Paulo Levy - Foto divulgação |
Antes de entrar no meio editorial, em 2001, desenvolvi uma carreira diversa entre o esporte e as letras: joguei squash profissional com participação nos rankings brasileiro, sul-americano e mundial e fui publicitário por mais de 17 anos.
Em 2001 entrei para o mercado editorial com a primeira empresa de livros digitais do país. Em seguida trabalhei com livros na editora Objetiva e com revistas na editora Horizonte.
Em 2011 lancei-me como escritor. Meu livro de estreia, Réquiem para um assassino, assim como Morte na Flip e Pedra bruta, são publicados pela editora Bússola.
ENTREVISTA:
Conexão Literatura: Poderia contar para os nossos leitores como foi o seu início no meio literário?
Paulo Levy: Foi meio que por acidente. Assim como muita gente, desde a infância eu nutria a ideia romântica de escrever um livro. O tempo foi passando e eu relegava aquilo a segundo plano, pois nunca encontrava o tema certo. Um dia, aos 43 anos de idade, enquanto eu curtia uma semana de férias em Paraty com a minha família, saí para caminhar sozinho em frente à igreja Santa Rita, no Centro Histórico. Ali, sobre a mureta e olhando para o mar, tive uma epifania, senti como se tivesse sido atingido por um raio: vi claramente a cena do crime do primeiro livro. Essa imagem não me abandonou até que eu tomasse uma atitude a respeito. Cerca de um mês depois, acordei afobado no meio da madrugada, pois me veio em sonho a frase “Réquiem para um assassino”. Acendi a luz, anotei a frase aos garranchos num pedaço de papel e voltei a dormir. Algumas semanas depois disso, tive de voltar a Paraty para resolver um assunto na casa que minha família até hoje tem lá. Aproveitei a visita e bati nas portas da delegacia de Polícia Civil de Paraty, a 167ª DP, e na do corpo de Bombeiros. Ambos são vizinhos de muro. Questionei-os sobre o que eu havia imaginado. O pessoal da DP e dos Bombeiros foram unânimes em dizer que nada daquilo jamais havia acontecido em Paraty. Além disso, forneceram os procedimentos para se lidar com uma situação similar. Na estrada, de volta a São Paulo, decidi escrever o primeiro livro com o título recebido em sonho. Daí a criar o delegado Joaquim Dornelas foi um pulo.
Conexão Literatura: Você é autor dos livros “Réquiem para um assassino”, “Morte na Flip” e “Pedra Bruta”. Poderia comentar?
Paulo Levy: Antes de terminar de escrever Réquiem para um assassino eu já havia concebido a ideia de colocar um crime na Flip, no caso Festa Literária Internacional de Palmyra. Sim, pois a cidade dos meus livros chama-se Palmyra, que é e não, ao mesmo tempo, Paraty. Mudei o nome para não ficar refém da realidade, para a cidade do livro não ser um mais um personagem nas estórias. Com a ótima recepção de Réquiem pelo público e crítica, lancei Morte na Flip apenas um ano depois. A recepção foi ainda melhor e resolvi, desse momento, criar uma série de livros protagonizados pelo delegado Joaquim Dornelas. Pedra Bruta chegou em 2017. Ainda este ano chega o quarto livro, que estou dando os retoques finais.
Conexão Literatura: Como foram as suas pesquisas e quanto tempo levou para concluir seus livros?
Paulo Levy: Quanto mais eu me aprofundava nas estórias, nos personagens, mais pesquisa eu me dedicava a fazer. Cada estória exigiu um lote diferente de pesquisas. Embora seja ficção, para que a trama tenha credibilidade, ela deve estar escorada em procedimentos utilizados no mundo real. Pelo que tenho notado, o trabalho de pesquisa tem sido mais intenso e profundo a cada livro. Pedra bruta, por exemplo, por envolver a maçonaria, exigiu muito mais pesquisa que os dois livros anteriores juntos. Já o novo ainda mais que Pedra bruta. Quanto ao tempo de escrita, os primeiros dois livros tomaram cerca de um ano cada. Quanto a Pedra bruta e o novo, mais de dois cada.
Conexão Literatura: Poderia destacar um trecho que você acha especial em cada um dos seus livros?
Paulo Levy:
De Réquiem para um assassino:
Uma brisa leve e fresca soprava sobre a baía fazendo balançar preguiçosamente os barcos ancorados no mar e presos ao cais. Vistos de longe, pareciam bercinhos num ninar incessante. O encrespado das marolas refletia a luz morna da lua, àquela hora baixa no céu, pronta para mergulhar no mar e adormecer.
A cena tinha tudo: forma, ação e conteúdo de uma imensa pílula para dormir.
Como um boneco mal articulado, Dornelas seguiu aos trancos até a prainha da entrada do cais, além do ponto de onde foi retirado o cadáver no dia anterior.
Marcaram de se encontrar ali.
Numa manobra trabalhosa, o corpo pesado, o delegado se sentou na mureta, jogou as pernas para o lado do mar e se assustou com a figura de um homem deslizando na sua direção. Teria bebido a ponto de enxergar um profeta caminhando sobre a água? Esfregou os olhos, esforçou-se para clarear o raciocínio e reconheceu Cláudio remando a canoa caiçara de pé, vindo da ilha dos Macacos.
— Bom dia, delegado — disse o amigo ao pular na praia.
Dornelas mastigou a resposta e desceu para a areia. Cláudio arrastou a canoa para o seco e perguntou:
— Para onde vamos?
— Subir o canal, para além da curva do mangue.
