Márcia Fusaro - Foto divulgação
Fale-nos sobre você.
Sou doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, com pós-doutoramento em Artes pela UNESP. Mestra em História da Ciência pela PUC-SP. Graduei-me em Letras, Tradução e Interpretação (inglês-português) pela UNIBERO. Atualmente, sou professora e pesquisadora dos Programas de Pós-Graduação em Educação e da graduação da Universidade Nove de Julho.
ENTREVISTA:
Fale-nos sobre o livro. O que motivou a escrevê-lo?
O livro em homenagem à Ana Haddad nasceu de um desejo de muito tempo. Nossa amizade é de quase vinte e cinco anos, desde a época em que me tornei sua primeira orientanda de mestrado. A fagulha sobre o livro foi reavivada por um comentário do poeta Marco Lucchesi, imortal da Academia Brasileira de Letras. Na primeira vez em que nos visitou na Universidade Nove de Julho, onde proferiu uma inesquecível palestra a convite da Ana, pôde testemunhar o carinho e admiração dos alunos por ela. A certa altura, virou-se para mim, sorridente: “Que bonito isso! Ana e seu trabalho como educadora mereciam uma homenagem”. Aquele comentário permaneceu comigo, reforçando meu desejo anterior, até que as circunstâncias se mostrassem oportunas, anos depois, para eu conseguir organizar o livro. Trata-se de uma coletânea de ensaios escritos por ex-orientandas e ex-orientandos da Ana: Catarina Fischer, Karla Brandão, Nádia Lauriti, Ninil Gonçalves, Fábio Espadaro, Shirlei Tarzia e Silvana Gondim, além de mim. O título remete aos afetos à luz de Spinoza, em sua magnífica Ética, livro e autor dentre os preferidos da Ana. Os ensaios são declarações de amor. Respeito. Admiração por essa incrível amiga e educadora que é Ana Haddad. Como preâmbulo, uma seleção de poemas do paquistanês Mohammed Iqbal, em tradução assinada por Marco Lucchesi que, de certa forma, foi um iluminador do processo.
Fale-nos sobre seus outros livros.
As interfaces do conhecimento sempre me fascinaram. Aliás, foi esse o motivo principal de minha formação de percursos não lineares, iniciada, sobretudo, a partir do amplo universo de leituras que passei a frequentar depois de conhecer Ana Haddad. Por isso, os livros que tenho publicado sempre, de alguma forma, têm apresentado interfaces transdisciplinares mesmo quando há um tema predominante. Nos últimos anos, o tema predominante tem sido a Educação em diálogos com Semiótica, Literatura, Artes, Filosofia, Ciências e Tecnologia. Mas é preciso explicar que não se trata de uma arrogância, evidentemente ingênua, de querer “dominar” várias áreas do conhecimento. A meu ver, tal amplitude de abordagens nasce como consequência da minha grande paixão pela leitura. Leitura esta que estendo a inúmeras áreas e vários sentidos. Como formadora de professores, uma das preocupações que tenho trazido à baila em minhas publicações, e outras atuações acadêmicas, é não somente a importância da leitura (disso já sabemos), mas também a ampliação desse conceito. Creio ser fundamental na formação de professores, bem como na área da Educação em geral, considerarmos o conceito de leitura não apenas relacionado ao texto, mas também à leitura das imagens, sejam elas estáticas ou em movimento. É preciso alfabetizar(-se) não somente para a leitura e a escrita, mas também para a imagem. Sobretudo em tempos de fake news, deep fake e afins.
Como analisa a questão da leitura no país?
Conforme mencionei anteriormente, já se sabe que a leitura é importante. Isso costuma ser lembrado por diferentes pessoas em diferentes contextos, incluindo, claro, muitos da Educação. No entanto, às vezes soa mais como um discurso que se quer mostrar bonito e aceito do que propriamente uma ação ou prática efetiva. Ainda há muito a avançarmos em termos de formação de leitores, incluindo-se até mesmo a área da Educação e, em especial, a da formação de professores. A leitura profunda, reflexiva, é um exercício constante que requer dedicação e atualização. Costumo comparar à meditação, à qual também me dedico há muitos anos. Algumas pessoas dizem não ter tempo nem paciência para meditar. Às vezes, ouço o mesmo em relação à leitura. Só que vejo a leitura e a meditação como práticas para um exercício de liberdade interior. Portanto, praticá-las com a devida dedicação requer, sobretudo, uma necessidade interna. Um desejo íntimo de libertação. Mas é preciso também que se diga que os problemas relacionados à leitura não são exclusividade do Brasil. Gosto de citar, como exemplo, a pesquisa profunda, de toda uma vida, da antropóloga francesa Michèle Petit, com vários livros sobre o tema publicados no Brasil. Ela nos mostra como os problemas relacionados à leitura ocorrem em vários lugares do mundo, inclusive na França, para surpresa de muitos.
