de halterofilista olímpico, apontando um arco e uma flecha contra minha cabeça, perguntou.

Eu sabia da situação corrente naquela parte do planeta. Guerras irrompiam entre Panchuayas e o resto das tribos daquele setor do continente mais extenso. Joguei minhas cartas na mesa e falei:

— Meu nome é John. Little John. Pode me chamar de John. A explosão que devem ter ouvido destruiu uma sequoia antidaluziana de grande porte e matou os Panchuayas que ameaçavam torturar e liquidar homens, mulheres e crianças deste mundo. Caí neste planeta, vindo do céu, de um outro lugar de Antidaluz, em uma acomodação especial que chamo de “nave”. Minha nave sofreu uma parada súbita em seu mecanismo de direção e fui incapaz de controlá-la.

— Como sabe de nossas disputas, John? Nossas tribos não se espalharam por grandes extensões. Será que você é um “andiavour”? — nisso, os outros índios riram à vontade. O homem de porte atlético abaixou seu arco e continuou: — Andiavour é um pássaro migratório de mau agouro, que dá sorte aos Panchuaya, contando a eles sobre nossa localização. Um espião, em um mundo que proíbe espionagem. Mas um Panchuaya preferiria deixar de comer por doze aparições e desaparecimentos do Sol no céu, a fazer mal a outro Panchuaya. Abaixem as armas, todos! Ele virá conosco para nossa aldeia principal.

A caminhada foi puxada. Saímos da floresta para acabarmos em um mundo de vulcões, despenhadeiros e desertos. Perguntei onde estava a aldeia dos índios inimigos dos Panchuayas, mas o índio forte se limitou a dizer para acompanhá-los. Chegamos em uma ponte construída em arco, com blocos do que me pareceram feitos de concreto armado. Sob a ponte, um precipício de duzentos metros se estendia por um vale de quilômetros de largura e comprimento.

— Ele deve ir primeiro, Anquez — falou contido um dos índios. — Ele poderia ter matado os prisioneiros dos Panchuayas...

— Chegaríamos tarde, na aldeia de nossos inimigos, Rakr. Você ouviu a dama que escapou. A sequoia foi esfacelada, os Panchuayas tiveram os olhos e ouvidos estourados. John irá depois de você — Rakr começou a retrucar, mas Aquez levantou e abaixou o braço, calando-o.

Rakr pulou para a ponte e correu, galgando os blocos com rapidez, antingindo o topo e descendo até o outro lado. Levou dois minutos para atravessar o precipício. Subi no primeiro bloco de concreto e corri tão rápido quanto o índio. Chegando no outro lado, Rakr apontou para mim sua arbaleta. Fez sinal para eu pular para o abismo.

Comecei a caminhar de costas para o despenhadeiro, me aproximando da garganta, mas Rakr não suspeitava qual fora a arma que ocasionara a explosão. Enfiando com vagar a mão no bolso da calça, regulei o dispositivo energético para um décimo de sua potência e disparei. Anquez chegou junto ao outro indígena, caído no chão. Virou-o com o pé e resmungou.

 — Você poderia tê-lo matado, mas não o fez. Isso é estranho, inusitado. De onde disse que veio, John? De longe? — o índio encorpado falou que Rakr era inimigo de seu próprio povo, de hoje em diante. — Diga qual punição quer para ele.

— Eu poderia ter liquidado mil antidaluzes, com minha arma. Posso fazer desaparecer um vulcão, ou uma montanha, com um movimento. Deseja que eu me torne um assassino, como Rakr? Devemos unir-nos, todas as tribos aos Panchuayas, Anquez.

— Para quê? Para ver a traição vir na forma de um coração arrancado, John? Você tem boas intenções, mas matar e destruir às vezes é preferível a ser atingido por uma flecha traiçoeira — ele fez sinal para os guerreiros atravessarem a ponte e virou-se para mim, dizendo: — Os Panchuayas levaram minhas três filhas, uma começando a puberdade e as outras demasiado pequenas para perceberem qualquer dor. Concedo a Rakr a liberdade de se jogar no abismo de Serkt.

Anquez levantou com o braço esquerdo o corpo de Rakr e o sacudiu. Ele estava tonto, mas acordado. O índio forte arremessou o meu algoz junto ao despenhadeiro de rocha e falou:

— Agora salte! Será uma única dor, estatelar-se contra o fundo do precipício, mas se não pular, uma dúzia de flechas e lanças o trespassarão, antes de cair.

— É preferível morrer lutando contra você, a me acovardar como um Darksar! Venha e veja se consegue me jogar no abismo!

— Acabem com esse inseto. Como uma almofada de alfinetes — foram as únicas palavras que Anquez disse. A seguir, seguiu para o primeiro bloco de concreto da ponte e ficou observando as flechas serem disparadas contra Rakr.

 

--//--

 

— O que está dizendo, Anquez? Uma dúzia de bravos guerreiros contra um Panchuaya?

Era Ordiz, pai do índio que liderara a expedição contra os Panchuayas, que falara. Anquez levantou o queixo e continuou em silêncio, na cabana onde se deliberavam decisões de grande importância.

— Os Panchuayas levaram minha esposa, na penúltima incursão, Ordiz — murmurou Anquez, o rosto escondendo as emoções. — Sabe o que fariam com ela e com Tessit, minha filha mais velha. E que provavelmente já o fizeram.

— Você não pode ter certeza! Você não está sempre certo! Rakr era um espião maldito, mas precisaríamos dele para fazer uma trégua com nossos oponentes! O que você fará a seguir, Anquez?

Silêncio caiu sobre cem Darksares, sentados na areia da cabana, as pernas cruzadas. Em algum tempo, cochichos irromperam, aqui e ali. Ordiz estava sentado em um cadeirão de madeira, ladeado pelo Conselho de Guerra, e Anquez se posicionara de pé, defronte ao pai, a mão direita segurando o punho esquerdo. Era sinal de respeito.

Eu esperava na entrada da cabana por uma decisão. Era proibido para um membro de outra tribo me aproximar do Conselho, ou mesmo, de entrar na habitação. E calculei que o mesmo valia para um estrangeiro. Refletia em como poderia ajudar nessa situação tão difícil, quando Ordiz se levantou e apontou para minha direção. Quando Anquez chegou ao meu lado, falou em voz baixa:

— Fui expulso. Vamos até os Panchuayas, em sua aldeia maior. Vamos resgatar minha família.

— Eu já calculava isso, Anquez. Não sou Darksar, portanto irei. Seu pai não pode mandar em mim.

— Quando sair da aldeia, iremos até a aldeia Panchuaya e lutaremos com cada inimigo.  Os mataremos. Faremos isso da sua maneira, limpa, ou da minha, caso se confirme o que eu penso que aconteceu com os bebês e minha filha. Minha mulher, eles contarão o que aconteceu a ela, mas não tenho esperanças. Portanto, é quase certo que faremos da minha maneira — Anquez olhava para a escuridão enquanto me contava de seus planos. Quando acabou, continuou em frente, até desaparecer no escuro do exterior da aldeia.

Eu ouvi as conversas de índios, às vezes a favor de Ordiz, em outras vezes defendendo Anquez. O burburinho continuou por muito tempo e eu esperei todos saírem da cabana do Conselho e se recolherem, para sair da aldeia. Os indígenas que guardavam a saída da paliçada me deixaram passar. Andei um quilômetro, os sentidos alertas, quando ouvi um movimento a cinco metros.

— Quieto — sussurrou o índio. — Siga-me.

Caminhamos pela floresta escura, minha visão adaptando-se com rapidez ao negrume da noite. Passamos por trilhas que levavam a lagos e riachos, até chegarmos a uma que nos guiaria até um rio de grandes proporções. Às margens, Anquez pulou para dentro de uma canoa. Eu o segui e o índio segurou dois remos, que jaziam no fundo da embarcação.

Ele remou por um tempo indefinido. Quando me dei conta, a madrugada dera lugar à noite. Ele rumou para a margem direita e levantou os remos. Pousou-os na canoa e levantou-se, equilibrando-se. Saiu, com um mínimo de ruído, e fez sinal com a mão para mim. As margens do rio elevavam-se uns quinze metros e tivemos de escalar a vertente. Do outro lado, uma concentração de cabanas três vezes maior que a da aldeia dos Darksar estendia-se em um perímetro de vinte quilômetros.

Os índios se encontravam adormecidos, com exceção dos vigias e de alguns, que perambulavam pela área. Anquez apontou para a esquerda e, agachado, começou a se dirigir para o a direção oposta. Segurei-o pelo braço.

— Anquez, se quer minha ajuda, faremos da minha maneira. Colocamos todos para dormir, com meu disruptor — tirei o dispositivo do bolso e o mostrei a ele, nesse instante —, e procuramos por sua família.

— De modo algum, meu amigo. Se quer que eu volte a ter paz de espírito, derramaremos sangue — ele sacou duas facas da cintura e golpeou o ar.

— Pense, homem! Se matar um Panchuaya que seja, toda a tribo deles entrará em guerra contra os Darksar, até não restar um vivo, de cada lado! — O aborígene remoeu a ideia, movendo os lábios e falou: — Eles guerrearão conosco, de qualquer maneira. Prefiro morrer lutando!

— Sua filha será estuprada e morta, e sua mulher, torturada. Suas outras filhas serão mortas com requintes de crueldade. Pense, pense nisso!

Anquez guardou suas facas. Falou:

— Nos ajudará a fazer trégua com os Panchuayas?

— Farei o possível, mas somente se sua família estiver bem.

— Vamos até a entrada Leste da aldeia — dirigimo-nos para a direita, agachados, tentando permanecer em silêncio, á medida que progredíamos pela relva. Chegamos ao ponto de virada da paliçada da aldeia, em que poderíamos alcançar a entrada. Haviam cinco índios guardando o portão.

Ajustei minha arma e disparei. Todos os Panchuayas desabaram no solo. Anquez foi até os corpos e acenou com a cabeça. No interior da aldeia, vimos seis indígenas fazendo a ronda noturna e disparei contra eles. Prostraram-se no chão, inertes.

Fomos de cabana em cabana, colocando todos em estado catártico. Anquez sacou sua faca, ao ouvir um ruído. Um guarda entrara na cabana e eu desferi um pontapé em seus testículos, com toda força. Ele caiu de joelhos gemendo e eu o coloquei para dormir, com o disruptor.

Pusemo-nos a procurar as filhas e a mulher do Darksar. Encontravam-se em  outra parte, fora das cabanas, e, em meia hora perambulando por toda a área, encontramos um toldo de tecido trançado disposto na terra, a um canto da aldeia, no ponto mais afastado e escuro.

Anquez cortou com uma faca os nós e cordões que mantinham o toldo preso ao solo e esteve perto de gritar, de felicidade. Sua esposa e filhas se encontravam na escavação e o índio puxou-as, libertando-as. Todas estavam bem, mas extenuadas. Precisávamos sair para a floresta, naquele momento.

— Vamos ter de chegar à aldeia Darksar, amada minha — Anquez falou para sua mulher. — Eu te carregarei nos braços.

Levando os dois bebês, um em cada braço, e tendo ao lado do pai a filha mais velha, Anquez soergueu sua esposa e corremos. Deixamo-nos deslizar pela encosta que levava às margens do rio onde havíamos deixado a canoa e Anquez começou a remar, quando todos nos encontramos prontos para partir.

Chegamos à aldeia dos Darksar e, a um primeiro momento, os guardas do portão olharam estupefatos para nós. Abaixaram os arcos e tacapes e disseram para segui-los.

Chegamos à cabana de Ordiz, guardada por seguranças armados até os dentes. Anquez conversou por alguns minutos com eles, contando nossos feitos. Eles deixaram-nos entrar na cabana.

