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segunda-feira, 18 de julho de 2022

Entrevista com Helton Timoteo, autor do livro "A canção de Variata" (Editora Penalux)


Helton Timoteo
é Especialista em Teoria da Literatura/Produção Textual e Mestre em Linguística Aplicada (UERJ). Prof. de Líng. Port. e Lit. do EM e de Linguística, no Superior. É membro do Conselho Científico da Revista Traduzir-se da Faculdade FEUC. Publicou Réquiem para Lavine (2015), Maçã Atirada sem Força (2017) e o romance A Canção de Variata (um dos vencedores, em 2020, do Prêmio Digital da Biblioteca Pública do Paraná, a nível nacional (Penalux). Foi um dos vencedores do Prêmio Off Flip de Literatura (poema), e do XV Prêmio Literário da Fundação CEPERJ (conto), ambos em 2014. Foi semifinalista (2020) e finalista (2021) do Prémio Internacional Pena de Ouro.

ENTREVISTA:

Conexão Literatura: Poderia contar para os nossos leitores como foi o seu início no meio literário?

Helton Timoteo: Comecei minha carreira literária como poeta. Depois de algum tempo, me aventurei na prosa, escrevendo principalmente contos e crônicas esparsas. Entre 1984 e 1985, ganhei meus cinco primeiros prêmios literários (poema, conto e crônica); em 1990, mais um prêmio (nacional) em conto; o mesmo ocorrendo em 2001, 2002, 2003 e 2004 (poesia e conto); mais os citados na minibiografia. Publiquei, além dos livros supracitados, meu primeiro livro de poemas, em 1989, Pequena Antologia Antecipada (com o poeta e escritor Mayrant Gallo), de forma artesanal. Também publiquei os livros citados na referida minibiografia e tenho poemas e contos publicados em várias antologias. Em 1990, nasceu minha filha Iasmim Martins. Ela era muito lourinha, cabelos cacheados e olhos muito azuis. Desde muito cedo, demonstrou muito sagacidade para perceber a realidade a sua volta e uma grande capacidade expressiva. Decidi, então, escrever um livro em sua homenagem. Assim, iniciei a primeira versão do romance A Canção de Variata, o qual mantive na gaveta por muitos anos, até decidir retomá-lo em 2017, a fim de compor melhor a narrativa, tornando-a mais robusta, mais consistente, tanto do ponto de vista estilístico e temático, quanto da sua própria estrutura, já que a questão crucial para mim não é apenas o que se escreve, mas como se escreve.

Conexão Literatura: Você é autor do livro "A canção de Variata”. Poderia comentar? 

Helton Timoteo: A obra narra a história de João Pescador, um senhor de 70 anos que — farto da cidade grande — exila-se numa ilha distante, habitada por alguns pescadores, comerciantes, entre outros, com o objetivo de purgar suas antigas dores, mágoas, rancores e refletir sobre sua própria vida, em particular, e a existência humana, como um todo. Na ilha, conhece Variata, a menininha cor de rosa, de cerca de 7 anos, com quem começa a interagir a partir do Capítulo VII. Aliás, o número sete vai perpassar toda a obra, simbolizando plenitude, perfeição, união dos dois mundos, o sobrenatural e o natural, o espiritual e o físico, o intelectivo e o intuitivo. Antônio dos Raios (outra personagem importante) terá 7 filhos (seis natimortos e um que morre aos sete anos); a ilha será de-vastada por sete pragas; sete crianças de sete anos cada uma vão perecer durante a catástrofe; sete são as entidades sobrenaturais; sete são as personagens mais importantes; etc. O título se refere a uma canção de despedida, mas também de redenção e restauração, cantada por Variata (esse nome significa Vento do Norte, numa língua indígena norte-americana e variedade, em latim), a menininha cor de rosa, uma das principais personagens do livro, ao lado de João Pescador. Esse é também o título de um dos últimos capítulos da Segunda Parte do livro (Reflexões e Destruições). A menina é uma espécie de aparição ou segunda consciência do Pescador (ou ainda uma espécie de anjo da anunciação) e o seu nome e o epíteto acima foram dados por ele, que vive exilado numa choupana em uma ilha com poucos habitantes. 

Conexão Literatura: Como foram as suas pesquisas e quanto tempo levou para concluir seu livro? 

Helton Timoteo: Iniciei a construção do romance em 1990/1992, respectivamente, anos de nascimentos das minhas duas filhas. A primeira versão constituiu-se de quase 40 capítulos, que encerram praticamente toda a essência da obra. Apesar disso, julguei que ainda não era digno de publicação, pois apresentava algumas falhas de composição, isto é, em função da nova constituição familiar, eu o havia produzido de uma forma um tanto apressada. Como sou, em relação ao estilo, muito perfeccionista, submeti-o a um estado de maturidade. Em 2016, perdi o rim e o ureter esquerdos para o câncer. Como estivesse à beira de uma depressão, decidi reescrever o livro, para tentar manter distraída a mente. O que foi ótimo, tanto do ponto de vista psíquico, quanto literário. O resultado me agradou muito. Aliás, é bom enfatizar que a história se passa no final do Século XX, isto é, basicamente no limite não apenas entre dois séculos, mas dois milênios. Ou seja, entre a chamada sociedade disciplinar de Foucault e a sociedade do espetáculo (e mais oito tipos) de Byung-Chul Han. Por isso, o considero um tanto visionário, pois Variata apresenta, no Capítulo XLVI (intitulado A Nova Era), várias previsões ao João Pescador.

Conexão Literatura: Poderia destacar um trecho que você acha especial em seu livro?  

Helton Timoteo: Poderia destacar inúmeros trechos, haja vista o livro conter vários trechos belíssimos, tanto do ponto de vista poético, quanto filosófico, mas vou reproduzir apenas um do último capítulo, pois resume, de certa forma, o posicionamento da personagem frente à existência e por conter, implicitamente, uma crítica à sociedade do consumo e do espetáculo, o que exprime a essência da obra: “João Pescador sentia-se como um cântaro vazio. Fora preciso que o recipiente ficasse cheio até a borda, com o conteúdo das várias vivências, para finalmente transbordar e extravasar todo, até não restar senão vácuo, ausência da ausência. Apenas João. Uma árvore sem folhas. Um esqueleto que fora sendo despido, aos poucos, de seus adereços, até atingir a nudez absoluta. Vácuo sobre vácuo. Seu mais completo e tenro esquecimento. Tinha aprendido com a menininha cor de rosa que era melhor um odre vazio, onde a qualquer momento se pudesse depositar um conteúdo do mais alto teor proteico, do que um cantil repleto de um conteúdo visceralmente contaminado pelas imundícies da vida.”

Conexão Literatura: Como o leitor interessado deve proceder para adquirir o seu livro e saber um pouco mais sobre você e o seu trabalho literário? 

Helton Timoteo: Meu livro pode ser adquirido nos seguintes sites: 

https://www.editorapenalux.com.br/loja/a-cancao-de-variata

https://www.amazon.com.br/s?k=9786558622369

https://www.submarino.com.br/busca/9786558622369

https://www.americanas.com.br/busca/9786558622369

Para obterem maiores informações sobre o livro, basta acessar os links das lives e das entrevistas:

https://youtu.be/LeLY7cruLMA (Live de lançamento - Canal da Editora Penalux).

https://youtu.be/fFdscybTyQY (Live Articulações filosóficas entre o exílio, o trá-gico e os eventos notáveis - Canal Conversações Filosóficas).

https://fb.watch/cpyQKFDhDi/ (Live no Programa Nossa Pauta da Rádio Mundial News, transmitida para todo o Brasil e para Roma, Itália, em 15/04/2022).

https://issuu.com/smc5/docs/53_divulga_escritor_revista_literaria_da_lusofonia/50 (Entrevista publicada na Revista Divulga Escritor, com circulação em todos os países de Língua Portuguesa).

https://minhodigital.com/news/entrevista-com-o-escritor-11 (Entrevista completa sobre o livro, publicada em Portugal, na Revista Minho Digital).

https://sopacultural.com/em-homenagem-a-filha-nasce-a-cancao-de-variata/?fbclid=IwAR1f6N1LJAaIJHzzqDeX1XkT9GfKZH1ld31BP_hLHTfK8AqEKCzG1sIyxEw (Entrevista completa sobre o livro, publicada no Portal de Notícias Sopa Cultural).

literaturaefechadura.com.br (Fernando Andrade entrevista o escritor Helton Timoteo - Literatura & Fechadura - revista de literatura contemporânea e arte).