Dornelas se esforçava para dominar o sono, não queria soar antipático. E com o receio de se esborrachar na água àquela hora da madrugada, subiu na canoa e se sentou no fundo. O amigo empurrou o barquinho para a água, saltou para dentro e saiu remando de pé. Cláudio tinha o domínio e a leveza de um equilibrista na corda bamba.
— Onde você aprendeu isso? — perguntou Dornelas, admirado.
— Isso o quê?
— Remar de pé?
— O meu pai, doutor.
— Nunca caiu?
— Duas ou três vezes... essas malditas lanchas!
Tendo a curiosidade satisfeita, o delegado resolveu fechar a boca assim que notou o traseiro encharcado. A cada remada o restinho de água que escorria no fundo do casco, indo e voltando, ensopava-lhe as calças.
De Morte na Flip:
O que aconteceu a seguir foi incompreensível ao delegado. Se lhe perguntassem depois, não saberia explicar. Mas de alguma forma, para ele, havia algo errado naquela cena: um homem sentado sob a capota de lona; o barqueiro no leme, de pé na popa. E não era simplesmente o fato de o barco sair para o mar numa noite escura.
Algo mais o intrigava.
Resolveu voltar. Queria alertar o marinheiro de que havia algo errado, alguma coisa que mesmo ele, delegado, não sabia definir. Talvez ordenar que retornasse sob o pretexto de inspecionar os documentos, o número de coletes salva-vidas, assuntar sobre o destino, qualquer coisa para não deixá-lo seguir adiante. Foi aos pulos, sobre as rochas, no sentido contrário.
Navegando em águas calmas, o barco chegou rapidamente ao centro do rio. Naquele ponto, os estalidos do motor ganharam velocidade e o barquinho acelerou.
Dornelas apertou o passo.
Temendo tropeçar nas valas negras entre as rochas, e tendo a atenção alternada entre o piso irregular e o barco que se afastava mais e mais em direção do mar, para longe das luzes da passarela, rumo à escuridão, Dornelas gritou:
— AEOU! — os braços abanando no ar.
De terno escuro e abafado pelo rugido das ondas, Dornelas era invisível ao passageiro e ao tripulante, que olhavam fixamente para frente. Sem ação, dedicou-se a ler o nome toscamente escrito em letras miúdas na proa. Não conseguiu.
— Merda!
O barco pulou as primeiras marolas e ganhou o mar. Aflito, concentrou-se então em gravar na mente o casco amarelo e branco, a tira horizontal azul, as almofadas listradas de branco com azul ou preto.
Sob o céu carregado e sem lua, o barquinho avançou um pouco mais e foi engolido pela escuridão.
De Pedra bruta:
— Doutor! Doutor! — insistia Caparrós pela linha que o delegado, sem perceber, mantivera ativa.
Até dar-se conta de que o impensável acontecera, Dornelas permaneceu imóvel por alguns segundos, como um manequim de vitrine, só que agarrado ao celular e ao filho. A conclusão do sequestro atravessou-o como um raio: o raciocínio apagou, os músculos se contraíram e a respiração passou a desenvolver-se aos trancos. Passado o baque inicial, a parte da mente dedicada à paternidade foi sendo gradativamente substituída pela de delegado de polícia, o que o fez, findo o processo, levantar o fone, colá-lo à orelha e disparar instruções ao subordinado:
— Estou aqui, Caparrós. Roberta foi sequestrada agora mesmo, sob o meu nariz.
— Mãe de Deus — sussurrou o investigador, do outro lado da linha.
— Vamos nos mexer. Quanto mais rápido, melhor. Peça para um plantonista levar a arma até o Chagas. Melhor, mande alguém ir buscá-lo e o traga para cá, aqui na rodoviária, para a coleta de impressões digitais da moto e do capacete. A arma pode esperar. Anote os números das placas.
Conexão Literatura: Como o leitor interessado deverá proceder para adquirir os seus livros e saber um pouco mais sobre você e o seu trabalho literário?
Paulo Levy: Meus livros estão disponíveis nas livrarias que, em razão da atual conjuntura, se resumem a portais de internet. Talvez, em razão da atual crise no setor, o melhor lugar para adquiri-los seja na Amazon. Tenho um site, paulolevy.com.br, onde constam os livros em todos os formatos – impresso, ebook e audiobook –, e também depoimentos de leitores, parte do que saiu na imprensa, minhas informações pessoais e de contato. Adoro atender meus leitores.
Conexão Literatura: Existem novos projetos em pauta?
Paulo Levy: O quarto livro está no forno. Eu planejava lançá-lo agora em maio. Em razão da pandemia de covid-19, ficou para setembro. Como vai ser, ainda não sei. Estou tateando a respeito de eventos virtuais, lives e etc. O mundo mudou até para isso. Estou à procura de uma forma de me adaptar a essa nova realidade. Vamos ver o que vai acontecer.
Em paralelo, existe o projeto de levar Réquiem para um assassino ao cinema. O roteiro já está escrito. Mas diante da incerteza dos dias atuais, nem eu nem a produtora sabemos como a coisa vai ficar.
Perguntas rápidas:
Um livro: O velho e o mar, de Ernest Hemingway
Um (a) autor (a): Paul Theroux
Um ator ou atriz: Harrison Ford
Um filme: A ponte do rio Kwai
Um dia especial: tenho dois, os nascimentos dos meus filhos
Conexão Literatura: Deseja encerrar com mais algum comentário?
Paulo Levy: Desejo que os novos leitores curtam tanto os livros quanto aqueles que já os leram.