ENTREVISTA:
Conexão Literatura: Poderia contar para os nossos leitores como foi o seu início no meio literário?
Alexandre F. Beluco: Aos nove anos, eu ganhei o livro Vinte mil léguas submarinas, de Julio Verne, no aniversário. Devorei logo em seguida e, a partir dali, também por conta de um problema de saúde, que se estendeu até a adolescência e limitava minha liberdade, me tornei um leitor voraz. Sendo desde cedo muito criativo, eu imaginava enredos alternativos e novos desfechos para os livros que eu lia e comecei a anotar várias ideias. Eu ainda não dominava a escrita, mas eu sabia que queria escrever. O costume de ler muito e de anotar ideias se manteve com a chegada da vida adulta. Durante a pandemia, ingressei no Curso para Formação de Escritores da Editora Metamorfose e ali, ao encontrar professores de escrita criativa e participar de oficinas, foi possível superar alguma resistência a escrever ficção e encarar os desafios do ofício.
Conexão Literatura: Você é autor do livro "Tecendo Fragmentos". Poderia comentar?
Alexandre F. Beluco: Esse é minha segunda empreitada literária. Trata-se de uma coletânea de dez contos que foram escritos, revisados e amadurecidos durante a pandemia, no período em que frequentei o curso da Editora Metamorfose. Lá aprendi e treinei diferentes técnicas, li muitas coletâneas de contos e quis praticar ferramentas diferentes para chegar a resultados e a efeitos que eu penso serem importantes para meus próximos trabalhos. Esse livro é, de certo modo, um resultado de trabalho de laboratório, testando e acertando, errando e acertando, errando e seguindo em frente, tentando várias vezes, errando e insistindo. Mas mesmo sendo resultado de experimentação, o produto final me agradou e eu me vejo nessas histórias, nesses personagens, nas situações que aparecem retratadas ali. O escritor Julio Cortazar disse certa vez que uma narrativa longa é como uma vitória (no boxe) por pontos, enquanto um conto seria uma vitória por nocaute. Trabalhando neste livro eu entendi como selecionar boas ideias para vitórias por pontos.
Conexão Literatura: Antes de "Tecendo Fragmentos", você publicou o livro de crônicas "Energias Renováveis, velharias clássicas e uma certa obsessão positiva", mostrando que além de contos, também domina o gênero textual das crônicas. Como é o seu processo de criação? Quais são as suas inspirações?
Alexandre F. Beluco: Crônicas, além de contos? Pode parecer estranho mas o “motor de criação” é o mesmo, embora as abordagens sejam possivelmente e potencialmente diferentes. O conto precisa convencer o leitor de que aquilo que está sendo contado é real, que os personagens estão ali, vivos, e que a trama está se desenvolvendo independentemente de quem lê estar em uma praia descansando em férias ou estar em um ônibus viajando para seu turno de trabalho. Já a crônica lida com temas reais e verdadeiros e por isso precisa de estratégias diferentes para fisgar o leitor. Meu processo de criação? Eu tenho costume de anotar todas as ideias, quando elas surgem. Depois, aos poucos, as melhores acabam se evidenciando entre as outras e terminam por ser selecionadas para uma melhor abordagem. O passo seguinte é decidir como essas ideias serão aproveitadas. O último conto de Tecendo fragmentos, por exemplo, era uma ideia que eu tinha anotada há cerca de trinta anos. Não me parecia apropriada para uma narrativa longa e foi utilizada meses antes em uma oficina de escrita. Depois foi revisada e selecionada para este livro. Minhas inspirações? Depende muito do momento da minha vida pessoal, da rotina cotidiana e até mesmo da estação do ano. Usualmente alguma cena de filme, alguma música ou trecho de livro pode servir como estopim para uma boa ideia a ser explorada em um conto ou crônica. Temas do trabalho como pesquisador ou até uma reportagem em noticiário podem levar a uma boa ideia para uma crônica.
Conexão Literatura: Poderia destacar um trecho do livro "Tecendo Fragmentos" especialmente para os nossos leitores?
Alexandre F. Beluco: Sim, em Tecendo fragmentos, conto “A sombra do sorriso”, p.79. “Então o nosso caroneiro saltou no banco de trás e gritou: ‘Eu desço aqui!’ Paramos o carro e ele já tinha a porta traseira aberta. Saiu gritando algo que entendemos como sendo uma despedida. Empurrou a porta para ser fechada com tal violência que tivemos a impressão de que toda a carroceria tremeu. Despediu-se, aparentemente, mas não agradeceu.”
Conexão Literatura: Como o leitor interessado deve proceder para adquirir os seus livros e saber um pouco mais sobre você e o seu trabalho literário?