Conexão Literatura: Existem novos projetos em pauta? 

Helton Timoteo: Estou com um novo livro de poemas, intitulado Última Flor, pronto para ser publicado. Nele faço uma profunda reflexão sobre a morte e todas as suas implicações. O livro está estruturado em três partes. Na primeira, os poemas foram construídos com um maior rigor formal e uma maior densidade no uso da linguagem (são também relativamente mais longos). Na segunda, algum rigor formal ainda é mantido, mas o conteúdo temático é versado com mais suavidade e leveza (também razoavelmente longos). Já na terceira parte, em que os poemas são bem menores, ocorre um total rompimento com o rigor formal (ou pelo menos é praticado um rigor formal de outra ordem) e há uma pluralidade temática bastante vasta, embora dois ou três poemas versem sobre a morte, mas de uma forma bastante distanciada da configuração discursiva dos poemas da primeira e segunda partes. Minha intenção, ao organizar a obra desta maneira, foi estabelecer uma ponte poético-estética, que conduzisse o leitor de um extremo a outro, isto é, entre o poeta artífice (que trabalha as formas até a exaustão) e o poeta inspirado, obviamente mantendo um gradiente de possibilidades entre essas duas posturas. É curioso observar que esse livro é anterior à Pandemia, e me veio a ideia de escrever sobre a “indesejada das gentes”, por dois motivos: 1) a perda de inúmeros amigos e parentes; e 2) ter sonhado, em 2018, com uma tragédia que se abatia sobre a humanidade (premonição?). Quase todos os poemas sobre a morte foram escritos até 2019, ao menos os das duas primeiras partes. Quanto aos da terceira, foram escritos ao longo de muitos anos. Também estou finalizando o livro de contos Interpretação do Vidro.

Perguntas rápidas:

Um livro: A Peste.

Um cordelista: Prefiro citar um poeta: Carlos Drummond de Andrade.

Um (a) autor (a): Albert Camus.

Um ator ou atriz: Fernanda Montenegro (especialmente a dos filmes Central do Brasil e Eles não usam black-tie).

Um filme: Sonhos, de Akira Kurosawa.

Um dia especial: O dia em que nasci.

Conexão Literatura: Deseja encerrar com mais algum comentário?

Helton Timoteo: Agradeço a entrevista. Gostaria que todos lessem o livro e ajudassem a divulgá-lo. Creio que assistir às lives e ler as entrevistas supracitadas, bem como esta entrevista, contribuirá sobremodo para a compreensão mais aprofundada da obra. Mas é claro que cada leitor pode (e deve) colocar em prática seu próprio percurso de leitura. Talvez se possa pensar que eu dê spoiler demais nesses canais. Mas penso também que, numa obra literária, não só o que acontece (seu enredo, seu conteúdo temático ou tema) é importante. É igualmente fundamental a forma como a configuração narrativa se estrutura; seu plano global (ou forma composicional); o estilo usado; as condições de produção; a força expressiva da linguagem, entre outros aspectos. Do contrário, todos poderiam ser escritores; afinal, todos têm histórias para contar. Não é mesmo? Além disso, cada leitor experencia a leitura de uma forma bem peculiar, bem específica. De qualquer modo, acredito que os leitores vão, por vários motivos, se deliciar com o livro: a forma como está estruturado; a linguagem poética e filosófica que perpassa toda a narrativa; a plurissignificação do enredo e de alguns personagens, o que conduz diferentes leitores a fazerem diferentes leituras da obra, ampliando sua significação e complexidade; a carga psicológica e mesmo psicanalítica que atravessa as interações dialógicas das personagens, especialmente João e Variata, contribuindo decididamente para as suas constituições subjetivas; a aura de mistério e mistificação que envolve a menininha cor de rosa, o que lhe confere uma tal indefinição e dimensão, que conduz os leitores a inúmeras possibilidades de interpretação desse pequeno ser; e a valorização da vida simples, livre das amarras da sociedade da positividade e narcisista.

Contatos:

Instagram: @heltontimoteo

Instagram: @portuguesaopedaletra

Facebook: heltontimoteo.silva

Linkedin: Helton Timoteo

E-mail: htimoteo@uol.com.br / heltontimoteosilva@gmail.com 

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quinta-feira, 12 de maio de 2022

Lançamento de "A Busca das Esferas" marca primeiro romance de fantasia de selo para escritoras mulheres

Mariana Baroni Evento de lançamento
 Lançamento de estreia da autora Mariana Baroni é realizado através do selo Auroras, especializado na publicação de obras escritas por mulheres

Tradutora, revisora e amante da literatura, Mariana Baroni lança o livro "A Busca das Esferas" a partir de incentivo da campanha coletiva NaNoWriMo. O apelido é para "National Novel Writing Month", que em todo mês de novembro reúne escritores amadores para uma caminhada motivacional para escrita diária ao longo de todo o mês. A união com o mesmo objetivo, assim como as metas e recompensas simbólicas, colabora para a criação - e até mesmo a conclusão - de obras literárias que ao longo do processo fazem avanços extraordinários. 

Foi através dessa jornada que se deu o início de "A Busca das Esferas", primeira obra de Mariana Baroni, que une fantasia e romance para contar a jornada de Nara. Garota aparentemente comum, Nara encontra um dia um objeto mágico: uma esfera que lhe concede um poder. Porém, a partir de sua descoberta, ela passa a ser perseguida por outras pessoas interessadas na esfera. Essa perseguição a coloca em contato com grupos que estão em busca de outras esferas parecidas e a envolve nessa aventura também.

"Duas cenas dessa história surgiram para mim em um sonho, em momentos diferentes.", conta a autora. "Eu já tinha começado a escrever alguns rascunhos sobre ela, mas nunca tinha escrito a história inteira. Em 2013 eu conheci o NaNoWriMo e decidi participar. Para isso funcionar, não dá para ficar editando e pensando muito no que se está escrevendo - a única forma de conseguir concluir o desafio é controlar seu "editor interno" e deixar o fluxo criativo fluir livremente. Esse foi o momento em que eu consegui finalmente desenvolver a história completa do livro. As correções e edições vêm só em janeiro, depois de um merecido mês de descanso. Foi uma experiência nova para mim, e funcionou muito bem."

"A Busca das Esferas" marca também um passo muito importante para a editora Penalux, que tem pela primeira vez em seu selo Auroras a publicação de um romance fantástico. O selo em si já é uma janela de oportunidades por se tratar de um selo que trabalha exclusivamente com autoras mulheres. Ter esse caminho aberto agora para novas criadoras e histórias do gênero é um passo à parte na trajetória do livro. Como parte da equipe que traz a obra à vida, estão a editora Dani Costa Russo, a revisora Eduarda Rimi, a designer gráfica Talita Almeida e o ilustrador Cícero Lopes.

O livro "A Busca das Esferas" já está à venda pelo site da editora Penalux. Para conhecer mais sobre os processos criativos de Mariana e a jornada de "A Busca das Esferas" a partir de agora, siga as redes sociais da autora @maribaronif e da editora @seloauroras. 



Mariana Baroni em depoimento para o @seloauroras


Lançamento | "A Busca das Esferas"


Link para compra: https://www.editorapenalux.com.br/loja/a-busca-das-esferas  

Instagram da autora: https://www.instagram.com/maribaronif


Links do livro:

Skoob: https://www.skoob.com.br/a-busca-das-esferas-12152253ed12134717.html  Goodreads: https://www.goodreads.com/book/show/60797159-a-busca-das-esferas 


Detalhes do livro

Editora: Penalux 

Gênero: romance 

Formato: 14x21 

Ano: 2022 

Páginas: 194 

Pólen soft 80


Sinopse


"Nara parece ser uma menina que se esconde atrás de histórias e se sente invisível perante os outros. E é isso que deixa tudo ainda mais potente. Nara está próxima de nós. Podemos nos ver em sua trajetória, ela é a materialização dos nossos sonhos juvenis. Mas não se deixe enganar: o caminho não é fácil e algumas perdas podem ser inevitáveis. A busca das esferas foi uma grata surpresa porque não encantou apenas a Rafaela de 30 anos, mas aquela de 15 que estava adormecida. Com muita ação, romance e aventura, a estreia de Mariana traz uma história completa e capaz de agradar até o mais cético em relação a outros universos." - por Rafaela Riera.


