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terça-feira, 12 de março de 2019

Contos do livro ‘Enterrando Gatos’, lançado pela Editora Patuá, misturam a estranheza e o cotidiano

Obra é primeiro trabalho de ficção da jornalista e escritora Rafaela Tavares Kawasaki

Uma garota que pratica furtos para acariciar objetos e depois destroçá-los assiste ao caos gerado como consequência do próprio vício. Duas crianças cruzam sozinhas uma cidade, pela primeira vez, para resgatar um cachorro de estimação. Uma mãe digere a intenção de abandonar o filho em um parque de diversões, farta de enterrar animais que acredita terem sido mortos por ele.

Esses são alguns dos protagonistas dos sete contos que compõem o livro “Enterrando Gatos”. A obra, prestes a ser publicada e distribuída pela Editora Patuá, um dos principais selos independentes de São Paulo, é a estreia na literatura da escritora e jornalista araçatubense Rafaela Tavares Kawasaki.

O livro será lançado em 23 de março, às 19h, em São Paulo. O local do evento será o Patuscada – Livraria, Bar e Café, espaço da própria editora, localizado na rua Luís Murat. Haverá também um lançamento, previsto para a primeira quinzena de abril, em espaço cultural de Araçatuba.

CONSTRUÇÃO
Escrito em um estilo que mistura o impressionismo, a estranheza e elementos do cotidiano, os contos de “Enterrando Gatos” começaram a ser compostos entre final de 2017 e meados de 2018, ganhando reescrituras em 2019. Segundo a autora, enquanto as narrativas expõem, em um primeiro plano, os conflitos internos e externos dos personagens, fora da superfície elas refletem os maniqueísmos, uma tendência à histeria coletiva e ao linchamento, a empatia seletiva e o incômodo causado pelas imposições de padrões de comportamento que caracterizam a sociedade atual. “Eu queria contar histórias, sempre tive essa ânsia. Mas a ficção raramente se limita a relatos puros, ela é infiltrada pelo seu contexto histórico e o nosso é marcado pela passividade diante do absurdo, e explosões de violência. Os contos têm um pouco disso.”

As protagonistas são, em grande parte, mulheres. De acordo com Rafaela, elas surgiram de forma quase orgânica. A realidade do gênero feminino é plural, porém, é perspectiva com a qual a autora está mais familiarizada. Por outro lado, ela relata sentir uma urgência em dar voz a mulheres ao escrever, criar personagens femininas com camadas nem sempre agradáveis, porém, que fazem parte da construção de uma psicologia complexa.

Há escritoras cultuadas pelo público e crítica como contistas e romancistas na literatura ocidental dos séculos 20 e 21 que narram uma realidade feminina, como Lygia Fagundes Telles, Clarice Lispector, Alice Munro, Elena Ferrante, Chimamanda Ngozi Adichie e Joyce Carol Oates. “Contudo, é muito mais comum, quando temos contato com literatura clássica, lermos autores homens e estudarmos personagens mulheres idealizadas sob a ótica deles. Acredito que ler mulheres falando sobre mulheres ajuda os leitores a nos enxergar com seres mais múltiplos e menos estereótipos.”

Parte dos personagens inclui também crianças, fazendo emergir um relatos de perda de inocência nas histórias. A ambientação de parte dos contos é o Brasil atual, porém outros deles se passam em décadas como os anos 1980, 1990 e 1950.

CONTOS
O primeiro conto, “Porcelana”, acompanha uma menina que se apoia em furtos e destruição de pequenos objetos como válvula de escape para os próprios desgostos. Já o segundo, “Bolinha”, mostra o dia de dois irmãos que saem de casa sozinhos para buscar um cachorro perdido. Em “Enterrando Gatos”, conto que dá nome ao livro, uma mãe oscila entre a vontade de proteger e a de abandonar um filho ainda criança, que a perturba com o hábito de levar gatos mortos para casa.