— O que veio fazer... — o pai de Anquez começou a falar. Mas, vendo sua nora e seus netos, relaxou. — Filho, resgatou nossa família, das mãos dos Panchuayas. Devo tudo a você.

Anquez ajoelhou-se aos pés do chefe dos Darksar e disse:

— Elas estão bem. Little John derrubou um de nossos inimigos, usando toda a força que tinha e o pôs para dormir. Nocauteou todos os Panchuayas com sua arma!

— Devo reconsiderar minha decisão. Organizemos um grupo de dez guerreiros e vamos até onde a aldeia dos Panchuayas está. Quero falar com Azsis, o chefe deles. Levaremos oferendas e presentes. Quero a paz, Anquez, apenas a paz, que há muito não é vista por essas terras.

— Também devo ir, chefe — interrompi o homem idoso. — Minha arma nos protegerá de toda a tribo, caso queiram nos prender ou nos matar.

— Little John, é bem-vindo. Preparemo-nos, todos!

Em três compridas canoas, atingimos o território dos Panchuayas em duas horas. Dessa vez, seguimos para a aldeia deles sem a proteção da floresta, nos dirigindo direto para a entrada. Vi que havia uma algazarra ocorrendo no meio das cabanas. Ultrapassamos o portão aberto e o chefe Panchuaya nos apontou os dedos.

— Aquele! Aquele é o responsável, o estrangeiro! Acabem com ele!

Saquei o disruptor e apontei-o para o chão. Ajustei o tiro para meia força. O solo explodia, onde eu o atingia, todos tapando os ouvidos, alguns caindo de joelhos, inclusive dois de nosso grupo.

— Quer um tratado de paz, chefe Azsis? Terá de entrar em acordo conosco, para isso. Não viemos em busca de violência, trouxemos bebida sem álcool para celebrarmos o tratado, depois de assinado com seu e meu sangue.

— O forasteiro dizimou uma pequena aldeia, próxima ao mar. Por que o está defendendo, Ordiz?

— Porque ele pode oferecer proteção para todos, através de suas armas.

Azsis permaneceu em silêncio. Nuvens cobriram o Sol, uma brisa suave e quente começou a soprar, aumentando de intensidade.

— Vê? Este é o mês de atividade dos vulcões. Cobrirão a terra com seu líquido incandescente e destruirão nossas aldeias e plantações. Teremos de nos mudar com frequência, mesmo ir para as terras geladas do Norte — o chefe Panchuaya mordeu os lábios, perante a afirmação de Ordiz. Perguntou:

— Como uma arma como esta pode deter o poder de um vulcão?

— Este dispositivo é de minha terra. Fabricado com o que há de mais poderoso, em termos de potência destrutiva. É do tamanho da palma de minha mão, nem maior, nem menor. Sua tecnologia permite com que eu desintegre montanhas inteiras. “Desintegrar” significa aniquilar, destruir de modo tão completo um objeto, que não restará rastro nenhum dele para ser identificado.

— Você fala como um homem culto, estrangeiro — disse o chefe dos Panchuayas. — Como vai deter o poder da lava, que vem do interior de Antidaluz?

— A lava pode ser erradicada. Construirei outros aparelhos como este. Devastaremos os vulcões que poderão se tornar ativos em breve. Será necessário que viajem até cada um deles. Farei outras armas, com o que sobrou de minha nave, o meu veículo de transporte, além de acoplar amplificadores de energia, a cada um dos aparelhos.

Voltando às praias, entrei nos escombros de minha nave e pus-me a trabalhar. De uma potência suficiente para matar, converti minha arma em algo pesado, estranho, até. Poderia matar milhares, com um tiro. E converter montanhas em poeira pura. Com o material da cabine de comando, consegui montar oito daqueles dispositivos, instalando amplificadores de energia em cada um, regulando-os para serem armas eficientes e devastadoras.

Os Panchuayas e os Darksar formaram grupos mistos, se dirigindo aos vulcões conhecidos por serem perigosos o bastante para que os erradicássemos da face de Antidaluz. O problema de se criar um campo eletromagnético daquele nível era o ruído. Consegui montar um supressor acústico de tal magnitude, que dissiparia ondas sonoras em um raio de vinte quilômetros. A maior das montanhas situava-se junto de uma cidade que havia sido consumida, no passado, pela lava.

Contamos os segundos, quando Anquez disparou um tiro na potência máxima. Ordiz, Azsis e eu ficamos boquiabertos quando o vulcão desapareceu, sem deixar pistas, levando dez segundos para se converter em nada.

— E a lava, Little John? Não irromperá à superfície, abrindo fendas e crateras e inundando a cidade com seu poder de destruição? — Azsis falou. Percebi que ele estava nervoso. Acalmei-o, demonstrando firmeza nas palavras:

— Estamos em um período de transição. As forças que agem no interior do planeta estão inquietas. Pelo que entendi, cedo ou tarde teremos uma catástrofe. Uma equipe de Panchuayas e Darksares deverá permanecer nas imediações dos vulcões extintos por dois meses, desintegrando a lava que brotará da terra. É o único modo de contê-la que eu conheço, chefe.

Foi feito. Em três meses, devastamos dezesseis vulcões, um deles já ativo, soltando rolos de fumaça a três quilômetros de altura. Quando chegamos no local, a terra tremia. Desfizemos a montanha e a lava começou a inundar a paisagem, por fendas que abria na planície recém-formada. Detonamos a arma duas vezes, mas a lava continuava a irromper. Por três semanas, lutamos contra o líquido com odor de enxofre. A terra tremia, ribombar era ouvido, os céus se enchiam de fuligem.

Por fim, a onda de erupções cessou. Eu falei a Ordiz, Anquez e Azsis:

— É imperativo deixar um grupo neste local, para impedir que mais lava venha a consumir a floresta e as vilas em torno do vulcão. As plantações dão frutas, verduras, cereais e legumes, devem ser conservadas a qualquer custo. Estamos a quinhentos metros do ponto mais próximo de erupção. A terra deixou de tremer, há alguns minutos — virei-me para o local onde existira o vulcão, onde, sob a superfície da terra, fumaça tóxica era produzida e teimava em surgir na planície. Disse, pensando no futuro: — As duas grandes tribos devem assinar um tratado de paz. Agir em conjunto, fazendo uma parceria para impedir que outras montanhas se tornem vulcões ativos, destruindo a lava que irrompe e sempre irromperá do subterrâneo.

Na aldeia Panchuaya, Ordiz sentou-se a uma mesa, defronte a Azsis. Falou:

— Saco minha faca de combate, para verter sangue em nome de nossa recente amizade. Há fatos e coisas na vida mais importantes do que luta e derramamento de sangue — o velho chefe cortou superficialmente a palma da mão.

— Selemos nossa amizade e confraternizemos por Little John haver surgido em nossa curta existência — Azsis olhou para mim, sentado em outra cadeira, e passou a lâmina de sua faca na mão esquerda. A seguir, os dois chefes deram as mãos, misturando o sangue e a vontade de lutar entre eles. Agora, com a cerimônia executada, não haveria motivo para o combate, pois o combate entre eles se mantinha, a partir desse momento, preso entre o sangue dos dois povos. Não poderia irromper na forma de guerras, da mesma forma que a lava seria impedida de se espalhar à superfície. O sangue deixara de ferver. Os vulcões poderiam voltar a se manifestar, mas as tribos sempre estariam dispostas a converter lava em ar puro.

Naquela noite, Anquez se acocorara perto da entrada da aldeia Darksar. Sentei-me a seu lado.

— Vai nos deixar, amigo?

— Por que pergunta isso, Anquez? Minha meta é continuar neste planeta, ajudando a manter a paz entre as tribos.

— Você tem família, John?

— Nunca te disse isso, não é? Tenho duas famílias em minha terra natal, situada muito, muito longe. Mas, se quisesse voltar para lá, seria impossível isso. Veja, olhe para aquele anel de estrelas que orbita um Sol gigantesco. É impossível discernir a estrela gigante, mas o anel é de tal forma brilhante, que poderá observá-lo.

— É sua morada natal?

— Venho de um planeta onde a terra é fértil, os campos são verdes e os mares azuis e translúcidos. Suas florestas crescem sem que ninguém precise vigiar o desmatamento, pois o homem, em meu planeta, tem consciência inata da importância da existência da fauna e da flora, nas florestas e bosques. Os rios e lagos são puros, pode-se beber a água deles sem ser tomado por febres e vômitos.

Anquez ergueu o corpo musculoso e falou:

— Eu gostaria de visitar seu planeta, John. Um dia desses, talvez eu vá até lá. É tão perto, está a uma distância de um braço de mim.

Ele me deixou sentado na terra, onde eu havia cruzado as pernas, e pensei:

“Deve se passar vinte gerações, antes de conseguirem enviar um antidaluz para órbita. Não vai ser fácil, não vai”.

Fiquei por meia hora olhando as estrelas, apoiado com meus braços no solo e sem pensar em nada. Levantei-me e fui dormir, na grande cabana que haviam me oferecido com tanta gentileza, em agradecimento.


*Sobre Roberto Fiori:

Escritor de Literatura Fantástica. Natural de São Paulo, reside atualmente em Vargem Grande Paulista, no Estado de São Paulo. Graduou-se na FATEC – SP e trabalhou por anos como free-lancer em Informática. Estudou pintura a óleo. Hoje, dedica-se somente à literatura, tendo como hobby sua guitarra elétrica. Estudou literatura com o escritor, poeta, cineasta e pintor André Carneiro, na Oficina da Palavra, em São Paulo. Mas Roberto não é somente aficionado por Ficção Científica, Fantasia e Horror. Admira toda forma de arte, arte que, segundo o escritor, quando realizada com bom gosto e técnica apurada, torna-se uma manifestação do espírito elevada e extremamente valiosa.

Sobre o livro Cedrik - Espada & Sangue:

“Em uma época perdida no Tempo,

onde a Escuridão ameaçava todos,

surgiu um líder.

Destruição, morte, tudo conspirava contra.

Mas era um Homem de extremos, audacioso.

Era um Homem sem medo”. 

Dos Relatos e das Crônicas da Velha Terra.  


Em sua obra “Cedrik – Espada & Sangue”, o escritor Roberto Fiori coloca sua imaginação e força de vontade à prova, para escrever seu primeiro romance. Um livro de Fantasia Heroica, no gênero Espada & Feitiçaria, em que, em uma realidade paralela, a Terra da Idade do Ferro torna-se campo de lutas, bravura, magia e paixão.

Cedrik é um Guerreiro capaz de levantar 75 kg em cada braço e, ao mesmo tempo, de escalar uma parede vertical de mais de 20 metros de altura facilmente. Em meio a ameaças poderosas, parte para o Leste, em missão de vingança. Acompanham-no a bela princesa Vivian, vinda do Extremo Leste, e o fiel amigo Sandial, o Ancião, grande arqueiro e amigo a toda prova.

Os amigos enfrentam demônios, monstros, piratas e bandidos sanguinários. Usam de magia para se tornarem fisicamente invencíveis. Combatem demônios vindos do Inferno, no Grande Mar. Vivian é guardiã e protetora do Necrofilium, livro que contém maldições, feitiços e encantamentos em suas páginas.

A intenção do autor é continuar por anos as aventuras de Cedrik, escrevendo sobre todo um Universo Fantástico, em que bárbaros e guerreiros travam lutas ferozes e feitiçaria não é uma questão somente de “se acreditar” em seu poder, mas de realmente utilizá-lo para a batalha, como uma arma.