Mariana Baroni fala sobre a escrita em sua vida 


"Escrever, para mim, sempre foi sinônimo de refúgio. Era para esse refúgio que eu corria quando queria me sentir segura. Nas minhas histórias, eu era livre e podia fazer o que quisesse, era simplesmente fantástico! A escrita é minha forma de me expressar, de deixar fluir qualquer tipo de sentimento – da dor à alegria –, de ser tudo o que eu quiser. 

Escrever é, em si, um ato de coragem, disciplina e resiliência. É preciso coragem para mostrar ao mundo o que você tem a dizer, é preciso disciplina para se aprimorar e é preciso resiliência para não desmoronar com as decepções e frustrações (que são muitas!) ao longo do caminho. E no percurso, aprende-se muito sobre e consigo mesma. Escrevo para criar um espaço de refúgio para quem lê, um lugar de acolhimento onde se possa descansar com segurança. 

Ser mulher e escritora ainda é sinônimo de muita luta e trabalho para se destacar por seu próprio mérito. Quero inspirar outras mulheres para que deixem suas palavras fluírem. Quanto mais mulheres na literatura, mais exemplos inspiradores teremos, mais nos reconheceremos e nos apoiaremos". 

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quinta-feira, 19 de agosto de 2021

Livro vencedor do Prêmio Literário UCCLA 2021 será lançado no Brasil e em Portugal

    


De um universo alucinante, convulsivo, inquietante, chega ao cenário literário o livro O Sonho de Amadeo, romance de Leonardo Costa Oliveira que venceu a última edição do Prêmio Literário UCCLA – Novos Talentos, Novas Obras em Língua Portuguesa.

Leonardo Costa Oliveira é geólogo por formação e tem vários artigos publicados nesta área, alguns até premiados. Sobre este trabalho de ficção, diz o autor: “Será que eu também poderia escrever um livro? Criar uma história que pudesse interessar outras pessoas? Machado de Assis e Carlos Drummond de Andrade trabalhavam como funcionários públicos... Talvez, a partir de hoje, eu possa ser geólogo e também escrever... Por que não?”

Editada em Portugal pela Editora Guerra e Paz e no Brasil pela Editora Penalux, a obra de Leonardo Costa Oliveira nos apresenta o mundo onírico e complexo de Amadeo, “um jovem pintor que se busca e se perde nas tensões cotidianas, entrecortadas entre o real e o imaginário, entre o sonho e a realidade, entre a lucidez e a embriaguez, entre a vida e a morte”, descreve Gloria Vianna, crítica literária que assina a orelha da edição brasileira do livro. E completa: “Por vezes, o leitor, lançado no caleidoscópio narrativo deste romance, precisa se soltar, à deriva, para saborear a trajetória dos acontecimentos permeados por uma ilogicidade que flerta com o quase surrealismo das pinturas de Amadeo”.

Nas páginas d’O Sonho de Amadeo, a realidade e o sonho fundem-se quando o protagonista recebe um cartão-postal vindo da terra que o seu subconsciente projetou e inicia uma vertiginosa procura de respostas nas noites mal dormidas. Um romance com tintas oníricas e retoques de grande estilo e criatividade.

A verdade é que a qualidade literária deste livro de estreia parece incontestável perante a análise feita pelo júri do prémio da UCCLA e da Câmara Municipal de Lisboa. Um dos jurados, o escritor e poeta António Carlos Cortez, assim definiou o livro: “Prosa trabalhada […] como se a narrativa viesse dum além-túmulo sobressaltar-nos”.

O livro será oficialmente apresentado em Portugal na próxima sexta-feira, dia 28 de agosto, às 18h, no Auditório Sul da 91ª Feira do Livro de Lisboa. E contará com a presença do autor.

Por aqui, a edição brasileira já pode ser adquirida pelo site da Editora Penalux. 

TRECHO: 

A pintura de acrílico sobre tela retratava uma figura de aspecto cadavérico em tons de cinza, sem rosto, o qual apontava um revólver em direção ao espectador. Em seu peito, uma roseira vermelho sangue subia em direção a um céu escuro, apinhado de estrelas e se transformava numa linha férrea, até desembocar em um grande jardim, que circunscrevia uma abóbada celestial alaranjada. Dentro da esfera havia outro personagem prostrado de costas para quem o via. Seus pés, entrelaçados a uma vegetação de árvores e plantas exóticas, de um verde espetacularmente viçoso, não permitia identificar onde uma coisa começava e a outra terminava. As pernas fincadas ao solo como raízes profundas denotavam certa angústia e tentavam ludibriar-nos ao confundi-la com a paisagem. Por outro lado, as mãos elevadas e abertas pareciam pedir clemência, ajuda, ou avisar algo. O quadro era bastante colorido. Havia bastante verde, vermelho, amarelo, azul tingindo cada esquina daquela pintura. No entanto, os personagens eram cinzas, com as feições borradas, como num tornado violento; não se conseguia distinguir ao certo se eram homens, mulheres, nem tão pouco se estavam tristes ou felizes. Cinzas. Como dias de outono.” 

SERVIÇO

O Sonho de Amadeo, Leonardo Costa Oliveira – romance (146 p.; 14x21), R$42,00 (Penalux, 2021)

Link para compra: editorapenalux.com.br/loja/o-sonho-de-amadeo 

SOBRE O AUTOR

Leonardo Costa de Oliveira, nasceu em Paracambi,  no interior do Rio de Janeiro. É geólogo, mestre e doutor em geociências. Em 2012 foi laureado pela Sociedade Brasileira de Geologia com a medalha de ouro Fernando Flávio Marques de Almeida, pelo melhor artigo de geologia publicado entre 2010 e 2012. Em 2018 participou da antologia independente Sós, e em 2021 foi selecionado para compor a coletânea do Prêmio Off Flip de Literatura. Durante boa parte de sua vida envolveu-se como guitarrista  e vocalista em bandas de rock alternativo e vem colaborando com resenhas para os selos de indie rock Crooked Tree Records e Jambre Records. Elementos, estes, pincelados nas narrativas que desenvolve.

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sexta-feira, 6 de agosto de 2021

Impressões sobre Desaboios

 


Livro de Pedro Américo de Farias. Guaratinguetá (SP): Editora Penalux, 2020.

Rejane Gonçalves 

Cá estou eu, envolvida com meu pensar, depois de mais uma das tantas leituras que fiz do seu livro Desaboios. O prazer do aprendizado, da captura das palavras em suas vestes e nudez me acompanhou em todas elas. Isso, no entanto, não impediu o surgimento de lutas e desassossegos entre visão e audição, sentidos meus, que independentes de mim, alheios ao meu comando e bom senso, se engalfinharam em busca de uma sonhada primazia. Ver, ouvir – precisava desses verbos em toda a sua plenitude para desaguar na mente sensações cristalinas. Pois não é que o caso se deu que as tais palavras mal acabavam de ser vistas, enxergadas, claramente percebidas, invadiam-me os ouvidos uns sons, uns ritmos, tanta música, não só naquilo que carrega em si (tem disso tudo) cada palavra, mas num compasso estereofônico, desmesurado. Ou bem eu via, ou bem eu ouvia. Tapei os ouvidos, não com cera porque desdenho da covardia de Ulisses, sosseguei-os, a bem dizer, enquanto dos olhos tirava todas as tramelas, arregalando-os feito duas grandes janelas; dos ouvidos abri as comportas, destampei

os entraves e esperei, em guarda, o alvoroço. Houve, de parte a parte, algum tíbio resmungo, que devido aos ajustes das percepções e ao respeito devotado a cada um desses meus sentidos briguentos, logo cessou e passaram os dois a me servir na justa medida, como se nunca houvesse a inveja provocado tais desentendimentos. Deu-se então que eu pude ver/ouvir/perceber tudo o que compunha a maravilha das palavras/cantigas. Observei (delas) o feitio, o movimento, a quietude, o grito, o sussurro, o comprimido lamento, também o esticar, o encolher da linha para tecer o fio, a cadência da zoada: maraca, maracá, maracajá – ave palavra voa e vai à toa/ toada que vai e vem numa boa. Até proust me apareceu ao pé da escada, perdido, todo envolto em pensamentos compulsivos, por não atinar no porquê de não se repetir nunca a ocupação do lugar pelas seis palavras que terminam, cada uma, de cada vez, os trinta e seis versos do poema Solidão. Seu proust se afobe não, toda peleja é dolorosa, conquanto deliciosa se dá resultado bom, prazeroso, macio mas não meloso. Não quis, pois, buscar atalhos, nem tampouco me apressar, valendo-me de célere condução, caminho se faz a pé; quase fiz como Cervantes: Caro colega me ajude/ eu não consigo escrever. Muito desaforo seria. Cervantes é homem, eu sou mulher, mesmo no tão difícil, não é do meu feitio desistir; e fui, pulando que nem caçote, entrevi em cada pulo o segredo das veredas, o palpitar dos abismos, como fazer para unir olho e ouvido, mente e espírito; no propósito firme de acertar, abri portas e janelas, acendi luzes, tochas e velas, quem enche a casa de sol/ já não viaja no medo. Pois não é que se deu o caso que eu deitada, apascentada, feito gado minado e mimado por canto doce, lânguido e vicioso, pus-me de pé, invadida por um canto altaneiro, um palavreado robusto e sorrateiro que prolongou-se num aboio, sem ser isso, nem trinado de pássaro era, nem ganido, nem cicio, nem gemido, era antes combinação subversiva de olho, ouvido, mente, corpo e espírito, só lhe cabia o nome de desaboio que abriga o inventivo; daí vi/ ouvi/ percebi do fio entretecido, da teia, mandala tão bem ornada: Cesse tudo o que a musa antiga chora/ que um canto mais gaiato se alevanta.

