João Barone, autor e membro da banda Os Paralamas do Sucesso, é destaque da nova edição da Revista Conexão Literatura – Setembro/nº 111

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terça-feira, 24 de março de 2020

Alessandra Giordano e o livro Contos que curam, por Cida Simka e Sérgio Simka


Fale-nos sobre você.

Meu nome é Alessandra Giordano. Sou a terceira geração de contadores de histórias de minha família. 
Estudei Psicologia, Filosofia e Pedagogia. Especialização em Literatura Infantojuvenil. Psicodrama, Arteterapia, Biopsicologia. Mestrado em Ciências das Religiões - PUC-SP. Doutorado em Psicologia - PUC-SP. Professora universitária. Professora do Depto de Arteterapia do Insituto Sedes Sapientiae. Professora do Curso A Arte de Contar e Ouvir Histórias na Contemporaneidade. Mãe, esposa, Herbarista, adepta das medicinas da terra, estudou Ayurveda com Dr. José Ruguê. Iniciada como Deeksha Giver (Doadora da Bênção Universal) e como OMER: Oneness Meditador, escolhida por Sri Amma Bhagavan em 2014 como uma das 4 meditadoras da Unidade Oneness Blessing do Brasil. Frequenta a O&O Academy desde 2006 na Índia onde é trainer tendo como professores os filósofos e místicos Krishinaji e Preethaji. Meditadora desde 1986.

ENTREVISTA:

Fale-nos sobre o livro. O que a motivou a escrevê-lo?

Na minha família os contos eram concebidos como remédios para a alma humana. Minha avó sempre nos contou histórias, como algo medicinal. Sempre que caía a noite, ficávamos reunidos à beira do borralho e lá, ela e Nega Julia (minha fada madrinha), contavam-nos histórias, para acalentar nosso sono - meu e dos meus irmãos. Este era o ritual para ouvirmos os contos mais lindos, de terras distantes, mas de gente como a gente. Entravam pelo coração e apaziguavam os nossos medos, deixando-nos ensinamentos preciosos. Antes dos 7 anos além de brincarmos na terra, na água, ao ar livre, ouvir histórias também fazia parte dos ensinamentos e das nossas experiências diárias. Aos 7 anos já chegávamos na escola como muitos saberes de criança.  Desde 2000 ministro aulas no Departamento de Arteterapia do Insitituto Sedes Sapientiae e em outros estados do Brasil, levando o conto de tradição oral, como uma especiaria, capaz de despertar processos de autoconhecimento e nos colocar em conexão com o que realmente vale a pena ser vivido.  
O conto tradicional é um dos ricos instrumentos de trabalho nos processos arteterapêuticos. Assim, necessitando de uma bibliografia sobre o assunto, resolvi escrever o presente livro, tendo em vista que não encontrei nada parecido no mercado. E, de verdade, certa vez um aluno me fez um questionamento impactante, ele disse: 
“- Professora, você vai morrer e levar todo esse conhecimento com você? Por que não escreve sobre isso?" Resolvi, então, falar sobre os 
contos que curam. Contos estes que já utilizei em várias situações com bons resultados. O conteúdo deste livro é bem diferente do meu primeiro livro que se chama Contar Histórias: Um Recurso Arteterapêutico de Transformação e Cura, editado pela Artes Médicas em 2007, esgotado.  No presente livro, apresento contos tradicionais que relatam problemas da humanidade como: ansiedade, baixa autoestima, relacionamentos interpessoais, dentre outros; apresento ainda sugestões de como utilizá-los. São alegorias da vida que todos nós reconhecemos e este reconhecimento só nos faz bem, pois alarga nossas mentes. 

Você é pesquisadora dos efeitos da meditação da mente humana. Fale-nos sobre isso.

