Clarice Lispector é uma das grandes escritoras em língua portuguesa. Com romances, contos e crônicas publicadas ainda é capaz de mover os mais variados sentimentos em seus leitores. Clarice tem uma escrita que seduz.
Na introdução do livro Todos os Contos (Rocco, 2016), em que Benjamin Moser reuniu toda a obra de contista da autora, ele menciona o alerta: “Cuidado com Clarice”, dito por um amigo a uma das leitoras da escritora: “Isso não é literatura. É bruxaria.” Essa mistura de literatura e bruxaria, exercida pelo fascínio que Clarice deixa em quem a lê perdura. O leitor pode ser pego por uma frase, pela construção de seu texto, pelas personagens femininas que representam várias facetas das mulheres, pela forma ora delicada, ora voraz com que Clarice consegue tratar a palavra. Uma observadora da vida, que em entrevista declarou: “Quando eu não escrevo estou morta”. E por isso mesmo ela escrevia, para viver, porque como ela mesma falou (na mesma entrevista), “tem hiatos em que a vida fica intolerável”.
Confira uma seleção de dez citações de Clarice Lispector extraídas de contos, crônicas ou romances da autora.
“Às vezes, quando vejo uma pessoa que nunca vi, e tenho algum tempo para observá-la, eu me encarno nela e assim dou um grande passo para conhecê-la. E essa intrusão numa pessoa, qualquer que seja ela, nunca termina pela sua própria autoacusação: ao nela me encarnar, compreendo-lhe os motivos e perdoo. Preciso é prestar atenção para não me encarnar numa vida perigosa e atraente, e que por isso mesmo eu não queira o retorno a mim mesma.” (Encarnação Involuntária)
“Porque enquanto eu amo a um Deus só porque não me quero, serei um dado marcado, e o jogo da minha vida maior não se fará. Enquanto eu inventar Deus, Ele não existe.” (Perdoando Deus)
“Nós, os artistas do grande negócio, sabemos que a obra de arte não nos entende. E que viver é missão suicida.” (Discurso de Inauguração)
“Se uma pessoa perfeita do planeta Marte descesse e soubesse que as pessoas da Terra se cansavam e envelheciam, teria pena e espanto. Sem entender jamais o que havia de bom em ser gente, em sentir-se cansada, em diariamente falir; só os iniciados compreenderiam essa nuance de vício e esse refinamento de vida.” (A Imitação da Rosa)
“Quando um filho nasce, a liberdade lhe é dada quase que imediatamente. É verdade que muitas vezes a criança não usufruirá por muito tempo dessa liberdade entre feras. Mas é verdade que, pelo menos, não se lamentará que, para tão curta vida, longo tenha sido o trabalho. Pois mesmo a linguagem que a criança aprende é breve e simples, apenas essencial.” (A Menor Mulher do Mundo)
“Essa justiça que vela meu sono, eu a repudio, humilhada por precisar dela. Enquanto isso durmo e falsamente me salvo. Nós, os sonsos essenciais. Para que minha casa funcione, exijo de mim como primeiro dever que eu seja sonsa, que eu não exerça minha revolta e o meu amor, guardados. Se eu não for sonsa, minha casa estremece.” (Mineirinho)
“Um modo possível de ainda se salvarem seria o que eles nunca chamariam de poesia. Na verdade, o que seria poesia, essa palavra constrangedora?” (A Mensagem)
“Eu sei morrer. Morri desde pequena. E dói mas a gente finge que não dói. Estou com tanta saudade de Deus. E agora vou morrer um pouquinho. Estou tão precisada.” (Brasília: Esplendor)
“Sempre me restará amar. Escrever é alguma coisa extremamente forte mas que pode me trair e me abandonar: posso um dia sentir que já escrevi o que é o meu lote neste mundo e que eu devo aprender também a parar. Em escrever eu não tenho nenhuma garantia.” (Se Eu Fosse Eu)
“A mais premente necessidade de um ser humano era tornar-se um ser humano.” (Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres)
0 comments:
Postar um comentário