Olinda 23 de julho de 2021

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Rejane Gonçalves é escritora pernambucana, vive em Olinda. Com formação em Letras, publicou alguns de seus contos em coletâneas. Em 2005, foi premiada no Concurso Osman Lins de Contos, da Prefeitura do Recife. Publicou: Escrevo para dinossauros (2016) e Estreitas amplidões (2019), ambos de contos, editados pela Confraria do Vento e semifinalistas do Prêmio Oceanos.

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sexta-feira, 9 de abril de 2021

Livro retrata a força do povo brasileiro frente às adversidades

 


Em tempos de isolamento social e solidão, romance histórico aquece o coração do leitor ao tratar de estreitamento familiar e luta pelos sonhos

A escritora maranhense Lenita Estrela de Sá está lançando seu mais novo livro pela Editora Penalux. Trata-se do romance “Os anéis de Maria”, cuja trama é ambientada em São Luís do Maranhão, entre as décadas de 1940 e 1980, tendo como pano de fundo a realidade do proletariado nesse período. 

A obra retrata a história do casal Maria e Inácio e os problemas que enfrentam por conta de sua situação social e financeira, expondo principalmente as circunstâncias precárias que o mercado de trabalho da época oferecia para mulheres. 

Outro aspecto muito importante que pode ser observado na obra é o vínculo familiar fortalecido ao buscar atingir os objetivos, especialmente entre Maria e os filhos.

“É uma história que basicamente fala de superação”, diz Lenita à nossa equipe. “O tema central consiste na força do amor entre uma mulher humilde e seus filhos, que buscam superar por meio da educação a barreira das classes sociais”.

O romance parte de um episódio real e daí segue pelos caminhos da imaginação da autora. “O leitor certamente se emocionará ao conhecer essa história”, continua a escritora. “É uma narrativa representativa para nós, brasileiros, que lutamos contra as adversidades em busca de nossos objetivos e uma melhor condição para nossa família”. 

Como dito, a obra retrata a história do casal Maria e Inácio, que batalha para melhorar de vida, tentando conciliar trabalho exaustivo, estudos, ambições e, é claro, o próprio casamento. 

“Tudo se passa em 1940”, relata Lenita. “A história se desenvolve até os anos 80, passando por um Brasil explorador e machista, ao qual os personagens tentam resistir com força e perseverança”, finaliza. 

No prefácio, o editor e revisor Daniel Zanella destaca que “Os Anéis de Maria” apresenta o panorama de um Brasil proletário, imerso nas contradições das forças de trabalho e das divisões de classe. “Ao acompanhar a trajetória sofrida de Maria, filha não assumida de um juiz, e de seu marido Inácio, abnegado e envolvido com montagens teatrais, Lenita Estrela de Sá nos oferece um retrato das dificuldades de ser pobre e, sobretudo, de ser mulher, no precarizado mercado de trabalho da época (ou de sempre)”, escreve. 

A escritora Maria Valéria Rezende, que assina o texto de orelha, complementa da seguinte forma: “Nem sei como agradecer [à autora] por ter me trazido, de modo tão vivo, o mundo em que nasci e vivi as primeiras décadas de minha vida, decorridas à margem de um porto, minhas lembranças dos tempos da II Grande Guerra e do Pós-guerra, dos anos “dourados” de esperanças e lutas, de nosso povo escalando caminhos íngremes, mas superáveis pelo amor e pela coragem de quem só conta com sua própria força, sua capacidade de trabalho e criatividade e a solidariedade entre iguais! Sua protagonista Maria e suas companheiras fizeram-me reencontrar vivamente minha mãe, minhas avós, minhas tias e tantas conhecidas que, com enorme resiliência e sensatez, com conhecimentos e práticas quase esquecidas hoje em dia, à custa de muito sacrifício, foram capazes de fazer viver grandes famílias, cheias também de artistas sonhadores”.

Trecho:

Que hora seria? Tinha serviço pesado de manhã. Convocara os dois aprendizes que o ajudavam para chegarem cedo à marcenaria, não tivessem os folgados gastado horas ouvindo sambas-canção na rádio Educadora! Mas, ao se ver na escuridão, sem demora dispensou essa suposição; cumpriria sim o compromisso de armar a estante do Dr. Hermínio, que o procurara por indicação de outro cliente, um conceituado escriturário do Banco do Brasil cujo nome lhe fugia, agoniado como estava. Felizmente, ao aumento da prole correspondia a expansão da clientela, uma vez que, a despeito da alma de artista, não negligenciava as obrigações impostas pela luta diária com a manutenção da casa. Logo o silêncio se restabeleceu. Guilhermina talvez estivesse novamente de olhos arregalados à espreita da proteção do pai, que, após nova inspiração profunda, tateou o ambiente às escuras até tocar o puxador metálico da gaveta da petisqueira, onde encontrou uma caixa de fósforos. Exausto, sentou-se na ponta do sofá de palhinha, para tomar fôlego. Em seguida, maquinalmente, forçou o olhar na direção do relógio de parede, sim, ainda faltava um bocado para a meia-noite! A cidade em silêncio. Ele não conseguiria dormir – e alguém conseguia com aquele clima de medo?

Sobre a autora:

Lenita Estrela de Sá é graduada em Letras e Direito. Tem quinze livros publicados, Exprime-se em diversos gêneros literários: poesia, conto, literatura infantil, teatro, roteiro de cinema e televisão. Recebeu, entre outros, o Prêmio Literário Cidade de São Luís, em 2010, com o livro “Pincelada de Dalí e outros poemas”. Foi incluída por Nelly Novaes Coêlho no “Dicionário de Escritoras Brasileiras” (Escrituras, 2002). Participa das revistas literárias “O Casulo – jornal de poesia contemporânea” (Ed. Patuá, 2016), “Germina – revista de Literatura & Arte”, “InComunidade” (Portugal) e “Mallarmagens”. Participa das antologias “Mulherio das Letras 2017” (conto e poesia), “Do Desejo – as literaturas que desejamos” (Ed. Patuá, FLIP 2018), “A mulher na literatura latino-americana” (EDUFPI/Avant Garde Edições, 2018) e “Antologia do Sarau da Paulista” (2019). Foi incluída por Rubens Jardim na série “As Mulheres Poetas na Literatura Brasileira” (2016), publicada no blog do autor e no e-book de mesmo título, v.2 (2018). Os “Anéis de Maria” é seu primeiro romance.