O conto “Enjoy the Silence” é protagonizado por um casal de recém-casados que vivem uma crescente de ódio por um vizinho que os impede de dormir. Um menino saboreia a animosidade em relação ao namorado da mãe em uma viagem em “A madrugada ainda tem cinco horas”. Uma mulher revolta a vizinhança ao se negar a sepultar o marido em “Frutas Estragadas”. O último conto, “Poesia de Rodoviária”, tem como ponto de vista o de um atendente de rodoviária que presencia a ascensão e queda de uma moradora de rua ao se tornar uma celebridade local.

Rafaela Tavares Kawasaki - Foto divulgação
AUTORA
Hoje com 31 anos, Rafaela trabalha com a escrita desde 2011, quando começou a estagiar em um jornal. A escritora nasceu em Araçatuba em 1987. Cresceu no Japão, onde passou 12 anos e habitou diferentes regiões do arquipélago. É formada em Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo pelo Centro Universitário Toledo, na mesma cidade. Ainda na condição de estudante, foi finalista do “Prêmio Santander Jovem Jornalista”, realizado pelo jornal O Estado de S. Paulo, em 2014. Atualmente trabalha como assessora de imprensa no Centro Universitário Toledo.

Ela recorda que aos sete anos gostava de escrever pequenos contos infantis, que registrava um caderno pequeno de capa vermelha. Resolveu voltar à prática na adolescência, quando se apaixonou pela literatura como leitora e até arriscava a redigir narrativas fictícias, porém costumava esconder ou até descartar os textos que escrevia. Trabalhar como jornalista e escrever diariamente, mesmo que em uma linguagem técnica e com relatos de não-ficção, além de ser uma atividade profissional, serviu de laboratório para a literatura e para encorajá-la a publicar os próprios contos.

EDITORA
A Editora Patuá - Livros são amuletos - é uma alternativa no mercado editorial: com o objetivo principal de publicar bons autores que ainda não encontraram espaço nas grandes editoras, mas que também não desejam pagar pela edição da própria obra. Seu objetivo é apresentar ao público livros com excelente qualidade gráfica e, sobretudo, literária.

A editora iniciou as atividades em fevereiro de 2011 e, após oito anos de muito trabalho e mais de 800 títulos publicados, estabeleceu-se como uma das principais editoras independentes do país, conquistando duas vezes o Prêmio São Paulo de Literatura, três vezes o Prêmio Jabuti, o Prêmio Açorianos e deixando autores e autoras finalistas e semifinalistas dos principais prêmios literários do país, incluindo os Prêmios São Paulo de Literatura, Prêmio Rio, Prêmio Jabuti.

SERVIÇO
O livro “Enterrando Gatos” será lançado em 23 de março, no Patuscada – Livraria, Bar e Café, localizado na rua Luís Murat, 40, Pinheiros, São Paulo.
A obra pode ser comprada nos sites https://editorapatua.minhalojanouol.com.br/ e http://www.amazon.com
Redes sociais da editora: https://www.facebook.com/editorapatua/
https://www.instagram.com/editorapatua/
https://twitter.com/editorapatua

CONTATO DA AUTORA
E-mail: rafaela.tavaresk@gmail.com

TRECHO DO LIVRO
“Se deslizar o dedo pela superfície fria da porcelana não fosse tão bom, Marina não teria prolongado a caça a objetos para acariciar e esmagar. Na verdade, não teria começado. O elefante indiano foi o princípio sem o qual não haveria sequências. Era um bibelô pequeno em meio a uma fauna de miniaturas que decorava a sala da Tia Lia. Apesar do tamanho, devia ser um favorito. Ocupava uma posição de destaque na cômoda de madeira envelhecida. Foi o primeiro de uma coleção de objetos conquistados e destroçados.