A obra pode ser adquirida com o autor, pelo e-mail spbras2000@gmail.com,  no site da Editora Livros Ilimitados, em livrarias virtuais e no formato de e-book, na Amazon. Os links para acessar o livro são:

1.     Americanas.com:

https://www.americanas.com.br/produto/3200481831?pfm_carac=cedrik-espada-e-sangue&pfm_index=2&pfm_page=search&pfm_pos=grid&pfm_type=search_page

2.     Submarino.com:

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4.     Site da Editora Livros Ilimitados:

https://www.livrosilimitados.com/product-page/cedrik-espada-e-sangue

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segunda-feira, 16 de agosto de 2021

Conto, “A Luta”, por Roberto Fiori


— Logo virão dias frios, Manfreya.

— Sei disso, meu senhor — a moça respondeu, os cabelos longos cobrindo o rosto e a cabeça baixa.

— Aqui, em Islandir, possuímos tudo — Lord Valleys esperou pela resposta, sua paciência era ilimitada. Mas, cinco minutos de espera foram o bastante para convencê-lo de que a mulher esperava por sua palavra. — Menos calor. Vá para o Norte, onde as terras são boas para constituir uma família. É hora.

O homenzarrão levantou-se de seu trono de madeira pesada de lei e agachou-se junto a sua protegida. 

— Não quero que acabe como os rapazes dessa cidade, ou como qualquer moça que viva em minhas terras. Os garotos estão, ou no Exército, ou nos navios da Marinha, e as jovens são meras donas-de-casa. Esperando por seu marido morto em uma luta que se aproxima.

— Não, meu Lord. Não quero desposar um homem de Islandir. Quero aprender o uso da espada e da lança, do machado e do arco, me defender com um escudo e fortalecer-me como o senhor.

— Quer entrar para as forças armadas, então...?

— Quero ser a melhor, entre as mais fortes. Não desejo ficar e me tornar soldado. Quero ser livre para usar minha força onde os fracos são humilhados e vencidos, onde as mulheres e crianças correm perigo. Mas preciso de um guia, de um Mestre, que me faça adquirir força e coragem.

— Conheço uma tribo de guerreiros, a Leste. Encontre Sibarand, seu chefe. Diga que Lord Valleys a enviou. — O gigante enfiou a mão no bolso e tirou uma medalha. Buscou em outro bolso das calças e atou uma corrente à medalha de ouro. — Os meus mais valentes homens já visitaram tal lugar. Aprenderam muito. Você descobrirá formas de se defender e de matar como jamais imaginaria. Se quer ser uma mercenária, ainda que por bons motivos, correr o mundo, afastada de Islandir, é livre para isso. Mas os perigos são muitos, e muitas são as maneiras de iludir o inimigo. Tome.

Ele estendeu a medalha dourada com sua efígie e, pela primeira vez em que se encontraram na casa real, Manfreya descobriu seu rosto, afastando seus cabelos rebeldes, e sorriu. Apanhou a moeda e disse:

— Obrigada — estava claro para ambos qual seria o destino de Manfreya, vagar pelo mundo mau e áspero e travar sua luta contra inimigos sem coração.

--//--

Ela era bela, mas sua aparência pouco importava. Tinha energia para derrotar muitos, inata, e pretendia ir além. Sabia que a aldeia de Sibarand localizava-se em uma região inóspita, onde bandidos e saqueadores ficavam à espreita de quem se aproximasse. Uma ou outra incursão, os guerreiros do povoado faziam nos arredores, matando e afugentando os meliantes, mas isso durava pouco. Em pouco tempo, os ladrões voltavam a rondar os arredores da aldeia.

Manfreya encontrou-se com três deles, na estrada que levava ao seu destino.

— Deixem-me passar! Sou protegida de Lord Valleys, tenho o direito de atravessar!

Eles se aproximaram do cavalo da mulher, a pé. Conheciam Valleys de nome, o que era o bastante para tentarem roubar a mulher. Quando seguraram as rédeas da montaria, Manfreya puxou-as, fez o cavalo empinar e suas patas dianteiras atingiram o homem à esquerda, que caiu. O cavalo negro pisoteou-o na cabeça, esmagando-a. O ladrão que segurara as rédeas pela direita foi jogado à distância. 

A mulher viu quando o terceiro armava um arco, preparando-se. Ela retirou do cinto uma adaga, que arremessou, enterrando-a na testa do bandido. Com os calcanhares, Manfreya fez seu alazão disparar. O último malfeitor arrastou-se e tomou o arco do terceiro homem, armou-o e disparou. A flecha teria atingido as costas da jovem, mas ela estava fora de alcance.

Uma floresta estendia-se até o horizonte, pelos dois lados da estrada de terra. Manfreya desmontou e continuou a viagem a pé por uma trilha que se embrenhava à direita da estrada, conduzindo o animal pelas rédeas. Ouviu uma algazarra e amarrou o cavalo em um arbusto. Queria ver quem eram seus adversários, em vez de lutar e tentar vencê-los em luta que poderia ser fatal.

Eram cem a cento e cinquenta homens e mulheres, ao redor das cinzas de cinco fogueiras acesas na noite anterior. Bebiam, comiam, alguns amavam-se nas cercanias do acampamento, entre as moitas. Dois homens começaram uma briga. Sacaram facas. O duelo seria até a morte, isso era bem-vindo entre os grupos de vagabundos e assaltantes. A comida seria melhor distribuída, iria diminuir o número dos pretendentes ao dinheiro e ouro roubado em pilhagens. Inúmeras vantagens eram conseguidas, com essas lutas. Manfreya apurou a visão. 

Um dos lutadores era alto e forte, musculoso, enquanto que o outro era ágil e franzino. Lançou-se contra o maior, cortando-o no rosto. O homem forte segurou o pequeno e o levantou do chão com um braço. Sua faca cortou a barriga do homenzinho do pescoço à pélvis, fundo. Suas entranhas escorreram para o chão e o grandalhão enterrou a arma na nuca do corpo sem vida, retirando-a e limpando-a nas vestes do outro.

Largou-o. Houve uma salva de palmas e Manfreya decidiu passar ao largo do acampamento. Voltou a seu cavalo e, puxando-o, passou para o outro lado da estrada, olhando para todas as direções, em busca de perigo.

Em meio dia de caminhada, escondida pelas árvores e vegetação da floresta, a amazona atingiu um lugar em que podia ver os muros da aldeia de Sibarand. Havia uma largo portão aberto em meio a uma muralha alta de quinze metros de altura, de pedra e argamassa. A mulher vasculhou as redondezas da floresta, caminhando sem ruído por algumas centenas de metros de raio. Sem encontrar vivalma, voltou aonde tinha deixado seu cavalo e montou. Trotou, ansiosa, até o portão, e foi cercada por jovens barbados, que a deixaram sem ação, encostando em seu corpo lâminas de espadas e apontando arbaletas contra ela.

— Estou à procura de Sibarand.

— Quem? — responderam, alertas.

— O seu chefe. Lord Valleys me enviou, para aprender as artes da luta e da guerra. Vejam — os homens ameaçaram cortá-la, pressionando as espadas contra seu corpo, e aproximando as bestas de sua cabeça. Com vagar, ela segurou a corrente de seu pescoço e tirou o medalhão. — Esta é uma medalha de boa sorte, que Lord Valleys me deu, antes de eu vir para esta aldeia. Seu líder a reconhecerá. 

A princípio, os jovens ignoraram o medalhão. Mas um deles estendeu, por fim, sua mão e passou os dedos na superfície do círculo dourado.

— É ouro legítimo, Sargard. A figura incrustada é a de Sibarand, isso é mais que certo. 

— Leas, tem bom tato. Levemos a jovem até Sibarand — e, olhando firme para Manfreya, falou: — Tem sorte, minha jovem. Se é luta e guerra que procura, nós as temos em quantidade! Qual o seu nome?

— Manfreya — ela sorriu e disse baixinho um “obrigada”. A aldeia constituía-se de casas de pedra e madeira, dispostas em ruas que se entrecruzavam na perpendicular. No centro exato desse diagrama, situava-se uma casa de bom tamanho, onde um telhado de doze águas abrigava torreões de vigília e por onde se poderia defender com eficiência a propriedade. Manfreya apeou do cavalo, quando chegaram à entrada do terreno, nu e de terra batida. Ela pensou que seria uma ótima fortaleza, a construção. Um dos jovens, o que chamavam de Sargard, passou com o corpanzil pelo grande portão, destrancado, e bateu com a arbaleta em uma placa de metal fixada na cerca que rodeava a área sem o mínimo traço de vegetação. Esperaram dez minutos. Da porta da frente, surgiram aldeões armados e trajando armaduras. 

— O que quer, Sargard? — o homem mais alto perguntou, alto.

— É da parte de Lord Valleys. Uma mulher quer ver Sibarand, em pessoa. Quer aprender as artes ocultas da luta e da guerra.

— Hoje, meu chefe não está para ninguém, Sargard. Volte amanhã.

— Tenho uma prova de que ela está falando a verdade.

Silêncio. Espera.

— Que prova?

— Um medalhão de ouro, com a efígie de Sibarand gravada. Leas pode confirmar isso. Ele é a pessoa com as maiores capacidades sensitivas que existem no povoado. Você o conhece.

— Ele é cego.

— Reconhece melhor que você uma arte feita em baixo-relevo. Conhece metais, distingue o ouro da prata, o ouro do estanho, o ouro do ferro e bronze.

O homem na porta da fortaleza disse que queria ver o medalhão, mas Sargard abanou a cabeça. 

— Vou entregar o medalhão para Sibarand, eu mesmo — e completou, com delicadeza, curvando a cabeça: — Se não se importar, claro.

O guarda com armadura cuspiu e falou para vir com ele. O medalhão estava no bolso da camisa de Sargard.

— Hoje não, Gand, hoje não. Estou febril — falou Sibarand para o guarda, que havia deixado Sargard esperando na parte da frente da casa, e entrara no quarto do chefe.

— Ela diz ser enviada de Lord Valleys, chefe.

— Por que ela veio? — arquejou Sibarand, transpirando como se houvesse acabado de terminar uma batalha.

— A mulher diz querer ser sua discípula na arte da luta, do combate, da guerra e tudo o que pede é uma palavra com o senhor.

— Se Lord Valleys a enviou, o motivo é bem sério, Gand. Deixe-a entrar em meus aposentos — falou o homem, tossindo em convulsões. Gand esperou. Sabia que as palavras de seu senhor haviam sido interrompidas pela febre. — Diga-lhe que eu a ouvirei, mas falarei o necessário. O necessário.

Gand fez uma mesura e retirou-se. Na sala da frente da casa, fez sinal para Sargard se aproximar e disse:

— Ele está com a respiração difícil, falar é um esforço grande para Sibarand. Mas concordou em ouvir o que a jovem tem a dizer. Diga-me, tem cem por cento de certeza que ela possui o Medalhão de Valleys?

— Se Leas afirma possuir o rosto de Valleys na cara da moeda e esta é feita de ouro, não duvido de Manfreya.

O rosto de Gand iluminou-se. Manfreya, a mais hábil nas facas! A que brigava como um leão! A que derrotara cinco homens fortes, meliantes que invadiram sua casa! Esta era Manfreya! O guarda sorriu e saiu pela porta, seguido do jovem Sargard.

— Você é Manfreya, portanto. Pode me seguir, minha jovem. Se eu soubesse de seu nome desde o começo, tempo seria poupado. Venha.

A mulher seguiu Gand pelo portão aberto e entrou na casa. O guarda fez sinal para ela esperar um pouco e falou:

— Meu senhor está fraco e doente. Fale tudo o que tem a dizer, não omita nada. Fale de seu passado, de suas lutas e suas habilidades com armas. Convença-o de que vale seu peso em ouro, tal como o Medalhão de Valleys. Somente assim poderá convencer Sibarand de que é apta a ser treinada por mim.