Gênero: Romance | Formato:14x21 | Ano: 2020 | Páginas: 202 | Valor: R$40,00

https://www.editorapenalux.com.br/loja/os-aneis-de-maria

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quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

Os cantos e encantos de Anna, resenha de "Ella - Repertório do amor", por Luiza Cantanhêde


OS CANTOS E ENCANTOS DE ANNA

Feliz e honrada com o convite para dissertar sobre este “repertório amoroso”, começo com uma citação do dramaturgo francês Henri Lenormand: “Cada um tira prazer do instrumento que manejar melhor”. E, auscultando esta obra de Anna, sinto a veracidade desse excerto. A tessitura de Anna é o amor. Amor que se derrama pelo corpo, mente e alma de todas as mulheres que ella (re)visita e encarna em seus “corpus poéticos”. E qual amor e qual mulher e qual ser não traz em suas trilhas o “repertório da perda” do amor infinito e da existência? Sobre “perdas”, a poeta diz: (...) Até quando ganhamos/ perdemos, pois para ganhar/ há de se perder. Sim, a poesia nos permite abraçar nossas perdas e ganhos. Na segunda seção, intitulada Repertório do amor infinito, há uma entrega total da poeta para este amor que tanto buscamos: O amor que acolhe, o amor que abraça, o amor que beija… Em Repertório da existência nos deparamos com as angústias, o vazio, a solidão, tão inerentes aos nossos eus: “É noite, o quarto está escuro, como escura estou” (Do poema Realidade Bukowskiana). Mas, a exemplo de Adélia Prado, põe o amor no pilão, “com cinza e grão de roxo” macera, faz dele cataplasma e põe sobre as feridas. “Eu não sou fria, nem dura, sou uma fogueira implosiva, sou inflamável, sou sonho e amor” (Do poema Sou…) Saudando a grande poeta Anna e encantada com este repertório D'ella, me despeço com Herberto Helder: “Por vezes tudo se ilumina, por vezes canta e sangra”. Agora entrem e também se encantem!

Luiza Cantanhêde


BIOGRAFIA RESUMIDA DE ANNA LIZ

Anna Elizandra Ribeiro ou simplesmente Anna Liz é de Santa Luzia, Maranhão. Poetisa, cronista, escritora e professora. Tem participação em mais de 50 antologias lançadas no Brasil e em diversos outros países, além de já ter publicado sete livros solo, um dueto poético com o poeta Gil Betto Barros, “Quatro mãos: todas com poesia”. Ao longo de sua trajetória recebeu alguns prêmios de Literatura de entidades relevantes no campo literário no Brasil e em outros países. Faz parte de algumas Academias e Núcleos Acadêmicos de Letras e Artes no Brasil, Chile, Argentina e Portugal. Atualmente, é presidente/coordenadora da Associação de Jornalistas e Escritoras Brasileiras, coordenadoria Maranhão/AJEB-MA.

Links: www.anaelizandra.prosaeverso.net
www.penalux.com.br
instagram: @anna_elizandra; @ella.cronicaepoesia

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terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Anna Liz e seus livros


Anna Liz é de Santa Luzia, Maranhão. Poeta, cronista e professora. Tem participação em mais de 50 antologias lançadas no Brasil e em diversos outros países, além de já ter publicado seis livros solo, um dueto poético com o poeta Gil Betto Barros. Ao longo de sua trajetória recebeu alguns prêmios de Literatura de entidades relevantes no campo literário no Brasil e em outros países. Faz parte de algumas Academias e Núcleos Acadêmicos de Letras e Artes no Brasil, Chile, Argentina e Portugal. Atualmente, é presidente/coordenadora da Associação de Jornalistas e Escritoras Brasileiras, coordenadoria Maranhão/AJEB-MA.

ENTREVISTA:

Conexão Literatura: Poderia contar para os nossos leitores como foi o seu início no meio literário?

Anna Liz: Comecei a gostar de literatura desde a infância, por meio dos cordéis que eu lia para minha avó a pedido dela. Sempre fui muito recolhida (tímida), então a leitura e a escrita eram (são) minhas companheiras. Aos 14 anos de idade, escrevi o meu primeiro poema “Desalento”, que está publicado no meu primeiro livro.  Em 2007, comecei a reunir os poemas escritos, procurei uma editora e lancei-me no mundo da literatura, como quem produz também. De lá para cá publiquei 06 livros solo (Conversa de Alguém que sente – Scortecci, 2008; Disperso em verso – Scortecci, 2015; Retalhos de Liz - Penalux, 2018; Sob(re) a pena escondida, Penalux, 2018; Ella – repertório amoroso, Penalux, 2020; Ella – repertório do cotidiano, Lucel, 2020; e o dueto Quatro mãos: todas com poesia, com Gil Betto Barros – Scortecci, 2010. Participei (ainda participo) de várias antologias publicadas no Brasil e em vários outros países.

Conexão Literatura: Você é autora dos livros "Ella - Repertório Amoroso" e "Ella - Cotidiano". Poderia comentar?

Anna Liz: Ella – repertório amoroso é um livro de poesia sobre e para a mulher e dividido em três repertórios: 1. Repertório da perda – aborda sobre a relação da mulher com as perdas “amorosas” e outras, como “ em um momento de fragilidade/nos damos conta das perdas/ mas por toda vida perdemos...(poema p.12); 2.Repertório do amor – sobre a mulher e suas relações com outros (as), “teu corpo é todo/meu suspiro/escutar a tua voz/ver teu tímido sorriso/queima-me veia/a veia e toda/minha carne/ um espesso brasido...(poema da p. 45; 3.Repertório da existência – sobre a relação da mulher consigo mesma, com o tempo e com a escrita, “Há um profundo silêncio/dentro de mim/e é neste silêncio/que encontro a essência/ da palavra que não digo/e no silêncio derramo/ toda minhalma/e não me esvazio:/ - a alma é infinita...(poema p.58), .
Ella – repertório do cotidiano – é um livro de minicrônicas, em que o universo feminino está intrinsecamente ligado às dores e superações. Parte 1 – Ella por ela – aborda sobre o fazer literário, o dia a dia da mulher que escreve, trabalha, cuida da casa, cuida dos outros, cuida de si mesma e supera as dores e desilusões; a primeira minicrônica resume: “Faz de conta que é poeta para não sucumbir às desilusões”; Parte 2 – Ella e o cotidiano amoroso – as traições, as desilusões amorosas, “A luz da lua banhava a rua e a sua face, era mais uma noite em que esperava o marido, agora sem expectativas...”  . Parte 3 – Ella e as viagens – sobre as viagens reais e imaginárias – “ Voar é uma das metáforas mais antigas para a liberdade. Mas, hoje, peço permissão para dizer que voar é ir ao encontro daqueles que mais amamos...”
Os dois livros são ilustrados por mim, com line draw – traços femininos, retratando (tentando retratar) cada sentimento. 


Conexão Literatura: Como foram as suas pesquisas e quanto tempo levou para concluir seus livros?

Anna Liz: Eu sempre leio bastante, falar sobre a mulher e seu universo sempre foi muito necessário, lendo outras escritoras, como Chimamanda Adichie, Conceição Evaristo, Lindevania Martins, Luiza Cantanhêde, Sharlene Serra, Heloisa Sousa e tantas outras, senti a necessidade e o desejo também de escrever sobre o protagonismo feminino. O tempo para escrever um livro é muito variável. Eu já escrevi um livro em um mês, como foi o caso de “Ella – repertório amoroso” e já passei cinco anos para organizar um livro, como foi o caso de “Disperso em verso”. Depende muito da dedicação e da inspiração. Há momentos da vida em que é mais necessário escrever para não sufocar. Nos momentos angustiantes, costumo escrever mais.

Conexão Literatura: Poderia destacar um trecho que você acha especial em um dos seus livros?  

Anna Liz: Cada livro tem um poema que marca muito. No livro Retalhos de Liz, há o poema “Escrever e penar”, as duas últimas estrofes traduzem um pouco do meu fazer: “ Quando peno, escrevo/e a pena me alivia/a pena de viver/no escrever/ Quando escrevo, peno/ e a pena comigo pena/na lida de fazer/da dor um poema.

Conexão Literatura: Você também participou de várias antologias. Poderia comentar?

Anna Liz: A primeira antologia internacional que participei foi “Do Brasil para Frankfurt” da Literarte, participo todos os anos das antologias da Rede Sem Fronteiras e de diversos outras coletâneas. Em 2020, organizei a antologia “Toda forma de ser mulher”, escrita por 23 escritoras maranhenses. Este ano, estarei em várias antologias, principalmente, organizadas por mulheres – Mulherio das Letras, Associação de Jornalistas e Escritoras do Brasil, etc.  

Conexão Literatura: Como o leitor interessado deverá proceder para adquirir os seus livros e saber um pouco mais sobre você e o seu trabalho literário?

Anna Liz: Os meus livros estão à venda no meu site: www.anaelizandra.prosaeverso.net
Nos sites das editoras: www.penalux.com.br/ www.scortecci.com.br/
Na livraria AMEI em São Luis. Encontram-se na Estante Virtual.

Conexão Literatura: Existem novos projetos em pauta?

