“A Bela e a Fera” e “A Maçã no Escuro” dão continuidade às edições especiais em comemoração aos 100 anos de Clarice e chegam ao mercado literário em maio
Em dezembro de 2020, Clarice Lispector faria 100 anos. Para comemorar, a Rocco dá continuidade aos lançamentos das edições especiais de sua obra completa, que contam com capas e conteúdo extra inéditos. Dia 30 de abril, serão lançados “A Bela e a Fera” e “A Maçã no Escuro”. Com uma literatura de excelência incontestável e estilo inimitável, Clarice Lispector se consagrou como uma das maiores escritoras de língua portuguesa de todos os tempos.
Assinado pelo premiado designer Victor Burton, o novo projeto gráfico dos livros traz nas capas recortes de telas feitas por Clarice, que pintou 22 quadros ao longo de sua vida. Na orelha dos títulos, o leitor encontrará a íntegra da tela retratada na capa. “A Bela e a Fera” traz a pintura de óleo sobre madeira “Eu te pergunto por quê?”, datada de 13 de maio de 1976, enquanto “A Maça no Escuro” tem a capa ilustrada com “Explosão”, de 1975.
“A Maçã no escuro”, considerado por muitos críticos “o” romance de Clarice, foi o último livro escrito enquanto Clarice morava no exterior. Ela já tinha pleno domínio da técnica que a tornou uma referência literária, o que resultou em um romance muito elaborado, onde ela se coloca na narrativa como um espectador capaz de alterar os destinos dos personagens. Agindo como um Deus, a autora muitas vezes abandona as características próprias de cada um deles para fazer uma descrição própria de seus papéis na história maior contada no livro: a vida, a criação, a dor e o prazer de ser.
Por sua vez, “A Bela e a Fera” é composto por oito contos que apresentam duas Clarices: uma da adolescência, aos 14 anos de idade, e outra já adulta. O livro também incluí os dois contos escritos em seus últimos meses de vida, em 1977: "Um dia a menos" e "A bela e a fera". Para a Luiza Lobo, professora da Faculdade de Letras da UFRJ, escritora e tradutora, “esta obra, como todas as suas outras, é uma lição de vida. O tom confessional de diário, de conversa ao pé do ouvido, que é a tônica de seu estilo, registra, nestes contos, a enigmática reação das personagens femininas contra a repressão patriarcal, e mostra que a conquista da independência da mulher passa pela busca do próprio eu”, escreveu na orelha da atual edição comemorativa.
Para além das novas capas, os livros ganham renovação do conteúdo editorial com posfácios escritos por grandes especialistas da literatura Clariceana, como Nádia Battella Gotlib, Clarisse Fukelman, Benjamin Moser, Aparecida Maria Nunes, Ricardo Iannace, Marina Colasanti, Eucanaã Ferraz, Teresa Montero, Arnaldo Franco Junior e próprio filho da autora, Paulo Gurgel Valente, que excepcionalmente escreverá sobre seu último livro, “A hora da estrela”. O cineasta Luiz Fernando Carvalho, que está dirigindo nova adaptação da obra de Clarice (“A Paixão Segundo G.H.”), com estreia marcada para este ano, também assina um dos textos finais. “A Bela e a Fera” conta com texto do jornalista Claufe Rodrigues e “A Maça no Escuro” de Rosiska Darcy de Oliveira.
De acordo com o editor de Clarice Lispector na Rocco, Pedro Vasquez, a opção pelo uso de posfácios ao invés de apresentações ou textos introdutórios foi proposital com a preocupação de não dirigir ou tutelar a leitura, permitindo que o leitor aprecie o livro livremente. “Ao final do volume, a partir do texto dos especialistas, é possível contemplar a obra com outros olhos, sob um novo ponto de vista. O posfácio funciona, portanto, não como um guia de leitura e sim como um instrumento de expansão das possibilidades de interpretação, que, longe de direcionar ou restringir a interpretação do texto, multiplica as possibilidades de entendimento”, explica Vasquez. “Clarice tem uma popularidade cujo público não para de se expandir, apesar dela ter falecido há quatro décadas. Sem dúvida alguma Clarice está mais atual do que nunca, encontrando mais ressonância no coração dos leitores de hoje do que naqueles do seu tempo, quando a sociedade brasileira era bem mais acanhada do que a contemporânea”, completa.
SAIBA MAIS SOBRE OS LIVROS
A Bela e a Fera
“A Bela e a Fera” é uma das obras de Clarice Lispector que exalam a capacidade criadora e o poder de imaginação da estrela maior da literatura de autoria feminina no Brasil. As ideias que nutrem estes oito contos, escritos em 1940 e 1941 (parte I) e 1977 (parte II), recriam uma atmosfera a partir de situações cotidianas corriqueiras que termina por despertar no leitor a sensação do insólito que há em nossas vidas. Ninguém consegue ficar indiferente a essas ideias. Elas estimulam o lado mais criativo e belo que há em cada um de nós, talvez porque “o nascimento de uma ideia é precedido por uma longa gestação” – como nos diz a narradora de “História interrompida”.
A Maçã no Escuro
Seriam os atos do homem, às vezes os mais cruéis, necessários para elevá-lo à condição de imagem e razão? Em A maçã no escuro, Clarice Lispector faz crer que sim, transformando o atordoado Martim em um novo homem após ter supostamente assassinado a mulher. Fugindo do crime, Martim acaba descobrindo-se como homem, desprezando os antigos valores estabelecidos em sua vida. Na corrida por uma nova existência, ele se revela numa outra condição. Sua fuga, em vez de isolá-lo, remonta à criação do homem, de um novo ser surgido do nada. A narrativa, próxima da criação bíblica, em vez de julgar os personagens culpados ou inocentes, faz deles aprendizes do mundo, onde cada etapa funciona como uma gênese de um ser recém-criado.
Os três capítulos que formam A maçã no escuro, escrito de 1951 a 1961, quando foi publicado, mostram de forma gradativa o pecado, ato impensado, e a redenção, o surgimento de um outro, como elementos primordiais de evolução do ser. A análise profunda que Clarice impõe nada mais é que o exercício do pensamento: o diferencial do homem, que mata, morre e ressuscita, ressurgido a cada momento.
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