Fale-nos sobre você.
Sou doutora em Literatura e Crítica Literária (PUC-SP), pesquisadora do Grupo de Pesquisa O Narrador e as Fronteiras do Relato (PUC-SP), escritora, professora de Literatura e Escrita Criativa. Gosto de cultivar um olhar distraído e do avesso pelas coisas do mundo, pessoas, lugares. Amo fragmentar-me em muitos eus em busca da palavra perdida, do que ainda não foi dito, nua, em estado de gravidez poética.
ENTREVISTA:
Fale-nos sobre o livro. O que motivou a escrevê-lo?
Este livro nasce dessa fragmentação que o ser humano representa na contemporaneidade. É motivado por esta nova ordem humana. É um livro que dá lugar às faltas, ao inacabamento do presente, à não linearidade da existência. Os textos que compõem este livro foram sendo escritos ao longo de cinco anos e cada um é um caco de vivências, experiências, descobertas, saudade, tristezas e conquistas que foram acontecendo no kairós do tempo dessa personagem que me acompanhou todo esse tempo e me ajudou a também, como pessoa, fazer algumas travessias importantes dentro de mim.
Fale-nos sobre seus outros livros.
Participei de algumas antologias poéticas como Prêmio SESC de Poesias Carlos Drummond de Andrade (2015), O ventre do verbo (2013), Poetrix 3 (2009), Agreste Utopia (2005), entre outras. Em 2016, lancei pela FAPESP-Educ o livro Caminhos Cruzados e Um Lugar ao Sol: o Projeto Literário de Erico Verissimo, publicação da minha dissertação de mestrado que tem como foco de análise os dois romances de Verissimo da década de 1930 citados no título do livro. Foi uma pesquisa realizada propondo novas perspectivas críticas sobre esses dois romances de Verissimo. A investigação central é na criação de personagens-escritores que discutem sobre o papel do escritor e da voz autoral dentro da própria escrita e no mundo, estabelecendo os alicerces de sua obra e que foi ampliado em minha pesquisa de doutorado evidenciando o caráter contemporâneo do projeto literário de Erico Verissimo.
Como analisa a questão da leitura no país?
É uma questão delicada, por vezes deixada de lado pelos governantes, dada a importância que a leitura/literatura e as artes, de modo geral, têm em nosso país. Quais espaços ocupa a leitura em um país que passa por um desmonte das universidades públicas, que direciona verba da educação para outros fins, que reduz número de bolsas de estudos de ensino superior, que não oferece condições dignas de trabalho a professores em sua maioria? A questão da leitura é uma questão política, assim como todas as ações humanas que envolvem o sujeito social. Leitura, hoje em dia, é resistência. É ação contra a maré dos que querem calar artistas, boicotar escritores, dificultarem o acesso à educação de qualidade. Felizmente há as bibliotecas físicas e volantes que criam projetos de incentivo à leitura, professores espalhados pelo país que lideram ações para que os estudantes tenham acesso aos livros, grupos de estudos virtuais e presenciais que incentivam o gosto e a prática da leitura, as Bienais acontecendo agora de forma presencial novamente. É perigoso repetir o jargão de que as pessoas não leem, os jovens não se interessam pela leitura. Não é verdade. Isso é o que querem que repitamos como mantra para desmotivar ainda mais a leitura, é intensificar o projeto de desmonte mesmo da cultura. Acredito, porém, no debate sobre essa questão, na criação de oportunidades de leitura em nossas casas, bairro, cidade. Acredito que o coletivo tem ideias incríveis para fortalecer o incentivo e o acesso à leitura em nosso país, já que há pouca ação do governo para esse fim. Façamos nós, de mãos dadas, as transformações pela resistência que é a leitura. Só assim sobreviveremos.
O que tem lido ultimamente?
De tudo! Poesia, conto, crônica, romance, gêneros híbridos. Sempre gostei de ler tudo o que aparece por perto, sem muitas amarras. É daí que nascem os grandes encontros. Terminei de ler recentemente Amor incômodo, da italiana Elena Ferrante, saindo de um romance da estadunidense Sylvia Plath, o Redoma de vidro, e da releitura dos contos de No seu pescoço, da nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie. Mergulhei, agora, em um conto pouco lido do brasileiríssimo João Guimarães Rosa, Cara de bronze, que será objeto de estudo do grupo de pesquisa do qual faço parte, mas também estou às voltas com os poemas de Márcia Kambeba, um sopro de vida da literatura indígena, para um curso que estou ministrando na escola onde trabalho, além de leituras de crítica e teoria literária... Enfim, não há fronteiras na literatura. As leituras vão se complementando, se escrevendo juntas, conversando umas com as outras e nos alimentando.
Uma pergunta que não fizemos e que gostaria de responder.
Quero poder responder a
uma pergunta que a Clarice Lispector fez a Erico Verissimo em uma entrevista
que está disponível no livro Clarice Lispector entrevistas (Rocco,
2007):
“Que é que você mais quer
no mundo?”
Que o ser humano possa reencontrar o seu lado humano, a sua Natureza. Que possamos entender, depois de uma pandemia que dizimou parte da população mundial, e das muitas pandemias emocionais silenciosas que vivemos, que somos uma fagulha de luz em um imenso universo de possibilidades de existir, mas todas devem incluir o outro. Somos nós. Sempre plural, sempre nesse lugar inabitado que é o instante da vida. Por isso, não há salvação para humanidade se não recuperarmos a nossa humanidade, o nosso religare mais verdadeiro que é conosco mesmos em união com os demais. Quando isso acontecer, porque tenho esperança no ser humano, alcançaremos a tão sonhada liberdade porque seremos um único corpo caminhando para o mesmo rumo nessa longa estrada chamada existência.
Link para o livro:
https://www.editoraversiprosa.com.br/produtos/de-dentro-dos-olhos-dela/
CIDA SIMKA
É licenciada em Letras pelas
Faculdades Integradas de Ribeirão Pires (FIRP). Autora, dentre outros, dos
livros O enigma da velha casa (Editora Uirapuru, 2016), Prática de escrita:
atividades para pensar e escrever (Wak Editora, 2019), O enigma da biblioteca
(Editora Verlidelas, 2020), Horror na biblioteca (Editora Verlidelas, 2021) e O
quarto número 2 (Editora Uirapuru, 2021). Organizadora dos livros Uma noite no
castelo (Editora Selo Jovem, 2019), Contos para um mundo melhor (Editora
Xeque-Matte, 2019), Aquela casa (Editora Verlidelas, 2020), Um fantasma ronda o
campus (Editora Verlidelas, 2020), O medo que nos envolve (Editora Verlidelas,
2021) e Queimem as bruxas: contos sobre intolerância (Editora Verlidelas,
2021). Colunista da revista Conexão Literatura.
SÉRGIO SIMKA
É professor universitário desde
1999. Autor de mais de seis dezenas de livros publicados nas áreas de
gramática, literatura, produção textual, literatura infantil e infantojuvenil.
Idealizou, com Cida Simka, a série Mistério, publicada pela editora Uirapuru.
Colunista da revista Conexão Literatura. Seu mais recente trabalho acadêmico se
intitula Pedagogia do encantamento: por um ensino eficaz de escrita (Editora
Mercado de Letras, 2020) e seu mais novo livro juvenil se denomina O quarto
número 2 (Editora Uirapuru, 2021).
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