Anna Liz: Sim. Organização de antologias, publicação de outro livro solo em 2021, participação em Concursos Literários e outras atividades literárias, organização de Saraus e um evento em março em São Luís- MA, em homenagem ao dia da Mulher Maranhense (11 de março – aniversário de Maria Firmina dos Reis)

Perguntas rápidas:

Um livro: Ilusões
Um (a) autor (a):  Richard Bach
Um ator ou atriz: Fernanda Montenegro
Um filme:  Sociedade dos poetas mortos/ O carteiro e o poeta
Um dia especial: Todos os dias são especiais. Os melhores são aqueles em que estou com meu filho e meu esposo.

Conexão Literatura: Deseja encerrar com mais algum comentário?

Anna Liz: Finalizo com um poema premiado do Concurso Literário da AMEI (Associação Maranhense de Escritores Independentes)

CONTRADITÓRIOS
   (Anna Liz)

Não sei se é na poesia
que se vive ou
que se morre;
não sei se a poesia
me salva ou
me condena
me esgota ou
me transborda
não sei se na poesia
me edifico ou
desmorono
não sei se ela
me exorciza ou
me possui
Não sei se ela
é mistério
é sobrevivência
é morte
é ressurreição
...
Viver é divino
Escrever é mais divino ainda

Instagram: @anna_elizandra; @ella.cronicaepoesia
Facebook: anna liz ribeiro
Site: www.anaelizandra.prosaeverso.net
Whatsapp: (98) 98109-3893  

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quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Hibridizando polaridades no romance Tocaia do Norte, de Sandra Godinho


Por Alexandra Vieira de Almeida 

O livro Tocaia do Norte (Penalux, 2020), de Sandra Godinho, foi vencedor do Prêmio Manaus de Literatura, como melhor romance do ano de 2020, na categoria Nacional. A obra é dividida em três partes: O Seminarista, O Relato e O Caminho, com um prólogo. Há uma nota da autora, onde ela explica quanto às fontes utilizadas para o seu processo de reconstrução literária com relação a um fato verídico, a expedição do padre Giovanni Calleri. Tocaia do Norte é ainda enriquecido por um belo prefácio de Marcelo Adifa, jornalista e escritor, onde ele disseca o jogo de interesses militares na época da ditadura, e as orelhas de Mário Baggio, poeta e escritor, que soube explorar o componente epifânico na obra de Godinho. A obra é extensa, com 318 páginas, dividida em 69 subcapítulos dispostos ao longo das três seções. A epígrafe utilizada por Sandra, de Altino Berthier Brasil, já nos revela a tristeza, o gemido e a melancolia dos índios, que apesar de serem fortes, mostram toda a fragilidade frente à desumanidade dos seres. 

Logo no prólogo, somos levados por uma narrativa em primeira pessoa de voz masculina, iniciando as palavras com letras maiúsculas, para enfatizar a grandiosidade do relato. Temos a junção entre o poético e o mais ordinário. Há uma meticulosidade e delicadeza do silêncio da região com a corporeidade de modo mais popular, se valendo de expressões típicas daquela região específica da Amazônia, como “empachada”, que significa “cheia”. O narrador descreve um local, onde se apresenta a pobreza do lugar, com um “rio escuro”, em que a precariedade dá o tom maior. Há o embate no narrador, entre a via religiosa (os pais o queriam padre) e a vida mundana (seu desejo não era esse). Usando uma partícula de adversidade, o narrador contradiz o que a maioria, o senso comum pensa: “Era muito novo para ter arrependimento, mas tinha”. Há todo um retrato medonho do mundo animal com sua violência. Na natureza não há só harmonia e beleza, mas a crueldade, como no mundo humano, como veremos ao longo do enredo.

Godinho descreve com detalhes os animais regionais, inserindo-se na sua realidade circundante e dando verossimilhança à história.  No prólogo, o narrador não começa a história desde seu início, nos leva a um clímax, o que acontecerá no desfecho da obra, com a fuga do rapaz pela “picada”, seminarista de apenas dezessete anos, que deveria cumprir a promessa dos pais em ser santo, pois ele se salva da morte com o fervor religioso de seu pai e mãe. Godinho nos dá um retrato aterrorizante do perigo do narrador João de Deus na mata, que traz ao mesmo tempo a maciez do céu a acolhê-lo. A descrição da natureza pela escritora amazonense, nos faz lembrar de Guimarães Rosa, que nos mostrou uma natureza ambígua, onde o bem e o mal se equacionam. Depois, há um relato hiperbólico na comilança do padre italiano Chiarelli, com a fartura de comida, para adentrarmos nas hipóteses na mente do seminarista sobre as ações do padre. Quando a mente está em seu trabalho de deduções, há um ato inesperado. Há uma tensão na narrativa, fazendo o leitor pensar sobre o que seria aquilo, quem disparou aquele instrumento de guerra, logo no prólogo do livro. Ficamos sabendo de antemão que houve um ataque ligeiro, mas ainda não sabemos o motivo, dando um movimento de expectativa no leitor. Assim, o narrador não apresenta logo de cara o motor dos acontecimentos. Dá um tom ainda não definido, o que vamos descobrir depois no transcorrer da história. Encontramos uma imagem cru e seca da fuga, refletindo sobre seu próprio eu, pois considera-se inapto para as coisas do mundo. Há todo um conflito entre o pensamento e o corpo, dando dramaticidade à trama. O seminarista se caracteriza como frágil em contraponto ao padre Chiarelli, que revela virilidade e força. Temos um relato do abjeto, do sujo e do nojo, com o “mijo” e a “merda” do seminarista, onde se vê os opostos num mesmo ato. Portanto, o prólogo é um elemento crucial para se entender todo o enredo, pois não conta ou explica o resumo ou o início de tudo, mas o clímax dos acontecimentos, o que ocorre depois, retroagindo na primeira parte, o tempo, onde a memória serve como resgate dos momentos mais aterrorizantes na vida daqueles seres para que não caiam no esquecimento.

Em cada subcapítulo da primeira parte, Sandra Godinho coloca um poema antes de iniciar a narrativa, unindo os gêneros da prosa e da poesia. Essa introdução serve como criadora do clima que o leitor se enveredará por uma floresta de símbolos. Na parte I, Godinho faz o percurso da vida de João de Deus num Seminário. Lá, há todo um ritual rígido de regras de vivência e respeito. Utiliza recursos estilísticos na enumeração de regras que deveriam ser seguidas à risca, com a partícula “ou” nessa sequência de atos sistematizados. A caracterização do narrador para aquela vida na igreja se dá pela via negativa, mesclando o puro e o impuro, a santidade e profanação. Em meio à seriedade de suas reflexões, nos deparamos com o tom jocoso. Há frases entre parênteses, quebrando certos galhos textuais, e nos revelando o pensamento de João de Deus. O menino desde pequeno no seminário nos apresenta o jogo contraditório, entre o interdito (o que se considera sagrado) e a transgressão (o que subverte a ordem a partir das travessuras). A repetição da palavra “rotina” nos atos que ele pratica lá dá ênfase ao enfadonho. E no meio disso tudo, a veste é algo transformador. Há a descrição da batina e seu aspecto de pureza, cobrindo com o hábito a corrupção do corpo (espiritual). A linguagem de Sandra Godinho é realista, mas cheia de símbolos e metáforas que envolvem o leitor. Cita o nome do Seminário, São José, localizado temporal e espacialmente no centro da cidade de Manaus. 