Alexandre F. Beluco: Os meus livros encontram-se à venda no site da Editora Metamorfose (https://www.editorametamorfose.com.br/autor/10852/), que publicou esses dois primeiros títulos, e também no site da Amazon (https://www.amazon.com.br/Alexandre-F-Beluco/e/B09MJFTR55/ref=aufs_dp_fta_dsk). Os meus perfis no Instagram (@alexandrefbeluco) e no Facebook (https://www.facebook.com/escritoralexandrefbeluco) mostram um pouco do meu cotidiano, com algumas indicações de leitura, com atualizações sobre a repercussão do meu trabalho e com notícias relacionadas com minha atuação como escritor (e também do meu trabalho como professor e pesquisador). Os leitores também podem escrever diretamente para mim, pelo email alexandrefbeluco@gmail.com, que eu estarei sempre disponível para responder perguntas e discutir questões de interesse dos meus leitores.
Em breve, em algumas semanas, será lançado o site alexandrefbeluco.net, com textos inéditos e com mais informações sobre o trabalho como escritor. Esse lançamento será divulgado com antecedência no perfil do instagram.
Conexão Literatura: Quais dicas daria para os autores em início de carreira?
Alexandre F. Beluco: Leiam, leiam bastante, leiam muito, leiam sempre! Se um leitor voraz tiver ideias, elas acabam surgindo e se impondo. Quando as ideias surgem, as narrativas se encaixam, os personagens falam por si, as cenas nos tiram do sono para se consolidarem. Daí a encontrar papel e caneta (ou o teclado) e começar a escrever, que é quando a ficção transborda da imaginação para a realidade, é um caminho curto. Frequentar algum curso de formação de escritores, integrar alguma oficina de escrita criativa, participar de antologias e assim por diante, também é uma dica, mas vai do caminho de cada um.
Conexão Literatura: Existem novos projetos em pauta?
Alexandre F. Beluco: Sim, estou com vários projetos em andamento. Eu tenho por hábito me dedicar a várias iniciativas simultaneamente, focando em um ou outro conforme se aproxime de fase decisiva. No radar, estão um livro de crônicas, um livro de contos e uma novela. “Nada como o ronco de um GT”, meu próximo livro de crônicas, já está pronto e deve ser enviado para revisão crítica nas próximas semanas para publicação no final deste ano. “Já não é mais verdade”, um livro com sete novelas curtas (ou contos longos), está em fase final de elaboração e deverá ser publicado no primeiro semestre do próximo ano. Também estou escrevendo uma narrativa longa, que deverá estar pronta ao longo de 2024. Em paralelo, estou participando, com a Gabriela Silva, de um projeto para relançamento de livros do escritor noir portoalegrense De Sousa Junior, publicado pela Editora Globo nos anos 1930 e 1940.
Perguntas rápidas:
Um livro: Coração das trevas, de Joseph Conrad. É uma obra notável de um autor que não foi alfabetizado em inglês. Trata-se de uma narrativa que se desenvolve dentro de outra narrativa. O livro critica a atuação das metrópoles em suas colônias, especificamente no Congo Belga no final do século XIX, mas aborda também a proximidade entre os comportamentos de homens ditos “civilizados” e de homens ditos “selvagens”.
Um ator ou atriz: Leonardo DiCaprio, pela sua atuação em Inception, de 2010, de Christopher Nolan. Um ator que poderia se deixar levar pelos estereótipos associados aos galãs de cinema, mas que costuma buscar projetos que representem desafios ao seu talento. Nesse filme, ele confere credibilidade ao seu personagem e ao roteiro (que é complexo e que poderia facilmente se transformar em um fracasso de bilheteria).
Um filme: Cinema Paradiso, de 1988, de Giuseppe Tornatore. É um filme dedicado ao cinema, que gira em torno da amizade entre um menino e o operador de cinema da cidade. É um filme sobre um menino que perdeu o pai durante a Segunda Guerra e que se apaixona por filmes, acompanhando o cinema de sua pequena cidade. A cena final preenche espaços vazios que foram sendo deixados ao longo da narrativa.
Um hobby: Carros antigos. Uma justificativa será melhor apresentada citando uma frase de um especialista britânico, Quentin Willson. Ele disse: “Our affair with old cars is purely emotional, fiercely partisan, terminally subjective and completely without logic or order.” Em português: Nosso envolvimento com carros antigos é puramente emocional, ferozmente partidário, terminalmente subjetivo e completamente sem lógica ou ordem.
Um dia especial: Dia 08 de dezembro de 2020, quando ocorreu o início da vacinação da população contra o vírus da Covid-19. Pela humanidade ter conseguido se organizar e dar resposta rápida a uma ameaça contra a sua existência (independentemente de problemas ou dificuldades que tenham acontecido ao longo do processo de desenvolvimento das vacinas e, depois, ao longo dos meses seguintes, durante as campanhas de vacinação).
Conexão Literatura: Deseja encerrar com mais algum comentário?
Alexandre F. Beluco: Já li citações de grandes escritores dizendo que o escritor é, na verdade, um grande mentiroso. Ele precisa ser coerente, mas no fundo estará contando uma mentira. Pode ser, mas a extensão da entrega necessária para construir uma narrativa é tão grande que, em alguma medida, ele terá que ser honesto. Mesmo contando uma mentira, ou várias mentiras encadeadas, ele terá que demonstrar honestidade nessa entrega, sob pena de não concluir aquilo que se propôs a entregar. E tento me pautar por isso no ofício como escritor.
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