Ela murmurou “Sim, senhor” e avançou, seguindo o guarda.

Nos aposentos de Sibarand, este estava dormindo. Gand olhou para a jovem e pôs o indicador nos lábios. Aproximou-se da cama de seu senhor. O tórax volumoso do doente subia e descia com ritmo e força. Remexeu-se, abrindo os olhos. Viu Manfreya e a reconheceu. Fez sinal para Gand se aproximar. A jovem mulher manteve-se em silêncio, até que o segurança abanou a cabeça para Sibarand e endireitou-se. Ele esperou alguns segundos e voltou-se, saindo do aposento.

Manfreya contou sua vida, suas brigas quando criança, a possibilidade que, quando crescera, de matar e se recusar a fazê-lo, deixando seus inimigos partirem. Falou das condições que tinha em Islandir como lutadora, podendo entrar nas fileiras do Exército ou da Marinha de Lord Valleys. Porém, a liberdade de se realizar além das forças armadas surgia com cada vez maior intensidade. Desejava ser a número um em lutas, combates corpo-a-corpo e uso de todo e qualquer tipo de arma. Queria ser a mais forte, a mais sagaz, de corpo e mente. Mas precisava de um mestre que a qualificasse para tal. Desejava lutar em prol dos mais fracos. Desejava fazer Justiça, a verdadeira Justiça não corrompida, não vilanizada. E via no chefe Sibarand o meio de alcançar tal objetivo.

Ela ficou em silêncio, por alguns minutos, esperando. O chefe do povoado fechara os olhos e começou a mover os lábios, sussurrando algo. Manfreya se aproximou e pôde distinguir as palavras, ditas de modo baixo, mas nítidas. 

— Mostre-me o medalhão, Manfreya. Quero rever meu amigo Valleys antes de morrer.

Ela tirou o medalhão do bolso de sua camisa, sob o manto que a mantinha aquecida naquele Inverno, e colocou-o sobre o peito de Sibarand. Ele fechou os olhos mais-que-cansados e os abriu, com um novo brilho, ao ver a moeda. Arrastou a mão direita das cobertas e seus dedos enclavinharam-se com força em volta do medalhão. Levantou o braço enfraquecido e viu o que mais desejava, naquele momento, o rosto de seu amigo querido.

Fitou a figura gravada na moeda por mais de um minuto. Virou a cabeça para Manfreya e abanou a cabeça.

— Fique aqui, se quiser aprender a matar. Volte então para Islandir e mostre do que é capaz. Corra o mundo em busca da Justiça, se assim lhe apetece. Busque os valores, não as vitórias. Impeça o sofrimento e a matança indiscriminada. E acabe com os ladrões que enxameiam perto de minha aldeia. Liberte Vanhorn dessa praga de uma vez por todas — ele fechou os olhos, a jovem percebendo ser o momento de sair.

Manfreya deixou seu medalhão com Sibarand. Pensou que seria um alívio para as dores que estivesse sentindo, na cama. Gand a esperava, na ampla sala da frente da casa. Perguntou:

— E?

— Ele me deu permissão para ficar e aprender a lutar, a matar, a guerrear. Deu-me ordens de destruir os saqueadores que enxameiam as terras perto de Vanhorn. Deu-me permissão para sair e correr o mundo, ao fim do treinamento.

Gand sorriu e disse:

— Mostre-me do que é capaz, no centro de treinamentos. Se me derrubar, uma única vez, será capaz de derrotar a maioria dos soldados e mercenários que habitam este continente, em luta corpo-a-corpo.

O primeiro golpe a atingiu no estômago, dado com o lado do pé de Gand. Em seguida, uma cutilada com força a teria quase matado, se a atingisse na nuca. Mas Manfreya estava alerta e seus reflexos eram rápidos. Aparou o golpe.

Ela acertou um soco entre as pernas de Gand, que pareceu não sentir nada. O homem alto jogou suas pernas contra o pescoço da jovem, que se desviou e levantou a perna direita, atingindo-o na nuca. Ele caiu de costas, arfando.

— Você luta bem — disse o guarda, passando a mão na nuca. — Sabe de uma coisa? Será bom treinar com cada um dos outros soldados, com tudo o que tivermos em alcance. Você sabe, arcos, arbaletas, catapultas, bastões, lanças, facas. Adagas. Espadas, escudos, machados, correntes, com tudo o que tivermos à mão, em todas as situações imaginárias. Com as mãos contra adversários armados até os dentes. Daqui a um ano estará em boa forma. Ora, está doendo, minha nuca! Deu tudo, nesse pontapé, Manfreya?

— Não, Gand, não usei nem a metade de minha força total.

Ele levantou o braço e pediu para que ela o ajudasse a se levantar. Ela o puxou, cento e dez quilos de músculo em um metro e noventa e nove centímetros de altura, sem esforço.

--//--

Quatorze horas diárias de treinos com facas, a especialidade dela. Era o que fizeram por três meses. Usaram facas de corte reto, serrilhadas, de trinchar peixes, punhais, atiraram adagas a distância até se cansarem. Manfreya gostou da sensação de estar entre homens rústicos, mas que a deixavam segura de que era uma lutadora de primeiro escalão. Todos eram fortes, todos queriam competir com a jovem. Ela se tornara famosa, desde que começara o treinamento e desarmara um Capitão com uma faca serrilhada. Edvard era uma das principais autoridades no exército de Sibarand, no que se referia a combates corpo-a-corpo. 

Manfreya lutou com as mãos nuas contra Gand, primeiro, e foi derrubada. Uma rasteira e uma cotovelada em seu ventre a jogou contra o chão. Ela saltou, afastando-se do segurança de Sibarand, que era o Comandante do Exército, ao mesmo tempo. Com Edvard, este era um tanto bruto. Deixou-a tonta, com um soco contra seu nariz. Sangue começou a correr, mas Manfreya disse para a luta continuar. Trocou golpes fracos com seu oponente, até sentir os reflexos do capitão. Então, encontrou uma brecha nas defesas de seu adversário e desferiu um pontapé com todas as forças entre as pernas do outro, que ficou paralisado. E acabou a luta com um rodopio de seu corpo esbelto e ágil, acertando o maxilar de Edvard com o calcanhar. Ele tombou, caindo de lado, desfalecido.

— Você usou toda a sua força, Manfreya? — disse Gand, examinando o corpo estirado no chão. 

— Acho que ele não será capaz de andar por algum tempo, Comandante. Eu não o acertei com força na cabeça. Ele estaria morto, então.

Os dias se passaram sem que ninguém, a não ser Gand, a pusesse de costas no solo. Mas a mulher começava a sentir-se forte. Com as espadas, tornou-se perita. Poderia matar qualquer um, menos o Capitão Edvard e o Comandante. Os soldados a respeitavam, como se ela fosse um soldado homem, e não uma dona-de-casa, ou uma mulher fútil e sem valor.

Os treinos com todos os tipos de armas foram executados. Defendida com uma faca de cozinha, usada de propósito para tornar as lutas mais difíceis, Manfreya desarmou até o Capitão Edvard e o golpeou no estômago com o lado da faca. Ponto para a jovem. 

Mas Gand observara a luta com atenção redobrada. E, quando a luta entre a mulher e o Capitão se encerrou, a penúltima entre todos os membros do Exército, Gand disse, em voz alta:

— Se quer derrotar qualquer um, deve triplicar seus esforços, Manfreya. Deve fazer seu corpo e sua arma se tornarem uma única coisa, um único instrumento mortal — o Comandante sacou sua espada e foi até o mostruário das armas, de onde retirou um machado. 

— Você está cansada e não me venceu em qualquer luta, até hoje. Apenas me atingiu na nuca, no começo dos combates que travamos. Vamos ver como você se sai contra essas duas belezinhas — Gand girou no ar seu machado e desferiu, ao mesmo tempo, golpes fortes com sua espada.

Manfreya concentrou-se. Desviava-se das estocadas e golpes dados ao mesmo tempo com as duas armas de Gand, rolando no chão e pondo-se fora do alcance dele. Seus reflexos revelaram-se fora do comum, ela atingindo mais e mais o Comandante, com sua faca de cozinha nos ombros, braços e pernas. Transcorrida meia hora de exercícios, nem ela, nem Gand se encontravam cansados. O segurança real sorriu. 

— Eu já estaria morto, caso sua faca fosse afiada e você me acertasse para valer no estômago, pescoço, nos olhos, ou entre as pernas. Concedo a você esta vitória — ele andou em direção de Manfreya, largou o machado e a espada e a abraçou. — Continuando com essa rotina de lutas, você me ultrapassará em todos os treinos em menos de um mês.

Ela sorriu de volta, feliz. Passou o braço em volta das costas do homem alto e riu.

--//--

Os bandidos que tinham se instalado a alguns quilômetros de Vanhorn, na altura em que Manfreya vira uma luta mortal ser travada em seu acampamento, na vinda até a aldeia, haviam reunido centenas de meliantes, em seis meses. Precisavam de outros, para o que o chefe, Ishmal, havia concebido.

— Vanhorn possui armas, ouro, prata e muita comida — disse ele a dez outros saqueadores, sentados em um círculo ao redor de uma fogueira. Eram seus melhores lutadores — Surpreendo-me com minha astúcia. Temos setecentos homens e mulheres, na floresta, reunidos sob minhas ordens, prontos para invadir o povoado. Não vamos poupar ninguém, quero sair vitorioso!

— E depois, Ishmal? Como vai se haver com Lord Valleys? Ele é amigo de Sibarand.

— Nos armaremos e rumaremos para Islandir, com milhares de combatentes!

Quem fizera a pergunta ao chefe dos assaltantes era Liam. Conhecia-se sua inteligência, ele era descendente direto de vikings e um perito em combates e batalhas. 

— Valleys é forte. Nos liquidaria, assim como quem mata uma serpente moribunda — Ishmal deu a volta pelo lado exterior do círculo formado pelos homens sentados e pôs a mão no ombro de Liam. Agachou-se e falou, baixinho:

— Está livre para ir, amigo. Nada te impede de ficar — o descendente de vikings sentiu a ponta da faca pressionar com força suas costelas. Disse:

— Está certo, Ishmal, não quis desrespeitá-lo ou ir contra sua vontade — a lâmina foi afastada de seu corpo.

— Atacaremos amanhã, à noite. Quando a Lua estiver escondida entre nuvens. De acordo? — Diante do silêncio de seus comandados, o chefe sorriu e deu por encerrada a reunião: — Está certo, rapazes. Preparem-se.

Quando Ishmal se retirou, todos começaram a falar ao mesmo tempo. Uma batalha, para variar! Teriam oportunidade de gastar suas energias e demonstrar que eram verdadeiros lutadores!

De todos, Liam foi o único a permanecer em silêncio. O que poderiam fazer mil salteadores e corta-gargantas contra uma aldeia inteira de lutadores de elite, o Exército de um nobre poderoso, como Sibarand? E as vezes em que os saqueadores haviam sido mortos, nas incursões que Sibarand fazia nos arredores dos muros do povoado? Isso era de se levar em consideração, pensava Liam.

A noite ia ser fria, hoje. E teriam névoa pela manhã, e um dia e uma noite nublados, como durante todo o mês de Janeiro. Ele esperou todos irem dormir e pensou.

--//--

Liam desaparecera, ao que os lutadores de Ishmal puderam constatar, no decorrer de todo o dia seguinte. Isso fez o chefe dos bandidos concluir que ele poderia ter desertado, mas seria possível até mesmo que ele tivesse se bandeado para o lado dos aldeões.