Sempre tive uma atração pelo Silêncio. Sempre trabalhei com os contos tradicionais e descobri que os mesmos são uma forma de meditação. Mas trata-se de uma meditação não reconhecida por muitos. Contudo, muito utilizada pelo povo Sufi.  Comecei a contar histórias com a intenção de levar as pessoas a refletir sobre os temas dos contos, que certamente têm conteúdos que são do coletivo e têm a ver com a vida de todos nós. Mesmo para uma criança, não conto qualquer história. Aproveito para fazer com que o conto seja um veículo para ensinamentos.  Acho que esse foi o começo. Em 2006 depois de conhecer a Deeksha, que é uma energia, um fenômeno, ancorado no planeta por KhrisnhaJi, filho de Sri Amma e Bhagavan, Avatares do Sul da Índia.  Comecei oficialmente a pesquisar sobre os efeitos da meditação na mente humana. Fiz um curso introdutório de mindfulness, com Dr. Marcelo Demarzo na UNIFESP e percebi que os fundamentos de tal ciência vieram da Índia antiga. Como já estava envolvida com a Deeksha, propus um projeto de investigação de tais efeitos. A Deeksha surtiu muitas mudanças em minha vida, e vi muitas outras situações difíceis serem resolvidas. Me tornei uma estudiosa da Oneness University, na Índia, cujos ensinamentos vinham direto dos Avatares. Curiosa, quis saber quais os efeitos deste "tipo" de meditação no cérebro humano. Iniciei esta pesquisa entre 2014 e 2015, junto a um grupo de pessoas com saúde abalada, por várias enfermidades. Recolhíamos o sangue antes para vermos os hormônios presentes e, depois de 3 meses de Deeskha, aplicada semanalmente, pudemos constatar que o hormônio do cortisol abaixava sensivelmente. Acreditamos por isso que o sistema imunológico das pessoas se equilibrava, deixando-as em condições e melhor saúde e bem-estar. Tivemos muitos relatos sobre mudanças significativas nas vidas dos envolvidos. Contudo, a pesquisa não foi concluída, por questões políticas. 

Em sua opinião, o ser humano está à procura dele mesmo?

Em minha opinião, o humano está em busca de um sentido para a sua vida. Penso que estamos vivendo uma época de relações efêmeras, sem raízes, com valores fúteis, o que nos deixa profundamente confusos e sem alicerces. Estamos patinando numa busca por um segredo que possa revelar uma parte de nós mesmos. Estamos à procura de Deus, de algo que nos dê segurança, mantenha a nossa fé e nos dê esperanças. O nosso maior anseio, penso, não é dinheiro, carros, roupas, sexo, nem mesmo receber amor do outro. Na nossa história, repetidas vezes pessoas alcançaram estas coisas, e ainda assim, se sentiram insatisfeitas. Vemos isso direto no consultório.  Perdemos a nossa criatividade, porque não estamos em paz, não temos tempo para termos paz! Necessitamos, por isso, ampliar as nossas consciências e como dizia o Dr. Jung consciência é Deus, e eu acrescento tem a ver com percepção; com a percepção de que vivemos numa fina camada de eventos que encobrem uma realidade mais profunda. Percepção consciente que se efetiva quando conseguimos passar alguns minutos observando-nos em vez de nos colocarmos a falar e falar, falar cada vez mais. Temos medo do silêncio interno e externo. Às vezes é necessário sentar-se sozinho, quieto, apenas para sentir como seu corpo se sente, como seus pensamentos funcionam. Às vezes, quando alguém nos irritar é preciso perguntara si mesmo, o que há embaixo da minha raiva? 
É preciso perceber a  realidade interna, da qual estamos muito distantes. Precisamos perceber que estamos sendo embalados pelos ritmos do universo. Assim, devemos considerar uma vida espiritual que existe dentro de nós mesmos, de forma intensa, esperando para ser revelada. 
Na tradição da antiga Índia essa procura é comparada a mergulhar em busca da joia mais preciosa da existência; temos que deixar a superfície para mergulhar dentro de nós mesmos e pesquisar, com paciência, até encontrar a joia de valor inestimável. Esta joia é também chamada de essência, alento de Deus, néctar, água da vida: marcas para o que chamamos de transformação. Transformação é uma maneira radical como uma lagarta se transforma numa borboleta. Para nós, seres humanos, significa transformar o medo, a dúvida, a agressão, a insegurança. Transformar tudo isso nos seus opostos. O que esta tradição nos ensina é que uma coisa é certa, este anseio, esta busca, não tem nada a ver com coisas externas, não tem nada a ver com dinheiro, status etc. Tem a ver, sim, com o desejo ardente de encontrarmos um significado para a vida e o final do sofrimento.  

Acha que o ser humano encontrou uma resposta? Ele tem buscado a espiritualidade porque sente um vazio existencial. O que você tem a nos dizer sobre essas questões?