O narrador, já com 17 anos, vai para a casa dos pais, indo para a nova moradia deles em Raiz. Godinho faz aqui um jogo linguístico fascinante com o nome da nova rua dos pais de João de Deus: “raiz, tudo que não queria ter”. Assim, há o conflito entre liberdade e prisão, não só na vida monástica, como na casa de seus progenitores. E os governantes do local seguiam a cartilha dos militares, varrendo da região os locais flutuantes. Godinho coloca o ano de saída de João de Deus do Seminário para a sua casa, em 1968. Mas, estrategicamente, a escritora não coloca em forma de numeral. Por meio das palavras “Mil novecentos e sessenta e oito”, põe ênfase na datação fatídica se prolongando no tempo e na narrativa. No trânsito, na passagem no ônibus, o narrador faz uma verdadeira viagem na mente, revelando suas memórias. Mas, há uma parada, uma interrupção, pois o ônibus, com estrutura precária de madeira, não vai muito longe, tendo João de Deus, que seguir sua “via-crúcis”, o restante a pé. Nessa dificuldade inicial, que serve como preâmbulo para seus obstáculos em todo o enredo, temos a lama, a terra, o cascalho, o mato. E ele caminha, paradoxalmente, com uma bagagem pouca, leve, em meio à proliferação de imagens do lugar. Além disso, Godinho realiza comparações originais, entre o orgânico e inorgânico. Há também uma tensão entre diálogo e silêncio, perfazendo a mescla de elementos que são contraditórios. O narrador tem olhos de águia, narrando e descrevendo tudo com minúcias, prescrutando o interior e exterior das personagens. Assim, para além de um romance histórico, ressignificado, literariamente, pelo seu teor ficcional, encontramos um livro de alto teor psicológico, se adensando no viés existencial dos caracteres expostos pela lente lúcida de João de Deus no tempo presente, já amadurecido, 17 anos depois, já com 34 anos. E o narrador revela que a mãe não reconhecia por trás dos gestos, os atos e palavras implícitos, que o seminarista enxerga plenamente. Os leitores se inserem nas visões conflitantes da mãe e de João de Deus, com relação aos seus amigos de infância, que para ela, perderam a inocência. Mas que para ela, ganharam experiência. Um dos amigos, Vivaldo, ele reencontra já mais velho com o amor da juventude de João de Deus, Lívia, que o desconcerta, ao vê-la agora mais com seu amigo. Com seus vícios, vivendo num local precário, o narrador o considera um verdadeiro homem, diferente da sua imagem de purificação e santidade. A frieza de Vivaldo o decepciona. 

Na ida à igreja do padre Charles (onde ele foi coroinha), temos o momento chave da história. É lá, que ele é apresentado ao padre Chiarelli. Ele trabalhou com os indígenas em missões importantes. E João de Deus logo se identifica com o jeito nada convencional do padre italiano. Já logo no primeiro contato, a impressão de espontaneidade de Chiarelli, utilizando um vocabulário em que temos expressões como “cáspira” e palavras pouco mais nobres, atrai o narrador, se identificando com ele. Ele vê vitalidade em Chiarelli, diferente do espaço frio e soturno de um Seminário. Temos expressões em italiano do padre em meio aos diálogos em português. Chiarelli o surpreende, com sua comilança e interesse por cervejas. Somos introduzidos na culinária típica do local, com riqueza de detalhes, exposta por Godinho. O padre é a metáfora mesmo do excesso, do exagero, em contraponto com a imagem da igreja rígida. Mas há algo que se afasta desse excesso corpóreo e sensorial, pois o padre tem um ideal, o que o seminarista João de Deus irá perseguir. Ou seja, o choque entre a carne e o espírito, pois o padre tinha íntima e intensa fé em Jesus. A igreja, assim como o campo político, seriam a figuração da hierarquia, o que o padre tenta ultrapassar. Chiarelli é transferido da Itália por seu comportamento impróprio e subversivo, vindo para o Brasil e começando sua missão de evangelizar os povos indígenas, iniciando por Roraima. Há todo um vislumbre na narração, com imagens belas e literárias em tom bíblico para falar sobre o padre Chiarelli. O padre italiano quer evangelizar os índios, mas sem aculturá-los. Existe todo um processo de aprendizagem entre o padre e o seminarista ao longo do romance, mesclando o sonho e o real, o ideal e a realidade crua e estúpida que se descortinará e apagará a chama da utopia. Um romance distópico, em certo sentido. 

E no transcurso na narrativa, temos os interesses dos militares durante a época da ditadura, que juntamente com o engenheiro Altamiro, seria a construção de uma estrada, a BR-174, nas terras indígenas dos Waimiri-Atroiaris. O coronel Carimbó, principal opositor de Chiarelli, com quem ele tem rusgas e brigas ferrenhas, estava a frente da missão de construção dessa estrada. No meio disso tudo, há o choque da evangelização dos católicos com relação à missão dos americanos protestantes, que queriam afastar os índios para a construção da rodovia. Assim, há o embate também entre católicos e evangélicos. E o seminarista, com frases repetidas, enfatizando o medo e a confusão entre seguir ou não o padre, em tê-lo como mentor, revela uma carga de tensão psicológica formidável. Godinho aproveita a sonoridade das palavras, fazendo jogos estilísticos perfeitos, onde “rodou” (confusão em círculos na cabeça de João de Deus) e “rodovia” se interpõem. Chiarelli era um homem de extremos, entre o choro e o riso, mudando de humor constantemente no transcorrer da história. Com interesses em choque, Chiarelli parte em missão para afastar os indígenas da região, pacificamente, para a construção posterior da rodovia. E João de Deus dá um novo rumo a sua vida, seguindo o padre e os expedicionários nessa missão. O romance é híbrido, mesclando o sociopolítico ao existencial e psicológico, o interno e o externo, o real e ficcional, o histórico-documental e o literário. Um verdadeiro amálgama, onde os extremos e os conflitos se adensam numa simbiose perfeita. Com tudo isso, ainda temos o papel da Funai, naquela época, e os interesses da mídia nessa expedição, cheia de tensões e conflitos de posicionamentos. Os métodos de Chiarelli se chocam com os dos políticos e ele tem de seguir a cartilha e a hierarquia. Ele não queria que sua expedição parecesse uma invasão. E, assim, ele acaba tendo que avançar pelo Abonari, a seu contragosto. O padre obedece a ordem dos superiores. A zona seria de guerra e não neutra. O seminarista se vê, se olha por dentro, num processo de autorreflexão e autoconhecimento: “Era uma sombra, pequena e desconhecedora do mundo”. O bíblico, o literário e o social se conjugam num abraço múltiplo e diversificado. 

E, ao longo do romance, Godinho vai introduzindo novas personagens, trazendo complexidade e variedade ao enredo. Temos, por exemplo, a Irmã Helena, que era a madre superiora do Jardim da Infância e internato Adalberto Valle, que nutre um amor pelo padre Chiarelli. Todo o local em que ela atuava é descrito com ordem e zelo pelo narrador. Há significados ocultos nos gestos, ações e palavras das personagens que o narrador não consegue captar naquele passado, onde ainda era uma planta tenra, mostrando que não era onisciente. Tanto que a narrativa é em primeira pessoa, seguindo sua versão pessoal dos fatos. Alguns deles, que só outras pessoas poderiam saber, ele explica na segunda parte que teve depoimentos de outras tribos e pessoas, para dar verossimilhança a sua história ficcionalizada, mas que aponta para uma experiência vivida, recolhida por si e pelos outros, na sua perspectiva amadurecida na sua época atual, que retroage no tempo, para o resgate de memórias que não podem ser dissolvidas, mas solidificadas pela escrita e pela construção de um romance. O aprendizado é progressivo, gradativo. Há coisas que ele sabe, percebe e não sabe. Há uma contradição em sua narrativa, entre o tom lírico e delicado com a crueldade atroz de certas cenas a provocarem o pavor no leitor. A narrativa dá a ideia de fluxo contínuo, como o rio que irão percorrer, zona neutra, mas que serve como metáfora para o prolongamento da história. Assim, a sua linguagem oscila entre o realismo cru com palavrões e expressões rascantes com a beleza do lirismo e metáforas. 

Dando continuidade à narrativa, somos introduzidos na personagem Paulo Dias, um mateiro, que se opõe à visão de Chiarelli (que quer os direitos dos índios). Paulo os vê como selvagens e sem cultura, querendo explorá-los. Há diferentes temperamentos em jogo neste caldeirão imaginário e reflexivo. Pela primeira vez, João de Deus viajará num avião no subcapítulo 20, em que presentes serão lançados para os índios, como moeda de troca e pacificação, como se eles estivessem à venda. Mas o discurso de Paulo Dias é preconceituoso. E esse personagem conta para o narrador seu passado, relatando suas memórias. Dessa forma, vemos histórias paralelas dentro da história principal, fazendo o narrador oscilar entre a crença e a descrença, achando que poderiam ser fatos reais ou inventados, brincando com os espaços tênues entre o real e o imaginário. E no meio desse terreno inóspito, com escassez, os expedicionários vão desbravando. Há também, em oposição a isso, o mistério e o lirismo na área dos Abonari. Um verdadeiro cântico à natureza. No curso do romance, temos as duas vias de percepção sobre os indígenas, a via positiva, que acolhe, de Chiarelli, e a via negativa, do opressor, o mateiro Paulo Dias, que mostra a superioridade do homem civilizado. No final da primeira parte, temos a mistura de gêneros literários e estilos diversos, como uma mensagem e recado em tom informativo sobre as ações do local para serem transmitidas pela rádio para a sede, os jogos de adivinhação, a partir dos gestos dos indígenas, tentando compreender o outro, nas suas línguas variadas. Mas Sandra Godinho apresenta uma história sem maniqueísmos, revelando que o bem e o mal existem em ambos os lados, pois Paulo Dias percebe a vaidade de Chiarelli nessa missão, em ser reconhecido publicamente pela mídia.