— Se encontrarem Liam, matem-no. É hora de tomarmos a aldeia — disse para seus homens de confiança, quando a Lua foi obscurecida pelas nuvens. Avançaram em silêncio, por dentro da floresta, escolhendo caminhos fáceis e trilhas em que podiam correr sem pressa. Silêncio era vital e, quando chegaram à distância de quinhentos metros dos muros de Vanhorn, Ishmal murmurou para seu melhor lutador:

— Passe para os outros a informação de que temos de parar. Esperem minhas ordens.

A mensagem foi comunicada ao resto do grande bando. Todos sentaram-se nas trilhas e esperaram. O chefe falou para Persegs, seu combatente mais valoroso e de confiança absoluta, que iria rastejar até o portão da muralha e ver o que poderia ser feito, pois ele se encontrava aberto.

O chefe dos atacantes sabia que a entrada estava sendo vigiada por homens de Sibarand. De bruços, a vinte metros dos muros, conseguiu uma posição estratégica, que lhe possibilitava ver o interior da aldeia, sem ser visto. Havia uma avenida, margeada por casas, e Ishmal viu que dela partiam ruas para ambos os lados. Uma vez, enviara um homem para espionar e descobrir onde Sibarand vivia. Ele lhe contara com exatidão como a aldeia fora erguida, com as ruas entrecruzando-se e casas construídas a intervalos de dez metros uma das outras, entre as ruas.

Era isso o que Ishmal via no momento, e estava decidido a fazer o que deveria ter feito, anos atrás: juntar um grupo de assalto e tomar o povoado. Seria seu quartel-general.

O chefe dos assassinos e ladrões rastejou, afastando-se da entrada e, chegando onde Persegs estava, deu ordem de atacar. Mas atacar em silêncio, com cuidado, todos esgueirando-se entre as árvores e arbustos.

Quando o bando se posicionou nos limites da floresta, atacaram. Correram, gritando ao transpor a entrada do povoado, e foram rechaçados. Flechas disparadas de torreões nos telhados das casas perfuraram seus corpos sem armadura ou proteção de qualquer tipo. Ishmal protegeu-se, entre a muralha e uma casa. Usava uma arbaleta, trazia uma espada curva, um punhal e uma faca de assalto. Nem todos foram mortos, devido às flechas. Espalharam-se, como o fizera Ishmal, por entre as casas e ruas.

Manfreya veio com um arco e três dezenas de flechas guardadas em uma aljava que carregava às costas, para cima dos primeiros que passaram pela chuva de flechas. Disparou seu arco o mais rápido e preciso que conseguiu. Quando esteve sem flechas, havia usado uma para cada bandido que se aventurara pela aldeia.

Sacou sua espada e tirou uma machadinha da cintura. A seu lado, juntaram-se o Capitão Edvard e o Comandante Gand. Uma fileira de soldados de elite avançou pelas ruas a partir dos quartéis perto do centro de treinamento e a luta de verdade começou. Uma tropa de quinhentos soldados armados até os dentes para proteger suas famílias de setecentos bandidos da pior espécie, que estavam dispostos a morrer, em combate.

Manfreya viu quando cinco inimigos invadiram uma casa, enfrentando dois soldados e uma família. Uma família de combatentes, sim, e que, armada, enfrentou os bandidos com coragem. Um rapaz de vinte anos, usando uma lança, empalou um dos oponentes, recuando para ter espaço para lutar. Os soldados foram mortos, trespassados e cortados pelos bandidos por espadas. Manfreya viu que a situação fugia ao controle, mas correu, saltando contra as costas do último saqueador e o cortando de lado a lado na altura do pescoço. Usando a machadinha, despachou três dos atacantes e o último viu que teria pouca chance de luta. Arriscou-se com o rapaz. Usando um machado, arremeteu para a sala de estar, destruindo os móveis e encurralando o jovem. Ele dava estocadas com a lança, mas um golpe do machado desarmou-o e outro o atingiu no pescoço. Ao mesmo tempo em que o rapaz caía, Manfreya cravou a machadinha e a espada nas costas do outro, que caiu de joelhos e de bruços.

Havia pouco a fazer. O jovem estava morto e Manfreya saiu da casa entristecida. Alcançou a rua e foi cercada por sete bandidos. Ela arreganhou os dentes e desferiu uma machadada no que estava à sua esquerda, com um golpe lateral. O crânio foi cortado na altura da testa e o homem foi lançado contra a cerca da casa, quebrando duas tábuas e caindo no chão. Dois meliantes atiraram flechas contra Manfreya com arbaletas. Ela estava armada com um colete resistente e sentiu pouco o impacto das flechas. Atirou a machadinha contra um dos adversários, sua arma penetrando fundo em seu estômago. Saltou. Com a espada, cortou os dois braços, em sucessão, do outro que a flechara. Os demais recuaram. Um deles conseguiu apanhar a machadinha presa no ventre do bandido morto por Manfreya e a atirou contra ela. 

Ela teve o ombro cortado de raspão pelo gume da arma, que atingiu um nervo importante. Perdeu, assim, a sensibilidade do braço armado com a espada, que pendia frouxo. Apanhou a arma com a outra mão e continuou a matar. Desfez o inimigo que a acertara, enterrando a lâmina em sua perna e fazendo uma série de cortes em seus braços. Enfiou a ponta da espada em sua boca, atravessando sua garganta até a espada sair pela nuca. 

Os três homens restantes atacaram ao mesmo tempo. Manfreya esgrimiu contra um, desviou-se dos outros dois, que tentaram trespassá-la e, como um raio, posicionou-se por trás deles. Matou-os, enterrando a arma em suas costas.

Ela estava cansada de tanta matança. Mas viu Edvard e um pelotão de dez homens lutar com espadas e machados contra um grupo de vinte salteadores. A jovem juntou-se ao grupo do Capitão e, desferindo golpes com o braço bom, foi matando um a um os assaltantes. Ela era melhor que qualquer outro espadachim, com ambos os braços, mas sabia que só poderia usar um deles. E era provável que teria de se acostumar a usar um, para o resto da vida.

A luta continuou, bandos de assassinos aqui e ali lutando em número maior contra forças bem armadas de Sibarand. Manfreya perdeu a conta dos que matou. Ao fim do dia, as ruas enxameavam de moscas, atraídas pelo sangue derramado.

Foi numa dessas lutas que Gand, acompanhado por dois soldados, encontrou Liam, lutando em desespero contra Ishmal e Persegs. O desertor havia alertado as forças de Sibarand, na noite passada. O chefe dos bandidos atravessara seu bíceps esquerdo com a espada, enquanto Persegs o cortara na altura das costelas. Gand rangeu os dentes e agarrou Persegs pelas costas, sufocando-o e quebrando seu pescoço. Ishmal deu um golpe final com a espada contra Liam, aparado por ele, e, a seguir, os soldados de Gand o liquidaram com duas flechadas na cabeça.

Gand arrastou o corpo de Ishmal pelas ruas, correndo, e, gritando para os grupos que lutavam que, se os atacantes quisessem ter o mesmo destino de seu chefe, poderiam continuar a lutar. Na avenida principal, bandos invasores haviam-na tomado, em combates corpo-a-corpo com aldeões e soldados. O Comandante do Exército entrou na avenida, vindo de uma rua perpendicular, e arremessou o corpo inerte de Ishmal sobre um grupo de bandidos, que se preparava para entrar em uma casa e liquidar uma família de um dos soldados. 

Eles viram o corpo sem vida e entreolharam-se. A seguir, avançaram contra Gand, fúria assassina estampada em seus rostos de feras humanas. O Comandante fez sinal para os dois soldados que o acompanhavam. Seus arcos vibraram várias vezes e seis malfeitores caíram.

— Agora, meus senhores, ajudem outros a vencer. Vou sozinho! — exclamou Gand. Ele desferiu golpes com sua espada a torto e a direito, aniquilando o grupo que enfrentara ele e seus dois soldados. Lutou sem descanso por cinco horas, mandando para o Inferno seus inimigos. 

Ao fim desse tempo, a avenida estava coberta por corpos de soldados e ladrões. Manfreya surgiu de uma rua e viu Gand. Gritou:

— A batalha terminou! Vencemos! — O Comandante caminhou apressado em sua direção. Disse:

— Vou até a casa de Sibarand. Quero ver se está bem.

— Certo! Eu irei organizar uma equipe para enterrar os corpos. As moscas vão tomar conta da aldeia — Gand sorriu. Sabia que ela cumpriria o que falara.

Sibarand permanecera dormindo durante todo o ataque. Sua casa, trancada, fora vigiada por soldados nos torreões dos telhados, mas eles sabiam que nem Ishmal, nem qualquer um dos vagabundos, conheciam o lugar em que Sibarand vivia. E nem suspeitavam, por um momento que fosse, que ele se encontrava doente.

--//--

— Retornarei a Islandir, Gand.

— Viverá com conforto, ao lado de seu protetor, Manfreya.

Ela refletiu, à entrada do povoado, e falou:

— Substitua os soldados mortos. Eles eram os melhores.

— A elite do Norte, os melhores, sim. Mas será difícil encontrar outros como você.

Ela abriu um sorriso largo e abraçou o amigo querido. Recusara um cavalo, para voltar a Islandir. Sabia que os aldeões sentiriam falta de uma montaria. Separou-se de Gand e voltou-se para o exterior da aldeia. No lado de fora, virou a cabeça e acenou, o mesmo fazendo o segurança real.

— Vai voltar?

— Se não morrer antes, sim! 

De fato, seu braço paralisado pelo golpe com a machadinha se encontrava seguro por uma tipoia. Era impossível que o usasse para lutar e seria demorada a recuperação. Porém, seria um repouso merecido, o que precisava.

Ela entrou na floresta, do lado direito da estrada traiçoeira, e sumiu na vegetação entre os eucaliptos. Gand pensou em como fora útil treiná-la. 

Sim, tornara-se a melhor das melhores, entre a elite dos soldados que se supunha serem os de mais alto nível conhecido, em todo o Norte. 

O Comandante ficou olhando a figura da mulher diminuir à distância e coçou o cabelo. Voltando-se, mandou que fechassem o portão e caminhou até a casa-fortaleza de Sibarand.


*Sobre Roberto Fiori:

Escritor de Literatura Fantástica. Natural de São Paulo, reside atualmente em Vargem Grande Paulista, no Estado de São Paulo. Graduou-se na FATEC – SP e trabalhou por anos como free-lancer em Informática. Estudou pintura a óleo. Hoje, dedica-se somente à literatura, tendo como hobby sua guitarra elétrica. Estudou literatura com o escritor, poeta, cineasta e pintor André Carneiro, na Oficina da Palavra, em São Paulo. Mas Roberto não é somente aficionado por Ficção Científica, Fantasia e Horror. Admira toda forma de arte, arte que, segundo o escritor, quando realizada com bom gosto e técnica apurada, torna-se uma manifestação do espírito elevada e extremamente valiosa.

Sobre o livro Cedrik - Espada & Sangue:

“Em uma época perdida no Tempo,

onde a Escuridão ameaçava todos,

surgiu um líder.

Destruição, morte, tudo conspirava contra.

Mas era um Homem de extremos, audacioso.

Era um Homem sem medo”. 

Dos Relatos e das Crônicas da Velha Terra.  


Em sua obra “Cedrik – Espada & Sangue”, o escritor Roberto Fiori coloca sua imaginação e força de vontade à prova, para escrever seu primeiro romance. Um livro de Fantasia Heroica, no gênero Espada & Feitiçaria, em que, em uma realidade paralela, a Terra da Idade do Ferro torna-se campo de lutas, bravura, magia e paixão.