O que tem lido ultimamente?
Sou uma leitora inquieta. Aliás, um mito que costumo quebrar com meus alunos é o do leitor bem-comportado, que começa a ler um livro e só começa outro quando termina, obedientemente, o anterior. Isso não é regra. Não há uma lei ou mandamento que obrigue a se ler assim. As escolhas e o ritmo da leitura são dados pelos diferentes contextos que nos perpassam. O exercício da leitura, para se tornar prazeroso, também requer um grau de liberdade. Recentemente, me interessei pelos títulos de Elena Ferrante, pseudônimo dessa misteriosa escritora italiana que não quer aparecer na mídia mesmo vivendo na era das selfies e das redes sociais. Li Frantumaglia, aliás por indicação da Ana Haddad, e fui logo frequentando outros títulos dessa talentosa escritora: Um amor incômodo; A filha perdida; A quadrilogia napolitana... (outros dela já estão aguardando na minha pilha de livros futuros). Enquanto os lia, nesses exercícios de idas e vindas que são o prazer da leitura para mim, fui frequentando outros títulos em paralelo, conforme os contextos do cotidiano me foram conduzindo a eles e por eles. Diário Confessional, de Oswald de Andrade. A planta do mundo, do talentoso ensaísta e neurobiólogo italiano Stefano Mancuso (já estou com outros dois títulos dele aqui na minha pilha de livros a serem lidos futuramente). Art and Cosmotechnics, do filósofo chinês Yuk Hui, heideggeriano que apresenta diálogos profundos entre arte e tecnologia pelos filtros ocidental e oriental. Reli O Sofista, de Platão, para abordar o conceito de “simulacro” como parte da minha disciplina de pós-graduação sobre artes e tecnologias aplicadas à educação. O ensaio como tese, de Victor Gabriel Rodríguez, mestre e doutor em Direito pela USP, além de talentoso ensaísta. Este livro é altamente recomendável àqueles que, como eu, andam incomodados diante da falta de criatividade estilística na produção de certos textos acadêmicos. Encaixotando minha biblioteca, de Alberto Manguel, que dispensa apresentação aos amantes da leitura. O belíssimo Biografia do Silêncio: breve ensaio sobre meditação, do padre espanhol e discípulo zen Pablo d´Ors, são alguns dos títulos que li recentemente.
Por que se manter otimista, apesar de tudo?
Em contraste às minhas respostas anteriores, talvez longas demais, esta será breve e de arremate: porque, conforme já nos alertava Sartre, estamos condenados à liberdade.
No link abaixo, uma entrevista com a profa. Ana Maria Haddad Baptista:
http://www.revistaconexaoliteratura.com.br/2021/06/entrevista-ana-maria-haddad-baptista.html
No link abaixo, uma entrevista com o escritor Marco Lucchesi:
http://www.revistaconexaoliteratura.com.br/2021/05/exclusivo-marco-lucchesi-presidente-da.html
CIDA SIMKA
É licenciada em Letras pelas Faculdades Integradas de Ribeirão Pires (FIRP). Autora, dentre outros, dos livros O enigma da velha casa (Editora Uirapuru, 2016), Prática de escrita: atividades para pensar e escrever (Wak Editora, 2019), O enigma da biblioteca (Editora Verlidelas, 2020), Horror na biblioteca (Editora Verlidelas, 2021) e O quarto número 2 (Editora Uirapuru, 2021). Organizadora dos livros Uma noite no castelo (Editora Selo Jovem, 2019), Contos para um mundo melhor (Editora Xeque-Matte, 2019), Aquela casa (Editora Verlidelas, 2020), Um fantasma ronda o campus (Editora Verlidelas, 2020), O medo que nos envolve (Editora Verlidelas, 2021) e Queimem as bruxas: contos sobre intolerância (Editora Verlidelas, 2021). Colunista da revista Conexão Literatura.
SÉRGIO SIMKA
É professor universitário desde 1999. Autor de mais de seis dezenas de livros publicados nas áreas de gramática, literatura, produção textual, literatura infantil e infantojuvenil. Idealizou, com Cida Simka, a série Mistério, publicada pela editora Uirapuru. Colunista da revista Conexão Literatura. Seu mais recente trabalho acadêmico se intitula Pedagogia do encantamento: por um ensino eficaz de escrita (Editora Mercado de Letras, 2020) e seu mais novo livro juvenil se denomina O quarto número 2 (Editora Uirapuru, 2021).
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