Na segunda parte do romance, não há poemas iniciando cada subcapítulo, retornando a usar esse recurso na terceira parte, mesclando, assim, os tons e formas de como narrar. Na Parte II, “O Relato”, encontramos o processo de escrita no narrador João de Deus, a elucidação de seu lastro inventivo. E um dos motivos, “o ideal”, que o padre Chiarelli lhe dá, é central na trama. Tudo se deveu a sua maturidade, onde ele se enxerga pelo verso e pelo reverso de si, vasculhando todos os seus meandros e se desnudando para os leitores. É a busca por sua própria identidade, sua individualidade que ele se refere, criticamente: “Resolvi relatar tudo o que se passou no Abonari com a ajuda da Irmã Helena e do padre Sartori, que saiu atrás dos testemunhos de índios (que lançaram luz a esse túnel assombrado que só clareou muito tempo depois”. 

E é nessa parte na narrativa, que deixo aos leitores descortinarem, que se revelam os interesses reais nas terras indígenas dos Waimiris-Atroiaris. E a hierarquia tem um papel importante na trama, mostrando como as sociedades se comportam. Há todo um processo de distinção e individuação das personagens, ressaltando cada um em seu comportamento próprio. Mas, além disso, temos os atos de fingir dos caracteres, unindo essência e aparência, o ser e a máscara. No capítulo 37 repete o mesmo texto do prólogo com uma ligeira diferença. Não coloca o último parágrafo. Isso demonstra uma circularidade, uma ideia de dèjá-vu do eterno retorno nietzschiano, que já podemos perceber em outros livros da autora. Além do recado, aqui, nessa seção, vemos o gênero epistolar a partir de uma carta de Chiarelli à Irmã Helena, assim como na Parte III, onde teremos outra carta comovente e bela. Têm-se aqui, também, a reprodução de uma fala de um repórter da Rádio, mesclando o literário e o informativo-jornalístico. Ao mesmo tempo, nessa parte, nos deparamos com cenas violentas e chocantes com sangue e tripas e outras de intensa delicadeza e poeticidade, revelando-nos uma linguagem de extremos. Há a busca da FAB pelas informações e versões e mentiras sobre os fatos. Há contradições nas notícias de jornais, aqui, introduzindo o leitor numa outra espécie de narrativa, a da investigação. Temos o Serviço Secreto do Exército da região, com interrogatórios. Dessa forma, temos uma via de mão dupla, o que os leitores sabem e o que as personagens não sabem, num jogo textual e inventivo brilhante. Finalizando essa parte, nos deparamos com os interesses dos militares, a “Aliança para o progresso”.

Na parte III, “O caminho”, encontramos a seção mais curta e experimental de Sandra Godinho. No subcapítulo 61, há um trecho da tradição indígena, escrita na língua nativa e sua versão em língua portuguesa, num plurilinguismo da escritora. Há nesse subcapítulo várias letras “X” em sequência de seis linhas e depois a palavra “Merda” três vezes com exclamações, colocando o visual, a imagem e o popular em ação. Uma escrita de vanguarda e experimentalismo. Depois segue em outra parte um parágrafo inteiro quase em pontuação num caminhar vertiginoso, utilizando a partícula “e”, substituindo a vírgula num alongamento do choque entre palavras. No final do texto, há uma sequência de palavras com vírgula, alternando o longo e o ligeiro, o alongamento e agilidade das palavras. E, no final, algo assustador e apavorante, de uma crueldade sem limites, o massacre desumano dos militares, que cometem uma “chacina”, revelando sua cartilha demoníaca, subvertendo uma suposta ordem e inteireza. Mas, unido a este tom de perversidade, ainda temos um lastro de esperança na figura de um sobrevivente, o narrador João de Deus, que terá um desfecho inusitado na trama. 

Portanto, o novo romance de Sandra Godinho, aplaudido e premiado, é uma verdadeira peça literária, onde se conjugam os pares opostos, revelando grande conhecimento da língua, dos recursos estilísticos, dos estilos e gêneros literários, do contexto e história da sociedade e da realidade. Hibridizando polaridades, temos a sutileza do silêncio poético com a dureza e petrificação de cenas sangrentas e viscerais. Um livro que realmente está dando o que falar e que será um tesouro para futuras gerações.

Disponível em:

https://www.editorapenalux.com.br/loja/tocaia-do-norte

E-mail: vendas@editorapenalux.com.br

A resenhista

Alexandra Vieira de Almeida é Doutora em Literatura Comparada pela UERJ. Também é poeta, contista, cronista, crítica literária e ensaísta. Publicou os primeiros livros de poemas em 2011, pela editora Multifoco: “40 poemas” e “Painel”. “Oferta” é seu terceiro livro de poemas, pela editora Scortecci. Ganhou alguns prêmios literários. Publica suas poesias em revistas, jornais e alternativos por todo o Brasil. Em 2016 publicou o livro “Dormindo no Verbo”, pela Editora Penalux. 

Contato: alealmeida76@gmail.com

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“Voz Mulher”: o feminino em tempos de pandemia


No ano de 2020, em pleno surto de Covid-19, surge para o ser humano questões que vão além da saúde física e segurança. Em meio às situações cotidianas ‒ que se tornaram estranhas na quarentena ‒ manifesta-se a necessidade de se expressar, de se conhecer, de se fazer ouvido, em especial para as mulheres, que fazem parte de um dos grupos de pessoas mais silenciados no Brasil atualmente. Letícia Palmeira vem para sanar um pouco dessa dor e calar esse silêncio que repercute ao redor da existência feminina.

Em Voz Mulher, a autora celebra o feminino abrindo as portas do subconsciente e das questões relacionadas ao feminino em meio à pandemia de Covid-19. A autora realiza uma revisitação e ressignificação do passado, conduzindo o leitor, com sua escrita garbosa, a questões de igualdade entre os gêneros em relação ao sentir-se no contexto atual. 

Sua obra é uma ficção com viés autobiográfico que apresenta, em sua intensa narrativa ensaística, reflexões sobre o hoje, as relações entre a vida e a morte e os caminhos tortuosos do feminino. Nas ruas quase desertas, se ouve a Voz Mulher se escorando nas construções, passando pelas frestas, escalando os edifícios e se infiltrando em suas rotinas, salas de jantar e quartos de estar, ecoando pelo mundo seu grito harmônico do sentir-se mulher.

Segue abaixo um trecho da obra:

Ouça a Voz Mulher que emana das ladeiras, edifícios, das janelas e das sacadas onde vasos floridos se equilibram sob o forte vento das cidades que aglomeram desejos, anseios e passos fortes nas calçadas que correm pela vida na força motriz do relógio de corda antigo pendurado sobre o porta-retrato feliz.  

Sobre a autora:

Letícia Palmeira é graduada em Letras pela Universidade Federal da Paraíba. Nasceu em São Paulo. Reside em João Pessoa. Autora de diversos livros nos gêneros romance, contos e crônicas. Publicou Artesã de Ilusórios (EDUFPB, 2009), Sinfônica Adulterada (Multifoco, 2011) e Diário Bordô e Outras Pequenas Vastidões (Multifoco, 2013). Seu primeiro romance, Sol e Névoa, veio a público em 2015. Publicou também A Obscena Necessidade do Verbo (Penalux, 2016), O Porta-Retrato (Penalux, 2017), é uma das organizadoras da coletânea Ventre Urbano (Penalux, 2016), que trouxe à tona a prosa de algumas autoras paraibanas, como também foi organizadora do livro coletivo Não Temos Wi-Fi (Penalux, 2017). Buscando ampliar sua experiência, Letícia publicou, em 2018, A Química entre Nós, romance disponível somente em e-book. Em 2019, a autora publicou Mostruário Persa, um livro bordado de lirismo em prosa poética. Voz Mulher é seu mais recente trabalho, escrito no atordoado ano de 2020.  

Serviços:

Voz Mulher, novela (90 p., 38 reais). Letícia Palmeira ‒ Editora Penalux.

Disponível em:

https://www.editorapenalux.com.br/loja/voz-mulher

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