Cedrik é um Guerreiro capaz de levantar 75 kg em cada braço e, ao mesmo tempo, de escalar uma parede vertical de mais de 20 metros de altura facilmente. Em meio a ameaças poderosas, parte para o Leste, em missão de vingança. Acompanham-no a bela princesa Vivian, vinda do Extremo Leste, e o fiel amigo Sandial, o Ancião, grande arqueiro e amigo a toda prova.

Os amigos enfrentam demônios, monstros, piratas e bandidos sanguinários. Usam de magia para se tornarem fisicamente invencíveis. Combatem demônios vindos do Inferno, no Grande Mar. Vivian é guardiã e protetora do Necrofilium, livro que contém maldições, feitiços e encantamentos em suas páginas.

A intenção do autor é continuar por anos as aventuras de Cedrik, escrevendo sobre todo um Universo Fantástico, em que bárbaros e guerreiros travam lutas ferozes e feitiçaria não é uma questão somente de “se acreditar” em seu poder, mas de realmente utilizá-lo para a batalha, como uma arma.

A obra pode ser adquirida com o autor, pelo e-mail spbras2000@gmail.com,  no site da Editora Livros Ilimitados, em livrarias virtuais e no formato de e-book, na Amazon. Os links para acessar o livro são:

1.     Americanas.com:

https://www.americanas.com.br/produto/3200481831?pfm_carac=cedrik-espada-e-sangue&pfm_index=2&pfm_page=search&pfm_pos=grid&pfm_type=search_page

2.     Submarino.com:

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4.     Site da Editora Livros Ilimitados:

https://www.livrosilimitados.com/product-page/cedrik-espada-e-sangue

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sexta-feira, 11 de junho de 2021

Conto “Lâmina no Gelo”, por Roberto Fiori


Carol das Neves andava em círculos, sobre o solo macio e inseguro da neve espessa. Havia três horas que buscava uma saída da planície gelada e existia o perigo de encontrar seus inimigos.

“Ao menos se Derlek, o Grande, não tivesse dado as costas para Olfmund, nos jogos de Inverno, de ontem!” — ela pensava a todo momento. As duas tribos de guerreiros tinham se fixado a dez quilômetros de distância, uma da outra, inimigas de longa data. Até Dezembro passado, quando o rei Olfmund assinara um tratado de paz com Derlek, o Grande, chefe dos Tártaros, e que uma vez ambicionara a coroa que o outro usava.

Mas o rei dera uma série de vantagens para a tribo do Leste poder se estabelecer perto dos vikings e lucrar com as trocas de produtos que ambos os povos passaram a realizar, a cada Inverno. No Hemisfério Norte, onde estavam fixadas as duas tribos, às margens do rio Volga, haviam derramado sangue suficiente para que Olfmund desejasse a paz, a qualquer custo. Mas ocorrera algo, nos jogos do meio do Inverno. 

Ao final da contenda entre os campeões de cada tribo, o rei nórdico passara mal. Temendo ser envenenamento, evitou dar motivos para uma investigação. O mal-estar continuava e Olfmund mantinha a face impassível. A dor era suportável. Mas quando seu campeão, um homenzarrão maciço e forte o bastante para levantar o oponente com um braço só, desarmou o tártaro baixote e troncudo, o juiz do combate declarou o final da luta. Derlek levantou-se, o rosto vermelho e os malares salientes.

— Não! Ainda não! — ele gritou, apontando para seu campeão. — Você, continue lutando, sem medo! — e desceu a escada do palanque em que os líderes dos Tártaros se abrigavam da neve que caía fraca, mas constante.

Olfmund percebeu que seu lutador acabaria em três tempos com o campeão da tribo vizinha. Inclinou-se para seu assistente pessoal e disse algo em voz baixa. Este levantou-se e gritou:

— Luta finda! Alazork, volte para os alojamentos! — disse o homem franzino para o vencedor da luta.

Foi então que Derlek caminhou em passos decididos para o lado oposto do campo de batalha. Estacou, ladeado por seus dois principais comandantes, na neve que cobria o campo, e declarou, olhando para o rei dos vikings, sentado a oito metros de altura, no palanque.

— Olfmund, o trato seria luta até o final! — o viking sussurrou algo para seu assistente, um assento a seu lado. Ele levantou-se e falou:

— Os jogos têm sua importância, meu rei me confidenciou. Mas encontro-me no limite de minhas forças. Suportei uma dor que não cede por mais de duas horas, o tempo que este torneio durou. Começou com uma batalha simulada em que se derramou sangue, não havendo mortes, no entanto, e continuou com esta luta entre nossos melhores guerreiros. Vamos dar um basta à violência. Nada mais de jogos até a morte. Digo não, à morte e sim, à vida. Celebremos. Você é convidado em minha morada. Mas é necessário que eu me recupere, primeiro.

Derlek arreganhou os dentes e cuspiu no chão branco, junto à primeira fileira de assentos. Deu as costas para o rei viking, o manto de pele de ovelha esvoaçando, os cabelos tingidos pela neve, e foi acompanhado pelos seus dois líderes, voltando para junto de seus homens. Gritou e todos se levantaram, seguindo-o para os cavalos, que montavam em pelo.

Nesse ínterim, médicos de Olfmund o examinaram, sentado no palanque, mas não conseguiram descobrir nenhuma anomalia, em um primeiro momento. Ouviram seus batimentos cardíacos, encostando a orelha em seu peito, mediram suas pulsações, tinham meios inclusive de medir sua pressão arterial, com aparelhos que haviam inventado, meses atrás.

O rei mantinha-se consciente, mas ouvia o que se passava de modo distante. Sentia que sua hora havia chegado. Porém, estava errado. Levaram-no para uma construção de lona, madeira e bambu, grande, onde o examinaram melhor. Lovak, o cirurgião-chefe da tribo, auscultou o coração do rei, com um instrumento com que podia detectar a mais leve alteração no músculo cardíaco. E percebeu que o problema estava nas paredes do músculo cardíaco. 

Olfmund tinha de ser deixado em repouso absoluto por quarenta e oito horas. Uma erva que crescia no solo gelado das planícies nevadas, próximo ao assentamento da tribo tártara, recuperaria o tecido enfraquecido do miocárdio do rei. Lovak pensou na sorte que Olfmund tivera. Mesmo com quarenta e cinco anos de experiência em cirurgias, o médico sabia que um coração fraco significava uma morte mais rápida. Nem ele sabia o que fazer, para reparar o mal. Mas ouvira falar de viajantes vindos das planícies do que no futuro seria conhecido como Sibéria, da erva milagrosa de Dejamor.

Carol das Neves tinha perdido o rumo, a dois quilômetros da tribo tártara. Possuía uma audição aguçadíssima, ela podia ouvir cavalos cavalgando sobre um manto macio de neve a pelo menos três quilômetros de distância. Havia uma parte da planície onde podia se esconder, onde rochas imensas projetavam-se para o céu. Foi para lá.

Cavalos montados por tártaros aproximavam-se. Eram animais usados para longas jornadas, que não se cansavam fácil. Mas em questões como uma disparada rápida, não eram páreos para aqueles que haviam ficado nos domínios da tribo de Derlek. Faziam anos que os dois povos lutavam na planície, com uma permanente cobertura de neve. E ninguém conseguia prever qual tribo venceria a outra. Os tártaros, com seus cavalos, eram tidos como imbatíveis, mas os vikings, com sua força física superior, estavam em situação de igualdade.

Carol podia ver a planície inteira, por aberturas nas rochas, unidas entre si e parte de uma estrutura de pedra que um dia fora um monte de grandes proporções. Um grupo de tártaros, invisível devido à distância, podia ser ouvido pela mulher. Ela teve a atenção desviada para um canto do abrigo em que havia terra, não neve. Uma touceira crescia no frio enregelante. Carol ajoelhou-se e admirou as plantas. Eram o que procurava, bulbos pequenos dos quais saía um pouco do líquido branco que restabeleceria Olfmund. 

A mulher virou-se e voltou ao posto de observação. A planície fora tomada pelas forças de Derlek, ele estando à frente de seus homens, montando um cavalo forte e robusto, superior em resistência em relação aos demais. Passaram ao largo do conjunto de rochas entre as quais Carol estava escondida. Pelo menos cinco minutos foi o tempo que levou para as forças do chefe tártaro passarem pela linha de visão da viking e continuarem para o Sul, rumo à tribo nórdica.

Ela tinha de avisar seus conterrâneos! Havia trazido uma bolsa de couro a tiracolo consigo, e foi tirando bulbo por bulbo da touceira, com o máximo de cuidado para não romper a casca das plantas. Depois de tirar cerca de trinta bulbos e colocá-los na bolsa, saiu de dentro do esconderijo. Olhou para o Sul e percebeu que todos os vikings estariam condenados, se ela não os avisasse a tempo.

Correu. Era o que melhor sabia fazer. Era uma maratonista de alta performance, e sabia disso. Por esse motivo, se oferecera para a tarefa de colher a erva de Dejamor. Ouviu os cavalos retrocederem, antes de poder visualizá-los. Podia ouvir cavalos trotando no terreno gelado e jogou-se no chão, fora do caminho que os tártaros haviam usado para seguir para o Sul. Cobriu-se de neve, até seus olhos serem a única parte do corpo descoberta, e esperou.

Uma pequena parte dos cavaleiros surgiu à distância. Eles seguiram para o amontoado de rochas, onde Carol havia estado, passando junto ao montinho que escondia Carol. Por um triz, os cascos dos animais não a desfizeram em pedaços. Os homens entraram no labirinto entre as rochas e demoraram a sair. Quinze minutos de procura se passaram. A viking preparou-se. Sacou do cinto uma faca afiada e comprida. Quando o bando tártaro se dividiu, dois dos cavaleiros voltando para o Sul, e o restante seguindo para as terras ao Norte, Carol acocorou-se, expondo-se, e saltou. Cortou a garganta do tártaro e conduziu o cavalo para interceptar o outro. Este sacou das costas um arco e armou-o com uma flecha. Os guerreiros tártaros eram peritos no manejo de arco e flechas, isso todos os vikings sabiam. Portanto, Carol debruçou-se no lombo de sua montaria e recebeu a flechada, que atingiu seu cavalo no pescoço. Prevendo que ficaria com uma perna presa sob o animal, a mulher saltou, antes de ele tombar.

Atingiu o oponente com o corpo, derrubando-o. Cravou sua lâmina no tórax maciço do cavaleiro várias vezes, o sangue sujando as roupas dos lutadores. O tártaro era encorpado. Jogou seu corpo para esmagar Carol contra o solo, mas ela foi rápida, enterrando sua faca na lateral da cabeça do inimigo. Rastejou, ficando afastada d o outro, que permaneceu caído de costas, e montou no cavalo dele. 

Conhecia cavalos e como montar e lutar sobre eles. Em sua curta existência, Carol ocupara-se em treinar seu físico e sua mente para ocasiões como esta. Bateu com os calcanhares nos flancos do animal e berrou. Ele galopou, célere.

--//--

Lovak esperava, ao lado da maca sobre a mesa que sustentava o corpo do rei dos vikings. Ele podia abrir o tórax de Olfmund, reparar as artérias e veias importantes, desobstruindo-as de placas de gordura, podia fazer cirurgias de emergência no próprio miocárdio, nos aurículos e ventrículos, mas era só. Ignorava que, no acampamento da tribo tártara, outro médico conseguia fazer o mesmo, e desconhecia que a ciência médica estava estagnada em um ponto que, por mais que os cirurgiões tentassem, era um patamar em que nada surgia de novo no panorama da medicina cirúrgica, no mundo em que viviam.