Aprendemos a viver um conjunto de crenças que menosprezam o mistério da vida. Este conjunto de crenças é limitante, uma vez que não deixa espaço para o autoconhecimento e menos ainda para a busca da alma. Precisamos de um espaço que aponte para o propósito do ser humano, para a essência do humano, propósito que nos leve às respostas para os enigmas da morte, do amor, do bem e do mal. Uma vida na superfície nunca nos mostrará o caminho para estas questões que nos inquietam e menos ainda satisfará as necessidades que nos levam a fazê-las. Uma mente fragmentada não pode conduzir ao descobrimento das dimensões ocultas que nos habitam. Penso que uma dela é que, no nível da alma, cada um é o seu próprio mundo.  Acho que descobrir estas dimensões é a única maneira de satisfazer nossos desejos mais profundos. Apesar da evolução das ciências, sob certos aspectos, sabemos menos sobre os mistérios da vida do que os nossos ancestrais. Parece que tudo se resume no nosso afastamento da Unidade. Perdemos a prática da totalidade quando ações dos pensamento e sentimentos se manifestam juntos: sinto uma coisa e faço outra. Estamos compartimentalizados entre razão e emoção, o caos que leva ao egocentrismo.
Novamente lembrando os ensinamentos dos antigos, na Índia, eles dizem: a realidade única é espirito e a superfície da vida é um disfarce que nos impede de descobrir o real (Sri Bhagavan). Isto quer dizer que o espírito era reconhecido como a verdadeira fonte da vida. Um espírito que tem uma casa que se chama corpo -  um grande mistério que revela um microcosmo não separado do macrocosmo. Apesar dos avanços da ciência, me parece que nos tornamos órfãos da sabedoria. Fico pensando que Buda sentado debaixo da árvore onde se iluminou, simboliza o mesmo drama da alma que nascemos para repetir: a necessidade de conhecermo-nos e de sabermos sobre nós mesmos, do nosso potencial. Jesus em algum lugar, para seus discípulos, também disse: você conhecerá todos os segredos da vida quando for capaz de dizer: eu preciso saber... É importante que saibamos que somos um livro de segredos que espera para ser aberto.

Como analisa a questão da leitura no país?

Infelizmente, somos um país de não letrados, ou de alfabetizados funcionais, como dizem os especialistas. Me parece que continua não sendo prioridade a educação em nosso país. Ensinar a pensar tem um certo custo. São muitas as questões. Destacaria a invasão da tecnologia nos lares. Percebo que as crianças leem cada vez menos, que os jovens não sabem mais escrever, primeiro porque não leem, depois que a comunicação se tornou virtual, são tantas as abreviações e neologismos e há um novo código, que só eles entendem. Estão conectados nos ipeds, computadores, celulares desde muito pequenos. Com esta balbúrdia de tantas máquinas que pensam por nós, perderemos a capacidade de pensar, refletir e encontrar significados sobre o que de fato vale a pena na vida. Hoje, já não se conta histórias para os filhos e netos, porque os pais não têm tempo e tempo é dinheiro, as relações familiares também são distantes e superficiais. Um aparelho de TV em cada quarto da casa. Cada um almoça e janta em um compartimento da casa, para assistirem aos seus programas de TV prediletos e, com isso, se perde e muito a convivência. As relações passaram a ser virtuais. 

O que tem lido ultimamente?

Gosto de Ler. Todos os dias eu leio. 
Tenho 4 livros na cabeceira da minha cama: 
Como Conhecer Deus de Deepak Chopra - Edit. Rocco
Jornada para a autorrealização de Paramahansa Yogananda - Edit. Self-realization Fellowship
Ensinamento do Coração de um Mestre Mahamudra - Edit. Lazlo 
Oito Passos para a Felicidade de Geshe Kelsang Gyatso - Ed. Tharpa Brasil



CIDA SIMKA
É licenciada em Letras pelas Faculdades Integradas de Ribeirão Pires (FIRP). Autora, dentre outros, dos livros O enigma da velha casa (Editora Uirapuru, 2016), Prática de escrita: atividades para pensar e escrever (Wak Editora, 2019) e O enigma da biblioteca (Editora Verlidelas, 2020). Organizadora dos livros: Uma noite no castelo (Editora Selo Jovem, 2019), Contos para um mundo melhor (Editora Xeque-Matte, 2019), Aquela casa (Editora Verlidelas, 2020) e Um fantasma ronda o campus (Editora Verlidelas, 2020). Integrante do Núcleo de Escritores do Grande ABC e colunista da Revista Conexão Literatura.

SÉRGIO SIMKA
É professor universitário desde 1999. Autor de mais de seis dezenas de livros publicados nas áreas de gramática, literatura, produção textual, literatura infantil e infantojuvenil. Idealizou, com Cida Simka, a série Mistério, publicada pela Editora Uirapuru. Membro do Conselho Editorial da Editora Pumpkin, integrante do Núcleo de Escritores do Grande ABC e colunista da Revista Conexão Literatura.

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