Era inevitável esfregar o dedo no bibelô depois do contato inicial. As bochechas e a barriga tinham curvas lisas de porcelana, mas as orelhas e a manta cheia de arabescos em relevos raspavam de leve no dedo. O bibelô tinha uma frieza que contrastava com o mormaço da cidade. O toque refrescava, abria distâncias entre a circunferência da sala onde Marina se encontrava e as outras pessoas da casa.

Sentir o bibelô nas mãos a afastava até da lembrança recente uma tentativa escapar da cozinha sem ser percebida. Foi durante essa fuga que esbarrou na cômoda. Seus pés tocaram o carpete do corredor quase sem fazer barulho, em contraste com sua habitual caminhada forte de quem tem pressa, que tanto irritava a mãe. É muito feio uma mocinha pisar com tanta força, anda direito! A mãe sempre diz o que mocinhas devem ou não devem fazer – e geralmente elas fazem o oposto ao que Marina faz.

Ela fugia não da cozinha em si, mas das pessoas. Especialmente Tia Lia. Mas você já está comendo de novo, meu anjo? Olhe o apetite dessa menina, benzadeus. Dá uma controlada, lindinha. Daqui a pouco você não consegue mais entrar em casa, hein? Os outros adultos da cozinha soltavam risinhos nervosos afiados o suficiente para se entranhar nos poros, atingir o sangue que percorria o braço de Marina e esfriá-lo. Não era um frescor como o toque prazeroso da porcelana, era um arrepio. A fatia do bolo permaneceu no prato depois da primeira garfada.

Ninguém viu Marina quando ela tentou se esconder atrás da cômoda da sala, batendo o braço nas miniaturas. Ou quando seus dedos agarraram o elefante de porcelana antes que ele caísse no chão. Marina foi sua salvadora naquela hora, grande ironia. Uma força maior a impeliu a escondê-lo na bolsa até o fim daquela tarde de domingo. Era prazeroso apalpá-lo de vez em quando por baixo da mesa, sem ninguém notar. Em algum momento, a tia perceberia a ausência do pequeno elefante indiano, mas não enquanto Marina estava na casa. Ah, no entanto, ela tinha de sentir falta em algum momento. O elefante enfeitava tão bem a cômoda de madeira envelhecida. As marcas circulares de limpeza deixadas pelas quatro patas no meio de uma camada espessa de pó chamariam atenção mais tarde. Marina não as espanou. Era excitante deixar pistas.

Só Marina sabia onde estava a miniatura. Era seu segredo e ela brincava com ele. Os olhos dela foram os únicos naquela noite a ver o bibelô ser quebrado com golpes de uma bota ortopédica já aposentada.

Daqui a pouco você não consegue mais entrar em casa, hein? Paft. O sorriso torto da Tia Lia. Paft. E então, não era só a Tia Lia. A voz áspera da mãe quando ela proibia Marina de correr com as outras crianças. Paft. Mas isso lá é nota? É para isso que você me faz enfiar dinheiro naquela porcaria de escola? Paft. A andança por consultórios até encontrar um médico que aceitasse receitar o remédio para cabeça que Marina sabia que não precisava. Paft. O apartamento pequeno do padrasto onde você escuta todos os barulhos que não queria escutar porque os quartos são próximos e as paredes finas. Paft. Ser obrigada a morar lá, porque o pai diz que sente tanto a falta da sua menininha, mas desconversa quando ela insinua que queria passar mais tempo com ele. Paft. Os doces que Marina não podia comer, porque estava engordando ou porque sua pele ganhava mais espinhas. Paft. Senta que nem mocinha. Fecha essas pernas. Vadias é que fazem assim. Paft.

O pequeno elefante indiano foi reduzido a pó. Todos os “sim, senhora” que Marina dizia sem querer e todos os “nãos” que ouviu a contragosto também se dissolveram. Ninguém viu a destruição. Só Marina. A exclusividade era o que chamavam poder, ela soube, então. Era tão bom! Marina precisou reviver a sensação. O pequeno elefante indiano teve muitos sucessores.”
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