Ele tomou o pulso do rei, mediu sua pulsação e sua temperatura e avaliou a situação. Entregara a sorte de Olfmund a uma mulher com quem confiava e confiaria a vida de qualquer viking, em missões como aquela. Um bulbo, era o que precisava, da erva de Dejamor! Uma única gota da seiva que ele deixava escorrer, quando pressionado.

Sentou-se, portanto, vendo que o que havia a fazer era esperar por Carol das Neves. Carol, a corredora, Carol, a guerreira. Olhou para a porta da enfermaria e viu a neve cair. Parecia piorar, a cada hora que passava. Ao frio, todos estavam acostumados, mas uma ideia se apoderara do velho cirurgião, e ele sentiu medo. E se os tártaros quebrassem o acordo de paz?

--//--

Carol galopava. Sentia o vento frio revigorante passando por seu corpo e sabia que os inimigos estavam a uma distância curta. Antes de virar à direita, além de um alto monte de neve e gelo, parou sua montaria e desmontou. Via com clareza as marcas dos cavalos dos homens de Derlek e sabia, por meio de sua audição, que eles haviam parado a quinhentos ou seiscentos metros. Ajoelhou-se ao chegar ao monte e passou neve em seu corpo. Avançou e viu, quieta, as tropas tártaras estacionadas.

Derlek organizara uma reunião com seus homens e dizia que tinham de atacar de imediato. Um de seus capitães respondia que precisavam esperar a noite cair. Entre uma frase e outra, Carol pôde ouvir a espada do chefe tártaro sendo desembainhada. Apertou os olhos e viu quando Derlek encostou a extremidade da lâmina no pescoço do outro. 

— É melhor que os surpreendamos enquanto está claro, Vendeel. À noite, nossa visão estará prejudicada.

Vendeel sussurrou um “sim” e afastou-se do chefe.

— Montem! E busquemos a cabeça de Olfmund!

Todos gritaram, menos Vendeel. Ele levou a mão ao pescoço e murmurou para si que “ele esperaria, ah, esperaria por uma coisa!”.

Quando todos haviam partido, o homem passou os olhos pela paisagem. Fitou o monte ao lado do qual Carol estava e montou em seu cavalo, seguindo em direção a ela. A mulher manteve-se quieta, tensa, e preparou-se. À distância de dois metros dela, Vendeel fez o cavalo estacar.

— Sei que está aí, quem quer que seja. Se veio em paz, o que duvido, mostre-se e desarmado. Se veio em busca de luta, pode vir, estou preparado.

Carol estava intrigada. Por que um tártaro pensaria que alguém estaria esperando um momento para atacá-lo... a não ser que soubesse de fato que esse alguém era um viking? Nesse caso, não hesitaria em passar por cima dela, com o cavalo. A mulher se levantou de onde estava, camuflada pela cobertura de neve branca, de faca erguida.

— O que Derlek quer, além de dizimar nosso povo?

— Derlek não quer acabar com todos, levará à morte os que estiverem entre ele e Olfmund.

— Por que não me atacou? — Carol perguntou, um pouco nervosa.

— Porque não sou um aliado dos tártaros, agora não mais.

— Vamos atrás deles. Devem estar chegando em minha tribo!

Partiram, a galope rápido. Atiçavam os cavalos, por um atalho que a viking conhecia, conduzindo-os ao destino com tempo suficiente para avisar os aliados de Carol.

Derlek seguia por um desfiladeiro de rochas encimadas por camadas de neve. Confiava na surpresa, no ardil que tanto lhe dera vitórias, no passado. Contornaram uma alta pilha de rochas e chegaram a dois túneis. O da esquerda estava obliterado por um desabamento, mas o outro se encontrava desimpedido. Entraram por este, acendendo archotes e tochas para enxergarem no escuro.

Quando estavam prestes a cruzar a saída, ouviram um ribombar próximo. Derlek conclamou os homens a galoparem com o máximo de velocidade que seus cavalos poderiam lhes oferecer.

A maioria ficou presa no desabamento que fechou a caverna. Derlek e alguns oficiais, fora do túnel, foram encurralados por seres de grande estatura, cujas cabeças davam na altura do capacete de Derlek.

— Saiamos daqui, ou seremos chacinados! — o chefe dos tártaros berrou.

As criaturas, de pele acinzentada, cabelos rebeldes, testa baixa e magros ao extremo, agarraram as rédeas dos cavalos dos que escaparam ao desmoronamento e os obrigaram a sentar no chão. Estavam armadas de clavas e vinham em grande número, descendo das encostas do desfiladeiro.

Os dois grupos lutaram com grande bravura, mas, por fim, dos tártaros sobrou vivo Derlek. Ele, cercado por dez dos homens primitivos, defendia-se dos golpes dados com os porretes. 

Foi dominado, quando a horda avançou contra ele. Desapareceu sob os golpes mortais.

— Chegamos! — disse aliviada Carol das Neves. Casas de madeira tinham sido construídas pelos vikings, às margens do Volga. As pessoas plantavam nos terrenos das casas, em canteiros de terra, limpa da neve e abrigadas do mau tempo por coberturas de lã, suspensas por armações de troncos e galhos de árvores. Sem sinal dos tártaros, Vendeel e Carol seguiram para a enfermaria e, chegando lá, desmontaram com pressa e correram. Lovak e os oficiais de alta patente estavam ao redor da maca do rei viking, de cabeça baixa. Alguns murmuravam preces a Odin, Thor, Freya e a um panteão de deuses que, pela expressão de tristeza, haviam levado Olfmund para o Valhala.

Carol avançou devagar entre os homens e viu. A maca estava coberta por um lençol branco e Lovak abanava a cabeça, incrédulo. Virou-se e abriu a boca, ao ver a mulher.

— Os deuses o levaram, mulher. Você trouxe os bulbos? — ela os tirou da bolsa e deu-os ao médico-cirurgião. — Estou vendo que lutou muito para voltar. Algo a respeito dos tártaros?

— Deixamos um grupo para trás. Estamos a minutos adiantados. Temos de organizar a defesa da tribo!

— Disso, nós cuidaremos, Carol — ela se voltou e viu Sven Larsson, seu noivo, nos fundos da enfermaria. — Gente, deixemos as mensagens aos deuses para mais tarde. Vamos até a entrada da aldeia.

De fato, a única forma de alguém entrar na tribo viking era pela entrada Noroeste. Do Oeste ao Norte, foram dispostos cinco mil guerreiros nórdicos de elite, de grande força e coragem, do total dos vinte mil lutadores que habitavam a tribo. No total, aquele grupo de nórdicos, uma divisão pequena do que viera da Islândia, sob o comando de Leif Eriksson, podiam ser liquidados por um número igual de combatentes tártaros, e isso era o que incomodava Carol. Isso se os cavalos fossem usados. Mas, até o momento, as batalhas que ocorriam na planície vasta entre as duas tribos mostrara que ambos os exércitos estavam em pé de igualdade. A mulher calculava em cem ou cento e cinquenta os guerreiros inimigos, mas achava que viria um número muito superior, a seguir.

— O que está fazendo, Carol? Tem de ficar em segurança, no lado interno dos muros!

— Larsson, o que é isso? — ele a segurava pela parte interna do braço, no exterior do perímetro da aldeia. — Largue-me, não vou querer machucá-lo, Sven!

Vendeel observava a discussão e concluiu que talvez Sven Larsson estivesse um tanto enciumado por ele ter chegado com Carol ao assentamento viking. Com calma, aproximou-se dos dois.

— Senhor, sou um ex-aliado dos tártaros. Quero fazer parte da batalha, a seu lado — Sven largou a noiva, com um tranco e encarou Vendeel. 

— O que o fez mudar de lado, tártaro? Vai trair seu povo, a troco do quê?

— O chefe Derlek encostou sua espada em minha garganta, há quinze minutos. Não faria o mesmo, desertar para salvar-se de um líder ganancioso e violento?

Larsson observou melhor o desertor. Era um tártaro esguio, baixo, mas as veias nos braços descobertos revelavam seu físico de atleta.

— Ele o ameaçou por que motivo?

— Eu era contra o modo dele comandar seus homens e contra suas decisões — e acrescentou: — Não tenho família, nem fiz amizades duradouras, entre os tártaros. Sou senhor de meu próprio destino.

— Carol, você pode ser útil. Leve o... nosso novo aliado para falar com o terceiro comandante-em-chefe. Ele fornecerá instruções para você, hã... qual o seu nome, homem?

— Vendeel, sou Vendeel, guerreiro. Só.

Sven olhou-o, perscrutando-o com olhos conhecedores. 

— Sei que é forte, Vendeel. Poderá nos ajudar muito, entre os vikings. E você, Carol, não posso obrigá-la a mudar de ideia, mas, por favor, não deixe que a matem. O que será de nosso casamento, se manchado de sangue, antes mesmo de começarmos a comprar os móveis para nossa moradia?

— Sim, Sven, tomarei cuidado. Como sempre — Larsson olhou-a descrente, reparando na roupa manchada com sangue do adversário com quem lutara, perto do afloramento rochoso.

As horas se passaram, e nenhum sinal dos tártaros. Carol pensou que, se eles tivessem tomado o caminho do Desfiladeiro de Orchak, não teriam muita chance contra o Povo da Montanha. Achou que, se fosse melhor que os aborígenes cuidassem da saúde dos inimigos dos vikings, as coisas deveriam ser deixadas daquela forma. Mas pensou que, no lugar dos tártaros, os vikings iriam querer alguma ajuda, seja de quem fosse. Tomou uma decisão. 

— Comandante Gantz — Carol falou, entrando na tenda do segundo comandante-em-chefe, situada na parte interna das muralhas, afastada do portão de entrada. 

— Sim, Carol? O que quer discutir comigo? — Gantz estava sentado em uma cadeira simples, de madeira, em uma mesa circular. 

— Peço permissão para sair em um grupo de reconhecimento, pelo Desfiladeiro de Orchak.

— Permissão negada. É arriscado, o suficiente para que nem cem soldados a acompanhem. Está preocupada com nossos adversários, hem?

— Fazem cinco horas que preparamos nosso exército e instalamos as tendas para oficiais e comandantes, senhor. Eu acho que Derlek não atacará hoje.

— São quatro da tarde. O que a leva pensar que ele está perdido em alguma ravina, ou caverna do Desfiladeiro? — Carol levantou uma sobrancelha, os pensamentos além da realidade da tenda.

— Quando fui buscar os bulbos para tentar salvar a vida de nosso rei, vi como agiam. Derlek e seu grupo que rumava para cá tinham todos os motivos para estar aqui, há mais de cinco horas. O que o levaria a se atrasar tanto, ou a desistir de nos atacar?

— Talvez tenha mudado de atitude.

— Mas senhor...

— E sem mais, nem menos, Carol — afirmou Gantz, com um sorriso de complacência. — Vou enviar um destacamento para o Desfiladeiro, mas você se arriscou o bastante, por hoje. Vai ficar aqui, nessa tenda, para que eu não possa tirar os olhos de você. 

O Comandante era um homem grande, forte, mas de temperamento dócil. Tinha simpatia pela guerreira mais corajosa da tribo dos vikings, sabia do que ela era capaz. Já a vira correr, usar sua arma favorita, a faca longa, e matar sem demonstrar arrependimento pelo que fizera, em combate contra o Povo da Montanha. Carol sentou-se na mesa e o Comandante saiu. Demorou vinte minutos para voltar.

— Cento de noventa vikings tomarão o caminho para as cavernas Inclich, em dez minutos. Pelo que você relatou, é o caminho que tomariam para chegar às nossas terras — e acrescentou: — Sabe o que acho, Carol das Neves? As criaturas do Desfiladeiro de Orchak são numerosas, em primeiro lugar. São inteligentes, mesmo sendo tão primitivas, em segundo lugar. E em terceiro lugar, desejam se vingar por nossas incursões às terras deles. Matamos muitos. Tentamos ser compassivos com essa gente tão atrasada. Mas eles não tiveram misericórdia, quando começamos a explorar aquela região. É isso, vamos, vá descansar. Pode ficar no sofá, nos fundos dessa grande tenda.

Carol percebeu que o Comandante, Sven e sua família tentavam protegê-la. Quando se alistara nas forças de ataque da tribo, seus pais choraram tanto, que a mulher pensara seriamente em ser outra dona-de-casa, como sua mãe, até que conheceu Sven Larsson, que a encorajara quanto aos treinamentos com todo tipo de arma. E trouxera um cavalo para ela, que lhe tinha dado por um tártaro com quem fizera amizade, nos anos de luta com aquela tribo. 

O destacamento de quase duzentos guerreiros chegou ao terreno de rocha do Desfiladeiro de Orchak em meia hora. Entraram nos labirínticos caminhos que o faziam ser ponto principal de emboscadas, vindas do alto, das vertentes íngremes que se erguiam acima do passeio. Faziam o mínimo ruído, trazendo nas mãos machados e escudos, e no cinto, espadas, facas e punhais. Um terço da força de ataque era constituída por arqueiros, preparados até a exaustão nos treinos de mira a uma distância de trezentos metros, a altura dos montes do Desfiladeiro.

Sven Larsson liderava o grupo, à frente. Chegaram em pouco tempo às duas cavernas Inclich. Escombros e rochas gigantescas haviam fechado sua saída. Larsson ordenou o máximo de atenção. Dispôs os arqueiros em diferentes posições do destacamento, para que pudessem oferecer proteção a ele. Aproximou-se da caverna da direita, onde madeira, rocha e areia obstruía de tal forma a saída dela, que o líder dos vikings pensou ser necessário mais do que simples homens para desimpedi-la. Seria necessário um lugar amplo, para que cavalos puxassem os escombros. 

Larsson olhou para cima. O penhasco que se erguia acima das saídas era íngreme, mas, observando melhor, ele encontrou numerosos pontos de lançamento de objetos, que poderiam obstruir as cavernas, no solo. Apurou os ouvidos. Passos. Corrida. Um quebrar de pedra contra pedra.

— Atenção, todos! Pode ocorrer um ataque, fiquem firmes!

Uma enorme rocha, granítica, soltou-se do alto do Desfiladeiro, descendo para esmagar os guerreiros, no caminho que usaram para chegar às cavernas. Os homens se afastaram e deram espaço para a rocha bater no chão e saltar, colidindo contra a encosta do outro lado da praça de saída das cavernas.

— Arqueiros, alvejem tudo o que é vivo e se mova! Os demais, tragam cordas! Vamos abrir caminho pela caverna da esquerda!

A entrada da caverna à esquerda, junto ao paredão do Desfiladeiro, estava fechada por rochas. Nenhum outro tipo de material, senão quartzo, granito e outros componentes compunham as pedras avantajadas empurradas do alto.

Um grito animalesco sobrepôs-se a tudo. E os restos de Derlek foram atirados para o meio da praça. Larsson viu que ele não tinha membros. Estava vestido com roupas em frangalhos. Os olhos fitavam o céu, abertos.

Amarrando cordas grossas às rochas da caverna, os guerreiros puxaram e conseguiram mover as toneladas de pedra que bloqueava o túnel. Quando o último obstáculo, uma placa de granito, desabou, puxada por uma força de cinquenta vikings, o Povo da Montanha atacou. Os seres vinham do alto, saltando pelas saliências das encostas e, a princípio, foram derrotados, alvejados pelos arqueiros. No decorrer do ataque, lançaram pedras pesadas e galhos espessos contra os guerreiros, mas estes se defenderam, cobrindo-se com os escudos de ferro.

Os tártaros que se encontravam no interior da caverna saíram, piscando os olhos. Presos no túnel, sua entrada e saída bloqueadas pelo Povo da Montanha. Era claro que este queria aniquilar todos os que entraram na caverna pela fome e sede.

— Continuem a flechá-los, não será difícil sairmos daqui, homens! — Sven Larsson gritou. Nesse momento, virou-se, protegendo seu corpo em uma reentrância no paredão, contra uma chuva de rochas, lançada por um dos aborígenes.

— Querem ajuda, vikings? — O subcomandante dos tártaros se aproximou de Larsson e puxou-o da reentrância na rocha pelo braço, sorrindo.

— Quantos são, aqui, amigo? — Perguntou Sven. 

— Somos quase cem, e iremos liquidar esses gorilas que nos cercaram nesse lugar. Você é Larsson, não? Meu nome é Seriak, respondo pelo meu grupo, agora que o Povo da Montanha liquidou meus superiores. Dê-me algumas flechas, posso usar meu arco com perícia!

Dezenas de seres de grande estatura, que haviam escapado às flechas dos vikings, desceram das encostas e correram como loucos em direção ao grupo dos inimigos. Larsson, Seriak e um grupo de vikings tomou conta da praça. A matança durou uma hora, o Povo da Montanha sendo trucidado pelas armas de ferro e aço dos adversários. Uma das criaturas havia sido flechada inúmeras vezes, mas continuava dando golpes com uma maça de madeira maciça, que deixara vikings e tártaros feridos e mortos. 

Sven decidiu acabar com aquela criatura abjeta. Deu uma cambalhota, saindo do alcance do porrete do gigante, que desferiu um golpe que ecoou pelo lugar, onde Larsson se encontrara, momentos antes. O viking cortou o braço esquerdo desarmado do outro, que foi atirado pelo solo, rolando. O ser com rosto de pesadelo virou-se para atingir Larsson com a maça, mas Sven jogou-se no chão. E cortou uma das pernas da aberração com um golpe dado com as duas mãos. 

Sangue esguichou e a criatura tombou. O viking cortou seu crânio de lado a lado e trespassou a lateral do pescoço da coisa com a espada. Nisso, o Povo da Montanha se enfureceu ao extremo.

— Arqueiros, mirem na cabeça! Na cabeça desses monstros! — Sven ordenou.

Sangue tingiu a rocha do Desfiladeiro, suas encostas e o solo. Na caverna, lutas árduas foram travadas, por vezes por dez seres implacáveis e quinze a vinte homens, trespassando com as espadas os inimigos, cortando e mutilando as faces e membros, numa sucessão de combates que já ia pelo início da noite. 

Somente às cinco da manhã, quando o campo de batalha foi tomado pelos corpos de homens e coisas, é que houve uma pausa para os homens poderem recuar e sair do Desfiladeiro. Não havia espaço para pisar no solo, este estava tomado por completo por uma camada de corpos mutilados.

— Acabou, Larsson, derrotamos eles — Seriak comentou, ao lado de Sven, do lado de fora do labirinto de pedra. O viking olhou para cima e comentou:

— O respeito será mútuo, por muito tempo. O Desfiladeiro é território proibido para os homens, amigo tártaro. E acho que vai nevar como nunca!

Sven havia lutado, no final do combate, com duas espadas vikings, alternando-as. Quando a neve recomeçou a cair, com ventos brutais e frio incessante, o noivo de Carol encontrou no caminho de volta à tribo viking uma elevação, um amontoado de rochas, que fora colocado para marcar o lugar onde alguém um dia fora enterrado.

O viking subiu na pilha com facilidade e, usando ambas as mãos, cravou a espada sobressalente no topo, onde a neve se acumulara por mais de um metro de altura.

— Está feito, como nos velhos tempos em que lutávamos contra os tártaros na planície e enterrávamos nossos amigos em locais pedregosos.

A neve, sem descanso, continuava a cair.

Larsson, triste com a ferocidade da batalha, chorou em silêncio. Quando a dor da perda de seus colegas e amigos passou, desceu da elevação.

— Sim, Carol, nós, vikings, sabemos como cravar uma lâmina no coração do Povo da Montanha. E sobre um túmulo, na neve — com esse pensamento dito em voz alta, ele liderou o grupo pela planície gelada, até o assentamento viking.


*Sobre Roberto Fiori:

Escritor de Literatura Fantástica. Natural de São Paulo, reside atualmente em Vargem Grande Paulista, no Estado de São Paulo. Graduou-se na FATEC – SP e trabalhou por anos como free-lancer em Informática. Estudou pintura a óleo. Hoje, dedica-se somente à literatura, tendo como hobby sua guitarra elétrica. Estudou literatura com o escritor, poeta, cineasta e pintor André Carneiro, na Oficina da Palavra, em São Paulo. Mas Roberto não é somente aficionado por Ficção Científica, Fantasia e Horror. Admira toda forma de arte, arte que, segundo o escritor, quando realizada com bom gosto e técnica apurada, torna-se uma manifestação do espírito elevada e extremamente valiosa.

Sobre o livro Cedrik - Espada & Sangue:

“Em uma época perdida no Tempo,

onde a Escuridão ameaçava todos,

surgiu um líder.

Destruição, morte, tudo conspirava contra.

Mas era um Homem de extremos, audacioso.

Era um Homem sem medo”. 

Dos Relatos e das Crônicas da Velha Terra.  


Em sua obra “Cedrik – Espada & Sangue”, o escritor Roberto Fiori coloca sua imaginação e força de vontade à prova, para escrever seu primeiro romance. Um livro de Fantasia Heroica, no gênero Espada & Feitiçaria, em que, em uma realidade paralela, a Terra da Idade do Ferro torna-se campo de lutas, bravura, magia e paixão.

Cedrik é um Guerreiro capaz de levantar 75 kg em cada braço e, ao mesmo tempo, de escalar uma parede vertical de mais de 20 metros de altura facilmente. Em meio a ameaças poderosas, parte para o Leste, em missão de vingança. Acompanham-no a bela princesa Vivian, vinda do Extremo Leste, e o fiel amigo Sandial, o Ancião, grande arqueiro e amigo a toda prova.

Os amigos enfrentam demônios, monstros, piratas e bandidos sanguinários. Usam de magia para se tornarem fisicamente invencíveis. Combatem demônios vindos do Inferno, no Grande Mar. Vivian é guardiã e protetora do Necrofilium, livro que contém maldições, feitiços e encantamentos em suas páginas.

A intenção do autor é continuar por anos as aventuras de Cedrik, escrevendo sobre todo um Universo Fantástico, em que bárbaros e guerreiros travam lutas ferozes e feitiçaria não é uma questão somente de “se acreditar” em seu poder, mas de realmente utilizá-lo para a batalha, como uma arma.

A obra pode ser adquirida com o autor, pelo e-mail spbras2000@gmail.com,  no site da Editora Livros Ilimitados, em livrarias virtuais e no formato de e-book, na Amazon. Os links para acessar o livro são:

1.     Americanas.com:

https://www.americanas.com.br/produto/3200481831?pfm_carac=cedrik-espada-e-sangue&pfm_index=2&pfm_page=search&pfm_pos=grid&pfm_type=search_page

2.     Submarino.com:

https://www.submarino.com.br/produto/3200481831/cedrik-espada-e-sangue?pfm_carac=cedrik-espada-e-sangue&pfm_index=2&pfm_page=search&pfm_pos=grid&pfm_type=search_page

3.     Amazon.com:

https://www.amazon.com.br/Cedrik-Espada-Sangue-Roberto-Fiori-ebook/dp/B091J3VP89/ref=sr_1_1?__mk_pt_BR=%C3%85M%C3%85%C5%BD%C3%95%C3%91&dchild=1&keywords=cedrik+espada+e+sangue&qid=1620164807&sr=8-1 

4.     Site da Editora Livros Ilimitados:

https://www.livrosilimitados.com/product-page/cedrik-espada-e-sangue

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